Em artigo que assinou no Correio Braziliense, Ciro Nogueira afirma: “Não vamos escolher um presidente, vamos escolher um futuro”. Mesmo com tantos anos de leitura, tenho dificuldade de lembrar de uma frase tão desprovida de conteúdo quanto essa. Fico pasmo e não sei avaliar se resulta de incompetência ou de má fé.
Imaginemos o que teria acontecido se os ingleses, seguindo essa máxima “ciriana”, em vez de levar Winston Churchil de volta para o comando da nação para enfrentar Hitler, tivessem optado por permanecer com os frouxos do Partido Conservador de Chamberlain que permitiram o empoderamento do ditador alemão. E se os norte-americanos, em lugar de Franklin Delano Roosevelt, tivessem optado por alguém ao estilo de Donald Trump. Talvez estivéssemos todos sob o julgo do nazismo ou então mortos.
Saindo de um ministro de Estado, mesmo que escrita por assessor, é estarrecedor que se desconheça a relação entre as altas funções do presidente da República e a condução da nação, especialmente em momentos de graves crises. A concepção e execução de políticas capazes de retirar o Brasil da crise ou aprofundá-la passa necessariamente pela capacidade do presidente escolher sua equipe de ministros e de coordenar seu trabalho, definindo as prioridades.
Com Bolsonaro, já vimos o que sua vontade amalgamada com sua incompetência é capaz de resultar ao Brasil. Pela sua vontade e também por suas omissões, cresceram o acesso a armas, a proliferação de mentiras e de intolerância nas redes sociais, o desmatamento, a fome, o desemprego, os preços dos alimentos, do gás de cozinha, da gasolina e do diesel, da energia elétrica etc.
A triste chaga de mais de 630 mil mortes pela covid tem a marca indelével do presidente, que se recusou a comprar vacinas no tempo certo, que desestimulou a vacinação e que sempre boicotou as medidas preventivas. É um genocida assumido e parte da elite não admite isso em função do interesse de amealhar mais alguns bilhões de dólares para suas empresas e fortunas pessoais. Afinal, para os super ricos, a atual condução da economia e do País vai muito bem.
Por outro lado, o orçamento da União revela bem o que não é prioridade do governo atual. O OGU consagra a redução dos recursos para educação, saúde, ciência e tecnologia, meio ambiente, cultura, agricultura familiar; arrocho salarial pela via da correção do salário mínimo apenas pela inflação; e por aí vai.
O ministro fala em quebra da Petrobras no governo do PT, demonstrando que é adepto convicto da mentira como método de disputa política. Bem ao contrário, foi justamente em nossos governos que a Petrobras foi alçada à condição de player internacional de primeira grandeza, capaz de disputar e até superar as grandes petroleiras do mundo.
Com recursos e tecnologia próprios, a empresa mapeou o pré-sal em 2006 e já em 2010 iniciou sua exploração. O resultado é que o Brasil conquistou autonomia em produção de óleo bruto, tornando-se inclusive grande exportador desse produto, e ao mesmo tempo aumentou sua capacidade de refino de modo a produzir aqui mesmo 80% dos derivados de petróleo que consumimos.
A fantástica dimensão do pré-sal levou o Brasil à condição de sétimo maior produtor de petróleo do mundo e criou oportunidades de geração extraordinária de recursos financeiros e tecnológicos. Numa visão de mercado, como a defendida pelo atual governo, esses recursos devem ser apropriados apenas pelos acionistas e pelas petroleiras. Na visão do PT – e isto explica parte do golpe de 2016 – boa parte dessa riqueza extraordinária e finita deve ser colocada a serviço da nação.
Nossos governos adotaram o modelo de contrato de partilha da produção no pré-sal em vez dos contratos de concessão, conforme a Lei n⁰ 12.351 de 2010. Os contratos de partilha da produção destinam à União parte significativa do recurso extra do pré-sal e, como parte da visão estratégica de colocar o petróleo finito a serviço de investimentos estratégicos para o Brasil, essa mesma lei criou o Fundo Social que destina 50% desses recursos para a educação e saúde. Recursos que estavam viabilizando, por exemplo, a expansão da escola pública de tempo integral.
Com o golpe e os governos Temer e depois Bolsonaro, tudo isso caiu por terra. Assim, nada de novos contratos de parceria; nada de exigência de conteúdo nacional nas compras da Petrobras, que incentivava a indústria naval nacional; nada de recursos do petróleo para a educação. E, por último, a dolarização dos preços dos combustíveis, garantido super lucros que são apropriados apenas pelos acionistas, num modelo em que o pobre e a classe média têm que se sacrificar ao comprar gás de cozinha e gasolina para poder aumentar a taxa de lucro dos acionistas da bolsa de Nova Iorque.
Esse “futuro” já é presente no Brasil e beneficia apenas 1% da população, os super ricos. Esse “futuro” já é presente sob Bolsonaro, e não há nada que não possa piorar com ele e sua turma no poder por mais quatro anos.
Merlong Solano é deputado federal PT-PI