Escrito nas prisões pelas quais passou o seu autor entre os anos de 1972 e 1977 “Poemas do Povo da Noite” de Pedro Tierra, pseudônimo de Hamilton Pereira da Silva, descrevem os duros momentos passados pelos presos políticos, as torturas, a morte de muitos deles e a luta pela vida dos que resistiram.
Hamilton Pereira da Silva, militante da Ação Libertadora Nacional (ALN), foi preso em 10 de junho de 1972, quando tinha 24 anos, em Anápolis, Goiás, cidade próxima a Brasília. Era acusado de subversão e de atentar contra a segurança nacional. Submetido a longos períodos de tortura, permaneceu cerca de três meses incomunicável em quartéis do Exército, em Goiânia e em Brasília.
Foi transferido para São Paulo, onde esteve detido de março a outubro de 1973 na Oban/DOI-CODI (Operação Bandeirante/Destacamento de Operações de Informações-Centro de Operação de Defesa Interna). Foi, então, enviado ao Presídio do Hipódromo, depois à Casa de Detenção no Carandiru, à Penitenciária do Estado de São Paulo e ao Presídio do Barro Branco. Condenado inicialmente a 12 anos de reclusão –, sua pena foi fixada, após recurso, em cinco anos. Ele somente foi solto em 10 de março de 1977, após cumpri-la integralmente.
O “Poema — Prólogo” é uma boa síntese de sua obra escrita na prisão:
Fui assassinado.
Morri cem vezes
e cem vezes renasci
sob os golpes do açoite.
Meus olhos em sangue
testemunharam
a dança dos algozes
em torno do meu cadáver.
[…]
Fui poeta
do povo da noite
como um grito de metal fundido.
Fui poeta
como uma arma
para sobreviver
e sobrevivi.
[…]
Porque sou o poeta
dos mortos assassinados,
dos eletrocutados, dos “suicidas”,
dos “enforcados” e “atropelados”,
dos que “tentaram fugir”,
dos enlouquecidos.
Sou o poeta
dos torturados,
dos “desaparecidos”,
dos atirados ao mar,
sou os olhos atentos
sobre o crime.
[…]
meu ofício sobre a terra
é ressuscitar os mortos
e apontar a cara dos assassinos.
[…]
Venho falar
pela boca de meus mortos.
Sou poeta-testemunha,
poeta da geração de sonho