A aprovação da proposta que retirou do texto-base da Medida Provisória 696/15, aprovada na Câmara, a expressão “da incorporação da perspectiva de gênero” gerou críticas de diversos parlamentares e também do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos, conforme nota pública divulgada nesta sexta-feira (19).
A mudança na expressão, que constava das atribuições do recém-criado ministério, obteve o apoio de 188 parlamentares, e o voto contrário de 166, além de duas abstenções. A retirada da expressão na formulação, coordenação, definição de diretrizes e articulação de políticas para as mulheres, obriga o ministério a fazer um planejamento sem a incorporação da perspectiva de gênero.
Durante a votação, as deputadas Erika Kokay (PT-DF) e Maria do Rosário (PT-RS) explicaram ao plenário a importância de manter o texto, e a atribuição natural do ministério.
“Quando se quer suprimir a expressão gênero, para além de uma afronta à gramática neste País, quer-se suprimir a lógica que leva à discriminação, à violência e à morte de tantas mulheres. Quando nós falamos que é preciso ter equidade de gêneros, nós estamos falando que é preciso que o gênero masculino e o gênero feminino tenham os mesmos direitos”, destacou Kokay.
Na mesma linha, a deputada Maria do Rosário respondeu as afirmações realizadas por integrantes da bancada evangélica, de que a expressão seria um incentivo a “massificação do terceiro sexo”. “A perspectiva de gênero não é contra nenhuma religiosidade. A perspectiva de gênero é um tema que trata da cultura, da forma como as pessoas percebem a sua presença construída no âmbito da cultura”, esclareceu.
Sobre a questão cultural, a deputada Erika Kokay reforçou que culturalmente o Brasil ainda continua machista. “Nós não somos discriminadas porque nascemos mulheres. Somos discriminadas porque se construiu uma concepção cultural de gênero de que mulher tem que ficar em casa, de que não tem que ocupar as tribunas, de que mulher não tem que ter direito a ela mesma, a exercer a condição humana de ser sujeito da sua vontade e da sua própria vida”, explicou.
Fundamentalismo– Durante a votação, integrantes da bancada evangélica insinuaram que o objetivo de manter a expressão “da incorporação da perspectiva de gênero” atendia a um interesse de destruir a concepção tradicional da família brasileira, e incentivo à massificação do “terceiro sexo”. Os argumentos foram prontamente rechaçados pela parlamentar gaúcha, e ex-ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário.
“É preciso que o fundamentalismo não esteja presente na decisão sobre as leis. Retirar a perspectiva de gênero de um Ministério das Mulheres é incentivar a violência contra a mulher, é incentivar as discriminações, o que, tenho certeza, ninguém neste plenário é favorável”, observou.
Leia a íntegra da nota do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos:
O Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos lamenta profundamente a retirada da expressão “da incorporação da perspectiva de gênero” do âmbito das suas atribuições, conforme ocorrido nesta quinta-feira (18), em votação do texto-base da MP 696/15 no Plenário da Câmara dos Deputados.
O Ministério, por meio das secretarias especiais de Políticas para as Mulheres, de Políticas de Promoção da Igualdade Racial e de Direitos Humanos, reitera que a perspectiva de gênero se sustenta na busca pela equidade entre mulheres e homens, compromisso do Estado brasileiro, e reafirma a fundamental importância da manutenção da expressão em suas atribuições.
Ressalta, ainda, que a incorporação da perspectiva de gênero está prevista nos princípios e diretrizes do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, aprovados e reafirmados nas três Conferências Nacionais de Políticas para as Mulheres realizadas.
Também se faz necessário destacar que o terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) é a maior referência do Estado brasileiro na condução e desenvolvimento de todas as políticas públicas de direitos humanos, junto com todos os tratados internacionais dos quais o Estado brasileiro é signatário e que versam sobre direitos humanos.
Héber Carvalho
Foto: Gustavo Bezerra/PT na Câmara
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