“Nova previdência”: a mentira como modo de governar

Bolsonaro foi eleito sob o império da mentira. Mentiu antes, durante e depois das eleições. Não é de se surpreender que continue mentindo para se sustentar no poder. No seu governo, a mentira é um modo de governar, algo estruturante das relações que estabelece com seus apoiadores mais fervorosos, em seus embates com a mídia, com a oposição e, porque não, com a própria sociedade brasileira.

Ao buscar o significado da palavra mentira, nos deparamos com a origem latina mentior – “fingir, dizer falsamente”. Em sua origem Indo-Europeia, mend quer dizer um ato falho, sem as pernas da verdade para se sustentar.

Se a mentira é o cimento que pavimenta o governo Bolsonaro, ela é também a principal artimanha discursiva para fazer a opinião pública brasileira acreditar na necessidade de uma reforma da previdência que em tese teria dois objetivos principais: combater o rombo nas contas públicas e retomar as condições para o crescimento econômico do Brasil.

Em visita recente aos EUA, Bolsonaro disse que era preciso desconstruir muita coisa, para começar a construir. A tarefa aqui é exatamente essa: desconstruir a narrativa oficial do governo e apontar as alternativas existentes para preservar direitos e retomar o caminho do desenvolvimento.

A espinha dorsal do discurso oficial é de que a “nova previdência” veio para “garantir o futuro” e “combater privilégios”. Duas grandes inverdades.

Primeiro, não há futuro com uma “reforma” que significa na prática o fim da previdência social, o maior programa de proteção social do Brasil. Guedes e Bolsonaro querem implantar o regime de capitalização, mesmo modelo adotado no Chile durante o governo do ditador Pinochet.

Em resumo, o sistema de capitalização acaba com a aposentadoria social e solidária. Neste modelo, o Estado e o empregador não contribuem com a previdência, que passa a ter apenas a contribuição individual. Ou seja, o trabalhador, sozinho, terá que garantir os meios para a sua aposentadoria.

No Chile, a capitalização gerou efeitos catastróficos, a exemplo, de 80% dos aposentados receberem menos do que um salário mínimo, o que faz do país o campeão latino-americano em número de suicídio de idosos. É esse o futuro que Bolsonaro quer para os idosos brasileiros!

Segundo grande engodo utilizado pelo governo Bolsonaro para justificar o fim do direito à aposentadoria do povo brasileiro é dizer que a reforma veio para “combater privilégios”. Tal discurso não se sustenta quando analisamos com mais afinco os números.

O “superministro” da Fazenda, Paulo Guedes, tem dito aos quatro ventos que a reforma vai gerar uma “economia” de pouco mais de R$ 1 trilhão em dez anos. Quando olhamos para as entranhas da proposta, vemos o tamanho da crueldade que está sendo gestada contra os mais pobres.

Mais de 70% da chamada “economia” vai sair exatamente do fim do direito à aposentadoria dos trabalhadores e trabalhadoras de baixa renda do campo e da cidade, os quais morrerão sem se aposentar para gerar uma poupança de R$ 715 bilhões para o governo em uma década. É importante destacar que no Regime Geral de Previdência Social (RGPS) as aposentadorias giram em torno de R$ 1,2 mil. É isso que o governo Bolsonaro chama de privilégio?

Recentemente o governo enviou para o Congresso o projeto que cria as novas regras para a aposentadoria dos militares. Propalaram que num momento em que todos devem apertar o cinto, os militares não poderiam ficar de fora e deveriam, como bons patriotas que são, também dar sua parcela de contribuição para o ajuste fiscal.

Acontece que a proposta de aposentadoria dos militares é uma peça de ficção. Na esteira das novas regras, os militares que hoje estão no poder enviaram uma generosa proposta de reestruturação de suas carreiras que vai elevar sobremaneira a sua renda bruta. A economia que seria gerada em 10 anos, de algo em torno de R$ 90 bilhões, virou pó e reduziu-se a algo próximo a R$ 1 bilhão por ano, o que deve ser motivo de questionamento no parlamento e nas ruas.

Ou seja, os militares vão colaborar com 70 vezes menos do que aquilo que está se exigindo do povo pobre deste País. No frigir dos ovos, a contribuição dos militares tornou-se irrisória, se comparada ao sacrifício de trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade, pensionistas, idosos em situação de miséria e pessoas com deficiência beneficiárias do Benefício de Prestação Continuada (BPC).

O governo também mente ao afirmar que a previdência social é, hoje, o maior gasto público da União e principal responsável pelo rombo nas contas públicas.

Quando nos debruçamos sobre o Orçamento Federal Executado em 2018 vemos que a principal despesa da União é o pagamento dos juros e amortizações da dívida pública, que sozinho consumiu algo em torno de 40,66% de tudo que o País gastou no ano. A previdência social foi responsável por 24,48% das despesas.

Infelizmente esses não são os únicos embustes discursivos por trás da “nova reforma”. Ao lado da falsa iniciativa de se combater privilégios e de que a previdência é responsável pelo desajuste das contas públicas, está, ainda, o engodo de que a previdência social é deficitária.

De forma absolutamente cínica e covarde, o governo omite que a previdência social é um direito constitucional inalienável e faz parte do orçamento da seguridade social que é superavitário. O orçamento da seguridade social garante repasses constitucionais para as áreas de saúde, previdência e assistência social e é composto a partir das contribuições dos trabalhadores, empregadores e da arrecadação tributária da Cofins, da CSLL e do PIS/PASEP.

O que o governo oculta do debate público é que as receitas que deveriam compor o orçamento da seguridade social estão sendo utilizadas para privilegiar banqueiros. A partir de um instrumento chamado Desvinculação das Receitas da União (DRU), a União retirou, somente em 2017, R$ 113 bilhões da previdência para pagar juros e amortizações da dívida pública.

Retirar mais de uma centena de bilhão das políticas sociais de saúde e previdência para engodar banqueiros é combater privilégios?

Outra falácia inominável é dizer que os recursos “economizados” com a reforma da previdência serão revertidos para políticas públicas de saúde, educação e segurança. Ora, esquecem convenientemente de dizer que o Brasil está sob o julgo de uma Emenda Constitucional (EC 95), que congelou todos os gastos públicos por 20 anos, norma que está em vigência até o ano de 2036.

Ao invés de tentar enganar o povo brasileiro com um discurso ufanista de que a “nova reforma da previdência” vai resolver de forma mágica todos os problemas do Brasil, o governo deveria empenhar-se em buscar alternativas factíveis para retomar o desenvolvimento econômico e social do Brasil. Mas sabemos que o governo Bolsonaro não tem projeto de País, resume-se a ser um ventríloquo dos interesses dos EUA e do mercado financeiro nacional e internacional.

O ideal seria o Congresso rejeitar a reforma da previdência e centrar esforços na aprovação de uma reforma tributária progressiva, que pudesse diminuir a incidência tributária sobre a renda e o consumo e taxar de forma mais acentuada os mais ricos, as grandes fortunas, lucros e dividendos.

Ao invés de abandonar os idosos à própria sorte na velhice, o governo poderia ao menos criar estratégias de combater a sonegação previdenciária, que segundo levantamento da CPI Mista do Congresso Nacional da Previdência Social é de algo em torno de R$ 450 bilhões por ano. Saídas existem, o que não existe é vontade política para implementá-las.

Por fim, o governo tentou se utilizar da palavra “nova” para dourar a pílula, escamotear, os prejuízos sociais incalculáveis que a reforma da previdência vai gerar. Pergunto: o que tem de “novo” no fim do direito do povo à aposentadoria?

A tal “nova reforma” nada mais é que um inequívoco retrocesso nas lutas sociais e políticas do povo brasileiro, as quais garantiram a constitucionalização dos direitos sociais na nossa Carta Magna de 1988. Ameaçar os direitos sociais e previdenciários é crime de lesa-humanidade, é um atentado histórico contra o constitucionalismo moderno, que assegurou os direitos sociais como direitos fundamentais de segunda geração. Em última instância, é ferir de morte os direitos humanos, algo que esse governo tanto despreza.

 

*Erika Kokay é deputada federal pelo PT-DF.

Está gostando do conteúdo? Compartilhe!

Postagens recentes

CADASTRE-SE PARA RECEBER MAIS INFORMAÇÕES DO PT NA CÂMARA

Veja Também

Jaya9

Mostbet

MCW

Jeetwin

Babu88

Nagad88

Betvisa

Marvelbet

Baji999

Jeetbuzz

Mostplay

Melbet

Betjili

Six6s

Krikya

Glory Casino

Betjee

Jita Ace

Crickex

Winbdt

PBC88

R777

Jitawin

Khela88

Bhaggo

jaya9

mcw

jeetwin

nagad88

betvisa

marvelbet

baji999

jeetbuzz

crickex

https://smoke.pl/wp-includes/depo10/

Depo 10 Bonus 10

Slot Bet 100

Depo 10 Bonus 10

Garansi Kekalahan 100