O Núcleo do Trabalho da Bancada do PT na Câmara debateu nessa segunda-feira (22) os retrocessos contidos na proposta de emenda à Constituição que altera profundamente o desenho da administração pública no País (PEC 32/2020). Durante a reunião comandada pelo coordenador do Núcleo, deputado Rogério Correia (PT-MG), representantes de organizações sindicais ligadas ao serviço público ouviram da assessoria jurídica da Bancada do PT os retrocessos contidos na PEC e definiram as primeiras ações de resistência à proposição. Correia também é um dos coordenadores da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público.
Segundo a Assessora da Bancada do PT, Clara Lis Coelho, a PEC 32 é baseada em estudo do Banco Mundial e calcado na velha cantilena neoliberal do Estado mínimo. “Essa reforma não atinge apenas servidores, mas toda a estrutura e o papel do Estado definido pela Constituição de 1988, que é uma Constituição Cidadã e com senso de dever público. Tudo isso é alterado para a concepção de um novo Estado liberal e privatizante, de acordo com o interesse do mercado financeiro”, esclareceu.
Entre os ataques aos servidores públicos, ela explicou que a PEC 32 acaba com a regra geral da estabilidade no serviço passando a garantir esse direito apenas para as carreiras típicas de Estado. A proposta ainda permite a cumulatividade de cargos e cria uma nova espécie de cargo público – mesmo via concurso – no qual o servidor terá um ano de vínculo de experiência com a administração, podendo ser dispensado após esse período caso sua avaliação não seja considerada satisfatória.
“Isso abre brecha para o aparelhamento político nas nomeações, perseguição e autoritarismo na administração pública. O foco deixaria de ser a aprovação no concurso público”, alertou Lis Coelho. Segundo a PEC 32, o fim da estabilidade e as regras de avaliação afetam tanto os atuais quanto futuros servidores públicos.
A proposta também altera profundamente o desenho do Estado e sua capacidade de intervir na economia. Entre outros pontos, a PEC prevê que apenas o presidente da República tenha o poder de promover alterações no desenho das instituições da administração pública, tirando as atuais atribuições do Congresso Nacional. Ela ainda impede que o Estado execute políticas públicas que intervenham ou regulem a economia.
Para o deputado Rogério Correia, a proposta tenta emplacar no Brasil as mesmas propostas de Estado Neoliberal que Paulo Guedes ajudou a implementar no Chile, quando trabalhou para o governo ditatorial de Augusto Pinochet.
“Essa Constituição caiu lá no Chile porque aumentou a miséria e a pobreza. A população saiu às ruas exigindo uma nova Constituição. Paulo Guedes quer refazer a Constituição de 1988, e o Congresso Nacional não pode permitir isso porque ele não foi eleito para ser constituinte, que seria a única forma de se fazer uma nova Constituição”, alertou.
O representante da CUT Nacional Pedro Armengol ressaltou que a PEC não é uma ação isolada, mas faz parte do avanço neoliberal no País que ocorre desde o golpe de 2016 contra a então presidenta Dilma Rousseff. Ele enumerou entre os retrocessos recentes a aprovação da Emenda Constitucional do Teto de Gastos (EC 95), da Reforma da Previdência, a liberalização das terceirizações no serviço público e a recente aprovação da PEC 186.
“Além das consequências nefastas para o serviço público, essa PEC tem o objetivo central de retirar as pessoas do Orçamento, liberando os recursos para pagamento dos juros da dívida e aumentando os lucros do mercado financeiro”, acusou.
Resistência
Durante a reunião, vários líderes sindicais de entidades ligadas ao serviço público apresentaram propostas de ações para resistir ao avanço da PEC. O deputado Rogério Correia anunciou que a Bancada do PT decidiu em uma reunião que a partir dessa semana vai obstruir a votação de qualquer votação na Câmara que não esteja ligada ao combate à pandemia e auxílio à população brasileira.
Foram debatidas ainda algumas ações iniciais de combate à PEC 32. A partir de hoje, por exemplo, será estimulada o uso da hastag “#PEC32daGranada”. A expressão faz referência à famosa frase dita pelo ministro Paulo Guedes durante uma reunião ministerial onde o titular do Ministério da Economia disse que iria “colocar uma granada no bolso do inimigo”, fazendo referência aos servidores públicos.
Na próxima quarta-feira (24), os líderes sindicais também ressaltaram que a defesa do serviço púbico será lembrada durante os atos da paralisação nacional convocada pelas Centrais Sindicais contra a política genocida de Bolsonaro em relação à pandemia e pela vacinação já. O dirigente da CUT anunciou que a Central irá promover também a partir de quarta-feira (24) uma grande campanha institucional em defesa do serviço público, com veiculações nacionais na TV, rádio e jornais.
Além desses atos, eles ainda sugeriram atos de pressão sobre os deputados federais em suas bases eleitorais. O coordenador do Núcleo do Trabalho lembrou que a história recente demonstra que a pressão popular pode mudar os rumos de uma proposta no Congresso Nacional.
“A PEC 186 foi aprovada, mas antes ela foi muito desidratada, com importantes mudanças feitas pela Oposição, apesar de ser minoritária. Podemos fazer o mesmo agora com essa PEC 32, a exemplo do que fizemos com apoio da sociedade com a MP da Carteira Verde Amarela, que retirava direitos e foi enterrada, e com o Novo Fundeb, que aprovamos inclusive com aumento de recursos, após uma grande mobilização popular. Com uma grande mobilização social podemos derrotar essa PEC do governo Bolsonaro, cujo governo já se encontra muito desgastado”, afirmou.
Sobre o rito de tramitação da PEC a assessora da Bancada do PT Eneida Dutra destacou que a proposta hoje se encontra na Comissão de Constituição e Justiça. Segundo ela, a Bancada do PT já apresentou inúmeros requerimentos para debater a proposta no colegiado, enquanto mobiliza forças dos movimentos sindicais e sociais para tentar barrar a continuidade da tramitação da matéria. Se a matéria for aprovada na CCJ, ainda terá que passar por análise de uma Comissão Especial ante de ser votada no plenário da Câmara.
Os deputados petistas Vicentinho (PT-SP) e Leonardo Monteiro (PT-MG) também participaram da reunião. Ainda se manifestaram contra a PEC 32 os representantes da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), da Pública – Central do Servidor, da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal (Confetam), da Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico Técnico e Tecnológico (Proifes), da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB), da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf) e do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (Sinal).
Héber Carvalho