Merlong Solano: O que os pobres podem esperar do governo Bolsonaro?

Ao longo de 12 anos, o Brasil sentiu os efeitos positivos de políticas voltadas para a erradicação da miséria e redução da pobreza. Foram muitas as ações e programas com esse fim, mas todos se alimentavam do mesmo sentimento: compromisso com a construção de uma Nação capaz de cuidar de todos os seus filhos e filhas, capaz de não deixar ninguém pelo caminho.

As políticas e programas então estruturados não eram de um ou outro ministério, eram do governo todo e poderiam muito bem ter se constituído em políticas de Estado se a maioria da população contasse com instrumentos mais efetivos para identificar e fazer valer seus interesses. Também teriam se tornado em políticas de Estado se as elites tradicionais brasileiras não fossem tão ciosas na defesa de seus privilégios.

Os resultados foram sentidos no Brasil e reconhecidos pelo mundo. Dentre eles eu destaco a retirada do Brasil do mapa mundial da fome, monitorado pela ONU; a redução sistemática da pobreza, que caiu de 23,4% da população em 2002 para 7% em 2014; e a quase erradicação da miséria, que caiu de 8,3% da população em 2002 para 2,5% em 2014. Dentre as muitas políticas que levaram a esses resultados, destaco as seguintes: aumento do valor real do salário mínimo, busca sistemática da geração de empregos, incentivo à agricultura familiar, e acesso dos mais pobres à previdência social e ao benefício de prestação continuada a partir dos 65 anos.

Com essas políticas o Brasil cresceu, gerou empregos e distribuiu renda para os mais pobres, embora os muito ricos tenham ficado mais ricos por outros caminhos (entre eles a elevada taxa de juros). Importante também destacar o papel da política externa, onde o Brasil adotou postura independente e pragmática, sempre procurando ampliar o mercado para nossas exportações de mercadorias e serviços.

Nesse período, o Brasil se tornou modelo para o mundo em termos de políticas de inclusão social e distribuição de renda. Pelos resultados obtidos e também pelo seu jeito singular, Lula se tornou liderança reconhecida mundialmente. Recebeu, por exemplo, de Universidades de diversos países 35 títulos de doutor honoris, tornando-se com certeza o torneiro mecânico mais homenageado.

Agora, depois de uma guerra eleitoral no estilo vale tudo – golpe legalizado de Estado para afastar Dilma; prisão de Lula sem crime; e um tsunami de mentiras bem plantadas nas redes sociais e na grande mídia – o Brasil está sob a liderança de Jair Bolsonaro.

No momento em que as expectativas são sombrias, em que a desesperança predomina, recorro ao magistral Carlos Drummond de Andrade para perguntar de um modo que só os poetas saber fazer, em poema popularizado na voz de Paulo Diniz: “E agora José, José para onde?” ou, como já não estamos em 1942, poderia ser assim: e agora Maria, Maria para onde?

Talvez os mais bem aquinhoados pela injusta estrutura socioeconômica brasileira ainda nutram esperanças no regime bolsonariano, afinal, para os mais empedernidos defensores de privilégios é melhor se abraçar com o diabo do que suportar um governo de caráter popular.

Todavia, os mais pobres, mesmo bombardeados por permanente campanha de desinformação, já não têm motivos para ter esperanças, e aqueles mais antenados certamente estão francamente decepcionados. Acredito que não pode ser diferente, pois o regime Temer/Bolsonaro, que chegou ao governo com o afastamento de Dilma e a prisão de Lula, vem se empenhando sistematicamente em desconstruir as políticas que levaram à redução da pobreza e da miséria.

Temer paralisou o Minha Casa Minha Vida, afetando negativamente a construção civil, o que provocou desemprego em larga escala e reduziu o índice de composição nacional das compras da Petrobras, de 65% para 25%, inviabilizando grande parte da indústria naval brasileira, que vinha gerando milhares de empregos de boa qualidade. Com isso, ele exportou empregos para outros países, como Japão e Estados Unidos. Mas o maior feito recessivo da era Temer foi a aprovação da Emenda Constitucional 95, que congela por 20 anos o gasto da União com pessoal, custeio e investimento, mas deixa livre o gasto com os juros da dívida pública.

Nessa mesma linha, Bolsonaro foi rápido no gatilho ao anunciar, antes mesmo de assumir, total apoio à Emenda 95. Além disso, antecipando o modo como os pobres seriam tratados, logo ao assumir, em janeiro, cortou em oito reais a previsão de aumento do salário mínimo (SM) deixada por Temer. Considerando 50 milhões de pessoas que recebem o SM, isso representou um corte mensal de 400 milhões de reais por mês na renda dos mais pobres.

Para completar sua obra de desconstrução, Bolsonaro ataca os mais pobres em muitas outras frentes. Destaco a proposta da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que reajusta o SM apenas pela inflação, sem conceder o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), como faziam Lula e Dilma; e também a proposta de reforma da previdência que prejudica a população de diversas formas: inviabiliza a aposentadoria dos trabalhadores rurais; aumenta o tempo mínimo de contribuição de 15 para 20 anos; eleva a idade de acesso ao Benefício de Prestação Continuada para 70 anos; e reduz o valor das aposentadorias, que passará a ser calculado pela média de toda a vida laboral e não apenas pela média dos últimos anos de contribuição.

Com crescimento da economia, geração de empregos, distribuição de renda e modo de governança que procurava facilitar a participação da sociedade na concepção das políticas públicas, o Brasil e Lula se tornaram referências positivas para o mundo.

Jair Bolsonaro, por sua vez, com suas políticas de exclusão e de intolerância, será lembrado como? Como alguém que rapidamente conseguiu destruir a esperança de toda uma nação? Quantas universidades lhe concederão títulos honoríficos?

 

Merlong Solano é deputado federal (PT-PI)

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