Relativizar a gravidade da pandemia, dizendo que é preciso salvar a economia para salvar vidas é uma falsa questão. Quem ainda defende essa tese, geralmente se apoia numa narrativa verdadeira para chegar num conclusão falsa – dizem que respeitar a quarentena é tarefa para quem tem dinheiro, mas não uma alternativa para a parcela mais pobre da população, que precisa sair para ter, ao final do expediente, dinheiro pra comprar pelo menos um pão. Essa seria a parte verdadeira.
Corrobora com esta tese, o fato do desemprego e da informalidade estarem nas alturas, o que levou muitos que antes tinham carteira assinada a viver de bicos, ou seja, não podem ficar em casa sem serviço. Segundo pesquisa da Central Única de Favelas (CUFA), sem o auxílio emergencial, 68% dos moradores das favelas não conseguem comprar alimento. Entre os que não cumprem as medidas de restrição, a principal justificativa é a necessidade financeira, bem à frente daqueles que acham que seguir as medidas não é necessário.
Mas porque então afirmar que se trata de uma falsa questão, opor a manutenção da atividade econômica com a necessidade de um lockdown mais rigoroso para salvar vidas? Por duas razões bastante simples: bem ou mal, o Brasil tem governo e este tem a obrigação de zelar minimamente por sua população, aumentando os recursos destinados ao auxílio emergencial, bem como ampliando o acesso à moradia e à alimentação sadia. Desta maneira, boa parte daqueles que saem às ruas para buscar algum ganha pão, poderiam ficar em casa, especialmente nas fases mais agudas de contaminação.
A segunda explicação que desmonta esse falso dualismo é que ainda existe uma parcela significativa da população que pode sim trabalhar de casa e deve ser estimulada a fazê-lo. Estas pessoas tem uma responsabilidade dobrada, já que cabe a elas manter o isolamento para garantir sua própria saúde mas também uma menor exposição ao vírus por parte dos trabalhadores em serviços essenciais e daqueles que não tiveram acesso ao auxílio emergencial. Ou seja, o lockdown não é impossível, o auxílio emergencial é que é indispensável.
Nilto Tatto é deputado federal PT-SP