PT e demais partidos de Oposição questionam no STF decreto de Bolsonaro que altera a Lei Rouanet

O PT e os demais partidos de Oposição (PSOL, PCdoB, PSB, PDT e Rede) ingressaram com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a constitucionalidade do decreto do governo Bolsonaro que altera a Lei Rouanet (Lei 8.313/1991). Na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), os partidos pedem a suspensão do decreto por mudar de forma autoritária e inconstitucional a análise dos projetos que visam captar recursos via Lei Rouanet. Representam o PT na ação a presidenta nacional do partido, deputada Gleisi Hoffman (PR) e a deputada Benedita da Silva (PT-RJ).

A ADPF aponta que, entre outras ilegalidades, o decreto exclui da atual legislação a menção expressa ao combate à discriminação e preconceitos. A lei atual define como apto a captar recursos via Lei Rouanet projetos que busquem “erradicar todas as formas de discriminação e preconceito”. O governo Bolsonaro modificou o texto alterando a finalidade para “promoção da cidadania cultural, da acessibilidade artística e da diversidade”.

Os partidos políticos lembram na ação que o governo Bolsonaro incluiu ainda outras finalidades, antes não existentes na lei, para captação de recursos. Entre elas, o apoio “a atividades culturais de caráter sacro, clássico e de preservação e restauro de patrimônio histórico material, tombados ou não” e o apoio a “festejos, eventos e expressões artísticas-culturais tradicionais, além das já tombadas como patrimônio cultural e imaterial”.

Planos Anuais de Atividades Culturais

Os partidos de Oposição questionam ainda a mudança realizada pelo decreto que altera o funcionamento dos Planos Anuais de Atividades Culturais. A legislação anterior previa que esses planos seriam direcionados a custear a manutenção de instituições culturais sem fins lucrativos como um todo. Já a partir do decreto só podem ser atendidos “instituição exclusivamente culturais”, cujas atividades estejam relacionadas a “museus públicos”, ao “patrimônio material e imaterial” ou a “ações formativas”.

Nesse caso, demais museus e instituições culturais sem fins lucrativos de caráter privado que desejarem apresentar projetos na forma de Plano anual terão que ser consideradas “relevantes para a cultural nacional” pela Secretaria de Cultura, comandada pelo ex-ator bolsonarista Mário Frias.

A ação protocolada no STF afirma que nova norma se caracteriza como uma “clara e abusiva discriminação limitadora da extensão de efetividade social da política pública”. “Na prática, a Secretaria Especial de Cultura do Ministério Turismo poderá dizer quais instituições são relevantes ou não relevantes. O que unilateralmente poderá possibilitar ou inviabilizar a liberação de recursos para dada instituição, em clara afronta ao princípio da isonomia e da impessoalidade na administração pública”, denunciam os partidos de Oposição.

Comissão Nacional de Incentivo à Cultura 

O PT e os demais partidos de Oposição questionam ainda as mudanças feitas pelo decreto na composição da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura (CNIC), composta por membros da sociedade civil que avaliam e decidem os projetos aptos a captar recursos via renúncia fiscal. Com o novo decreto, a CNIC deixa de ser órgão deliberativo colegiado e passa a ser apenas uma instância recursal consultiva. Já as decisões finais sobre os incentivos fiscais, passam a ser de responsabilidade exclusiva da Secretaria Especial da Cultura do governo Bolsonaro.

“Historicamente, a composição da CNIC atentava para a especialização de seus/suas integrantes, conhecedores da pluralidade de áreas dos setores culturais, notadamente para garantir uma análise técnica e uma definição respaldada pela realidade e necessidades concretas dos setores. Tal transformação no papel conceitual e institucional da CNIC ensejou outras alterações em seu funcionamento, todas levando à centralização de decisões na figura do Secretário”, explicam os partidos na ação protocolada no STF.

O decreto também altera as normas de funcionamento da CNIC, concentrando poder nas mãos do presidente do colegiado, comandado atualmente pelo Capitão da Polícia Militar da Bahia, André Porciúncula Alay Esteves. Além da norma do governo Bolsonaro conceder voto de qualidade ao presidente da CNIC, também prevê que o Secretário Especial de Cultura possa delegar ao Secretário Nacional de Fomento e Incentivo à Cultura o exercício da presidência da CNIC, sendo que o Presidente-delegado também terá voto de qualidade.

Representatividade da sociedade

Outro ponto questionado do decreto foi a alteração na indicação de membros que compõem o CNIC. Antes da mudança feita pelo governo Bolsonaro, os seis representes da sociedade civil indicados para o colegiado deveriam vir das seguintes áreas: Artes cênicas; Audiovisual; Música; Artes Visuais, arte digital e eletrônica; Patrimônio cultural material e imaterial (inclusive museológico e expressões das culturas negra, indígena, e das populações tradicionais); e humanidades, inclusive literatura e obras de referência.

Os partidos de Oposição explicam que essas áreas estão enquadradas no art. 18, § 3º da Lei Rouanet, que prevê renúncia de 100% dos impostos recebidos por parte do Estado no financiamento de projetos culturais.

Com a mudança realizada pelo decreto foram redefinidos os representantes das áreas que podem fazer parte do CNIC. Agora as áreas contempladas passam a ser Arte Sacra, Belas Artes, Arte Contemporânea, Audiovisual Patrimônio Cultural e Imaterial e Museus e Memória. Os partidos de Oposição observam que, alguns desses novos segmentos, correspondem exatamente a inclusão das novas finalidades dos projetos que podem ser financiados pelo Pronac. Como exemplo, é citado a área da Arte Sacra, que já era contemplada pela Lei Rouanet, mas que agora passa a ter representante deste setor no CNIC.

“A medida é um pleito antigo de setores vinculados a parlamentares que possuem como base de apoio a população evangélica para utilizar tais recursos para restauração dos templos religiosos com recursos da lei”, esclarece a Oposição.

A ação questiona ainda a centralização das determinações sobre a composição e a atuação da Comissão do Fundo Nacional de Cultura na figura do Secretário Especial de Cultura, atualmente o bolsonarista Mário Frias, além de submeter a Secretaria-Executiva da comissão ao comando da Secretaria Nacional de Fomento e Incentivo à Cultura. “Em afronta à democratização do setor já conquistada pela sociedade, que antes permitia ao colegiado a deliberação sobre a sua gestão executiva”, acusam o PT e demais partidos de Oposição.

 Autorização para inauguração, lançamento e divulgação

A ação questiona ainda o decreto por proibir a “utilização de logomarcas, símbolos ideológicos ou partidários”, tanto nas divulgações feitas por proponentes quanto por patrocinadores. O texto da norma do governo prevê que a aprovação prévia para “inauguração, o lançamento, a divulgação, a promoção e a distribuição” de produtos, peças promocionais e campanhas institucionais relativas a projetos realizados com recursos da Lei Federal, dependerá da anuência da Secretaria Especial de Cultura.

“Tal previsão descaracteriza em absoluto o projeto/produto cultural, que pelo próprio sistema de cadastramento, e previsão do proponente já possui um cronograma de execução físico e financeiro, separado por metas de pré-produção, produção, execução e conclusão. Ou seja, o proponente não mais terá planejamento e controle sobre os atos do projeto cultural que será resultado do incentivo fiscal”, questiona ação protocolada no STF.

Segundo os partidos de Oposição, o decreto “não é um ato isolado e vem em momento de crise na área da cultura, em cenário de retrocesso evidente das políticas públicas no setor”. Além da redução de recursos investidos na cultura pelo governo Bolsonaro, os autores da Ação afirmam no documento que a Secretaria de Cultura tem atraso a análise de projetos que captam recursos via Lei Rouanet.

“Diante da lesão e da sua irreparabilidade, impõe-se a suspensão liminar do decreto editado pelo presidente da República, o que desde logo se requer e, na eventual constituição das decisões ali plasmadas e atos dele (decreto) decorrentes, sejam também sustadas tais deliberações, até deliberação ulterior do mérito”, pedem os partidos na ação.

Leia a íntegra da ação: 

ADPF Decreto 10755

 

Héber Carvalho

 

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