Por uma nova lei contra o abuso de autoridade

Em artigo publicado no jornal O Globo e no site 247, o líder da Bancada do PT na Câmara em 2017, deputado Carlos Zarattini (SP), critica os casos de abuso de autoridade que proliferam pelo País e defende a aprovação de uma lei para impedir essa prática. Ao dar como exemplo o caso da trágica morte do reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, Luiz Carlos Cancellier de Olivo – levado ao suicídio após ser vítima de uma investigação que envolvia seu antecessor – Zarattini ressalta que “somente com a punição dos abusos praticados por autoridades pode haver garantia de proteção as liberdades individuais garantidas a todos os brasileiros pela Constituição”.

Leia a íntegra:

Punitivismo policialesco

Não faltam exemplos de abusos de autoridade no Brasil, em todas as instâncias de poder. De uns tempos para cá, os casos aumentaram. Agentes públicos que deviam servir estritamente a lei a violam e afrontam a Constituição. O resultado é que os direitos individuais são massacrados e cria-se uma base para uma sociedade autoritária e antidemocrática.

O melhor exemplo é o da trágica morte do reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, Luiz Carlos Cancellier de Olivo. Foi levado ao suicídio depois de ser vítima de uma investigação que envolvia seu antecessor. Diante dos abusos sofridos, protestou tirando a própria vida. A operação que o levou à morte foi conduzida de forma irresponsável e midiática por uma delegada da Polícia Federal, uma juíza e outros agentes públicos.

A Lei de Abuso de Autoridade vigente no país foi editada em 1965, durante o governo militar. Passados mais de 50 anos, hoje é inócua. Precisa ser revista. Punir abusos de autoridade no Brasil é única forma de protegermos as liberdades individuais.

Os abusos alcançam, potencialmente, todos os segmentos. Se não forem contidos, teremos uma estrutura autoritária em que o Estado sobrepujará os direitos dos cidadãos. Além de conduções coercitivas e atitudes truculentas de agentes do Estado, tornaram-se comuns manifestações públicas e fora dos autos de juízes, desembargadores e ministros sobre casos que podem vir a julgar, o que afronta o pressuposto de imparcialidade. Essas atitudes devem ser coibidas.

Se há leis para punir abusos praticados pela imprensa e até para o cidadão que ofender funcionários públicos, por que não uma contra os abusos de autoridade? Se certas autoridades extrapolam os limites da lei ou mesmo a ignoram, fazendo suas próprias leis, cabe ao Estado a aplicação de mecanismos que coíbam essas práticas.

Vivemos um verdadeiro punitivismo de um Estado policialesco, que impõe a todos a condição prévia de criminosos, em que cabe à vítima provar sua inocência. Já não podemos mais presenciar os abusos das conduções coercitivas sob qualquer pretexto, com espetacularização midiática que mancha a honra das pessoas. Chega de invasões de universidades e de casas sem autorização judicial. Chega de atrocidades cometidas por setores do Judiciário em nome do combate à corrupção; não se combate ilegalidade com ilegalidade.

Ressalte-se de que não se trata de ameaça ao Judiciário nem ao Ministério Público. O princípio é criar barreira aos agentes de Estado que acham que podem agir à margem da lei. É preciso respeito à legislação. Fora disso, é ditadura.

Carlos Zarattini é deputado federal (PT-SP) e foi relator da Lei Anticorrupção

 

 

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