Reforma Administrativa precariza e restringe serviços públicos à população que mais precisa, afirmam especialistas

Qual é a cara do Estado que queremos? A indagação foi um dos pontos em discussão no segundo dia do Seminário Reforma Administrativa – PEC 32, promovido pela Comissão do Trabalho e Serviços Públicos da Câmara, nesta terça-feira (11). O debate teve apoio do Núcleo do Trabalho do PT e contou com a participação dos parlamentares Rogério Correia (PT-MG), Carlos Veras (PT-PE), Erika Kokay (PT-DF), Leonardo Monteiro (PT-MG) e Marcon (PT-RS).

Durante sua exposição, o economista Eduardo Moreira afirmou que a proposta do Poder Executivo – que se encontra na ordem do dia do Congresso Nacional – é “uma licença para se demitir servidores públicos”. Ele avaliou também que a PEC 32 vem para atender demanda do sistema financeiro.

“Resumindo, essa reforma me parece ser uma licença para demitir os servidores, servidoras públicos, colocar como aquele que decide quem será demitido ou não, lideranças nos cargos de lideranças que não necessariamente compreendem o serviço público ou tem experiência no serviço público, e diminuir o Estado, atendendo a uma demanda desse sistema financeiro que tem essa sanha, essa necessidade de ter garantido que todos os compromissos que o Estado assumiu com ele serão honrados”, afirmou o economista.

Para ele, o grande perigo é que “nessa lógica para atender esses interesses fiscalistas, e dando poder às pessoas que vem da iniciativa privada de demitirem, extinguir cargos, autarquias, diminuir esse serviço prestado à população, como os serviços de educação e saúde”.

Moreira avaliou ainda, que os itens que estão no bojo da proposta enviada por Bolsonaro para análise e aprovação do Poder Legislativo, não necessariamente atendem os pontos que se deseja melhorar.

“A pergunta correta é: passando esta reforma, nós conseguiremos solucionar os problemas e ter um Estado mais moderno, um Estado que serve mais a população, principalmente a que hoje recebe serviços de péssima qualidade, a população desprovida de qualquer serviço em alguns lugares do País? eu acredito que não”, pontuou Eduardo Moreira.

Objetivo da PEC 32

Na opinião do economista, o propósito dessa reforma é diminuir o serviço público. Segundo ele, o objetivo é reduzir especificamente as áreas de educação e saúde, e jogá-las nas mãos da iniciativa privada, “fazendo com que essas pessoas mais pobres, não tenham mais acesso aos bons médicos e bons professores, tenham acesso aos médicos que servirão esses vouchers que a gente sabe”.

Eduardo Moreira fez uma alerta em caso de a Reforma Administrativa passar no Congresso Nacional. Ele sugeriu que em caso de a reforma ser aprovada, não se pode deixar avaliação de desempenho, carreiras típicas de Estado e outros itens abertos, para serem definidos depois. Ele acredita que todos esses itens fazem toda a diferença “entre uma reforma que pode destruir o Estado brasileiro ou preservar minimamente a estrutura existente e que sim, atende a milhões de brasileiros que nos são invisíveis, mas que só têm isso pra ter o mínimo de segurança na sua vida já tão difícil”.

PEC inoportuna

A representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e diretora do Sindicato dos Professores do Distrito Federal (SINPRO/DF), Rosilene Correa, disse que não é aceitável debater esse tema em momento que cerca de 19 milhões de pessoas passam fome e mais de 400 mil brasileiros foram mortos pela Covid-19.

“É nesse cenário que nós estamos aqui discutindo a possibilidade de uma Reforma Administrativa. Então, primeiro, que é um momento absolutamente desfavorável para se discutir. Nós entendemos perfeitamente que precisamos repensar a gestão pública no Brasil. E o Estado precisa ser repensado, mas não a partir de uma lógica que é para transferir esse Estado para o privado, porque é isso que fica muito claro pra todos nós”, explicou Rosilene.

Ao fazer um paralelo com a Reforma da Previdência aprovada e promulgada pelo Congresso Nacional, em 2019, a sindicalista observou que a Reforma Administrativa proposta por Bolsonaro causará danos muito maiores.

“Eu não tenho dúvida de que a PEC 32, se aprovada nas condições que ela está apresentada, será um dano muito maior do que a Reforma da Previdência, porque nós estamos falando é do Estado como um todo, e não só de um direito de trabalhador, mas é de toda a população, especialmente quem mais precisa do serviço do Estado. Então, a gente fica com muita preocupação”, externou Rosilene Correa.

Lógica rentista

Ao expor seu ponto de vista, o deputado Vicentinho (PT-SP) afirmou que a PEC 32 “mexe com a cara do Estado. Segundo ele, essa proposta segue a lógica da Emenda Constitucional (EC 95) que congelou investimento na área da saúde e educação por 20 anos, a mesma lógica, de acordo com ele, aplicada nas reformas Trabalhista e da Previdência.

“Seguem a mesma lógica de quem não tem proposta para o Brasil. Alguém ouviu alguma vez, o Bolsonaro apresentar algum projeto de nação para o nosso país? Ele vai ficar caracterizado como presidente que liberou armas, liberou ódio, é incompetente e sem nenhuma compaixão”, criticou.
“É por isso que os aproveitadores, que são os poderosos, que os rentistas sabem que o Estado é importante para servir a eles e não para servir ao povo”, completou o parlamentar.

Ausência

Vicentinho criticou a ausência de representantes do governo no debate. Para o parlamentar paulista é sintomático que eles não apareceram nos debates. “É claro que eles não querem se apresentar, querem dar a impressão que isso não tem nada a ver com o povo brasileiro. Vamos defender os servidores públicos, porque o servidor público é, para nós, o povo brasileiro”, finalizou.

Casa vazia

Durante sua fala, o deputado Rogério Correia, que coordenou a mesa do debate, disse que em caso de aprovação dessa matéria, aqueles que votarem favorável serão cumplices da destruição do Estado brasileiro. “Então, eu acho que de todo o caso, aprovando isso, quem aprovar, será cúmplice de uma Reforma Administrativa destrutiva do Estado brasileiro”.

Correia reclamou de fazer um debate importante sem a presença dos principais interessados na temática. “É difícil debater isso, com a Casa vazia, sem que os servidores e as lideranças possam nos procurar”, lamentou.

Covardia

O parlamentar mineiro classificou de covardia inverter a ordem de prioridades para o Brasil, ao colocar a Reforma Administrativa antes do debate da Reforma Tributária. “É covardia deixar para trás a Reforma Tributária, que poderia dividir renda no Brasil. Então, as coisas estão invertidas ao sabor do mercado. Esse é Paulo Guedes, esse é Bolsonaro. É esta reforma que tá sendo discutida”, concluiu Rogério Correia.

Benildes Rodrigues

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