Durante seminário internacional sobre modelos previdenciários, parlamentares petistas e de oposição combateram o sistema de capitalização proposto na Reforma da Previdência de Bolsonaro, a PEC 06/2019. Os petistas e especialistas convidados defenderam o atual sistema, solidário, criado pela Constituição de 88, como forma de garantir uma renda futura para toda a população.
O evento promovido pela comissão especial que analisa a reforma da Previdência (PEC 06/19) reuniu especialistas nesta terça-feira (4) na Câmara.
Sônia Teixeira, pesquisadora da Fiocruz, que participou da discussão da Constituição Federal, disse que o constituinte criou um sistema que prevê não apenas a contribuição do trabalhador, mas contribuições sobre faturamento e lucro; porque o espírito da lei era que toda a sociedade garantisse o sistema de aposentadorias.
Segundo Sônia, o sistema de capitalização, de contas individuais de poupança, depende de fatores que não estão sob o controle do trabalhador e afirmou que, no caso da reforma em discussão, nenhum detalhe foi apresentado, tornando a mudança mais incerta.
Para a pesquisadora, o sistema atual talvez seja o mais adequado para um cenário de mudanças no mercado de trabalho, com muitas profissões desaparecendo e novas formas de relações de trabalho surgindo.
“A sociedade como um todo deverá contribuir para aposentadorias e pensões. Então neste momento nada mais atual do que a Seguridade Social tal como ela está formulada na Constituição. Deve ser aperfeiçoada, deve ser adequada a um momento em que a sociedade está mudando o seu perfil demográfico? Claro que sim. Mas a essência está correta”, concluiu.
O deputado Henrique Fontana (PT-RS), membro da Comissão Especial, reafirmou as críticas ao conteúdo da PEC 06, que altera profundamente o sistema de Previdência. Para ele, a proposta do governo agrava o problema da desigualdade social no Brasil, pois concentra renda e cobra o ajuste fiscal dos setores mais frágeis da sociedade.
O parlamentar criticou a tentativa do governo de dividir o País entre os que são a favor ou contra fazer reformas para o Brasil. “Estamos debatendo a PEC 06, que é uma proposta, uma visão de como mexer na Previdência. E na nossa visão ela é profundamente equivocada, pois agravará o maior problema a frear o desenvolvimento econômico e social do nosso País”, afirmou, ao lembrar que dos cerca de R$ 4 trilhões que o governo diz que pretende economizar em 20 anos, 94% serão retirados da aposentadoria de trabalhadores que recebem benefícios de até 3 salários mínimos.
Vice-líder da oposição na Câmara, Henrique Fontana questionou a prioridade do governo Bolsonaro para buscar o equilíbrio fiscal. “Ao invés de tirar R$ 600 daqueles que ganham R$ 1.000 de BPC (Benefício de Prestação Continuada), por que não estamos votando uma Reforma Tributária, instituindo um imposto de renda progressivo para todos, ou criando um imposto sobre lucros e dividendos, que com uma taxa de 20% poderia garantir uma arrecadação de R$ 50 bilhões por ano? Com isso, livraríamos as aposentadorias de valores mais baixos”, apontou o deputado.
Privatização da Previdência
Fontana ainda fez duras críticas à proposta de capitalização do governo, que ele classifica como “privatização da Previdência”. Ao lembrar que a capitalização já existe no Brasil para quem tem poder econômico, questionou: “Por que os bancos querem o monopólio do sistema de aposentadoria do País? Isso o ministro Paulo Guedes não consegue explicar! Não vamos cair nessa aventura de capitalizar um sistema que está funcionando bem, e precisa apenas de ajustes.”
O economista Milko Matijascic, técnico do Ipea, informou que vários países tiveram que rever seus modelos de capitalização após a crise financeira de 2008 e citou o caso dos Estados Unidos. “As pessoas tiveram que trabalhar de 4 a 5 anos a mais por causa da crise para se conformar em receber de 25 a 30% menos de benefícios em relação a esses fundos”.
Chile
O novo sistema de capitalização proposto na reforma da Previdência (PEC 6/19) foi um dos pontos principais do seminário internacional. Representantes do Chile, que adotou esse modelo em 1981, apresentaram os resultados da experiência.
A presidente da Associação dos Aposentados e Pensionistas do Chile, Cristina Poblete, revelou que o sistema chileno prometeu benefícios de 70% dos salários, mas paga hoje cerca de 35% para homens e 28% para mulheres. Por conta disso, as pessoas preferem permanecer informais, segundo Poblete.
De acordo com ela, não há incentivo para que os trabalhadores contribuam com a Previdência. “Porque sabem que sua aposentadoria será ruim e preferem poupar por fora do sistema ou comprar um imóvel para viver de renda futuramente”, explicou.
Cristina Poblete criticou ainda o fato de o sistema de capitalização não estar baseado na seguridade social e ser individualista. Entre os principais problemas desse modelo, ela aponta o fim da contribuição patronal, um sistema de poupança forçada e sem benefícios definidos, que depende exclusivamente do que o trabalhador conseguiu juntar. “O sistema fracassou em seu objetivo central de entregar aposentadorias justas e suficientes”, informou.
Professor do Departamento de Direito do Trabalho e Seguridade Social da Universidade do Chile, Cláudio Cáceres explicou que o sistema de capitalização chileno se baseia em fundos de pensão que aplicam cerca de 10% do salário do trabalhador e pagam benefícios de acordo com as poupanças acumuladas, após a cobrança de taxas de administração. Segundo ele, é preciso ter uma idade mínima de 60 anos, se mulher; e de 65 anos, se homem. Quem contribuiu entre 15 e 20 anos, segundo o especialista, tem hoje uma renda média de R$ 1.032.
O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) avalia que os parlamentares devem decidir a quem proteger com a Reforma da Previdência. “Daremos toda garantia para o sistema financeiro e nenhuma para os trabalhadores brasileiros? ”, indagou.
Terrorismo econômico
O professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília José Luis Oreiro acredita que o governo faz “terrorismo econômico” com o crescimento da dívida pública. Ele disse que o ritmo de crescimento da dívida vem diminuindo e que o problema da Previdência é o baixo crescimento econômico, que não será resolvido com a reforma.
Para o deputado Pedro Uczai (PT-SC) está evidente que os 30 países que implantaram a privatização da Previdência pública, do regime de repartição para o regime de capitalização, fracassaram, pois só se concentrou renda, aumentou-se a desigualdade social, a miséria e a pobreza dentre os idosos. Um terço sobre o salário do último mês é a média dos aposentados chilenos ou bolivianos ou argentinos. “Em relação às mulheres essa média é mais grave, mais criminosa, em torno de 28% sobre o salário que recebia. Esta é a aposentadoria das mulheres chilenas, ou peruanas, ou bolivianas, ou argentinas”, revelou Uczai.
Segundo Pedro Uczai, 18 países já renunciaram ao sistema de capitalização. “E nos países em que ainda não se conseguiu voltar atrás, os governos precisam sustentar, subsidiar essas pessoas, porque o regime de capitalização, a privatização da Previdência pública, é o maior crime”, sustentou o parlamentar.
Para Pedro Uczai, se o Parlamento votar a capitalização, a privatização da Previdência, irá cometer o maior crime de lesa-pátria contra o povo brasileiro, contra os trabalhadores e as trabalhadoras. “Ficou claro, nem o cara do Banco Mundial defendeu a privatização da Previdência, quando se diz que precisa de repartição e se poderia complementar a capitalização, mas nunca ser suprimido e eliminado o regime de repartição solidário, em que o tripartite sustenta a Previdência pública”, finalizou.
Por sua vez, o deputado Carlos Veras (PT-PE) avaliou que a reforma precisa ser feita com menos caneta, mais coração. “O governo Bolsonaro trata a vida das trabalhadoras e trabalhadores deste País em uma planilha do Excel. Não considera os custos e nem os impactos negativos que a Reforma da Previdência trará para o povo brasileiro. Os banqueiros são os únicos beneficiários desta reforma da Previdência”, criticou.
PT na Câmara com assessorias e Agência Câmara Notícias