O líder do PT na Câmara, Elvino Bohn Gass (RS), qualifica como deplorável a proposta de adoção do sistema de “distritão” nas eleições para deputados e vereadores. De forma intempestiva, este tema foi incluído na pauta da Câmara na sessão de hoje (11).
Segundo Bohn Gass, o sistema proposto constitui ameaça à democracia e um ataque frontal aos direitos dos eleitores.
“A eleição apenas dos mais votados, conforme prevê o distritão, significa jogar no lixo milhões de votos, enfraquecer os partidos políticos, criar vantagens para candidatos endinheirados e instituir uma governabilidade caótica. É grave porque, na prática, dificulta profundamente a renovação política,” afirma Bohn Gass.
A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) precisa ser votada em duas sessões no plenário da Câmara e outras duas no Senado. A mesma proposta de “distritão” já foi votada e rejeitada pela Câmara duas vezes nos últimos anos, em 2015 e em 2017.
Ataque à democracia
Conforme lembra Bohn Gass, o sistema de adoção de votos majoritários para o Legislativo é extremamente criticado por cientistas políticos e especialistas em sistema eleitoral, que o tacham de “pior modelo possível”. Tanto que só quatro países no mundo o adotam: Afeganistão, Jordânia e dois países insulares. “Nenhuma grande democracia adota essa excrescência”, diz Bohn Gass.
O líder do PT explica que os direitos dos eleitores são atacados frontalmente porque os votos em candidatos que não são eleitos vão parar na lata de lixo, pois o distritão garante mandato só para os mais votados. No sistema atual, se o eleitor vota em candidato que perdeu, seu voto ajuda a eleger outro do mesmo partido. “No distritão, só nomes que estourarem a votação serão eleitos, não ajudando em nada outros candidatos do partido, então os votos excedentes são desperdiçados”, observa Bohn Gass.
O sistema proposto inviabiliza os partidos e a coordenação de campanhas eleitorais, diante da possibilidade de perda de votos. Hoje, só são desperdiçados votos em partidos que não conseguiram eleger nenhum candidato.
Os defensores do distritão querem equipará-lo às eleições para o Executivo, mas incorrem num erro. “No Executivo o voto é majoritário porque o cargo é único, ou seja, elegemos apenas um candidato. Já quando existem muitas vagas, como no Legislativo, o sistema majoritário pode ser mais problemático”, pondera o cientista político Jairo Nicolau em entrevista à BBC. “No distritão há muitas vagas, como em São Paulo, e concorre todo mundo contra todo mundo”, afirma Nicolau.
Pluralidade no Parlamento
Executivo e Legislativo também são diferentes. Conforme sublinha Bohn Gass, o Legislativo funciona como meio de representar todos os setores da sociedade, mas essa representação fica distorcida e disfuncional com o distritão. “Uma pessoa só pode canalizar os votos de um segmento específico, enquanto no sistema atual esse mesmo segmento pode ter vários representantes, arejando o Legislativo” pondera o líder do PT.
“Nós queremos que a legislação eleitoral seja cada vez mais vinculada para que a democracia e o voto do povo efetivamente sejam respeitados. Democracia é isso. Queremos real representação no voto, na pluralidade e na proporcionalidade pela diversidade e representação que o povo merece”, reforça o parlamentar gaúcho.
O líder do PT destaca que na eleição de 2018, se a escolha dos candidatos fosse pelo sistema do distritão, não teria havido a valorização do voto dos demais postulantes que disputaram a eleição e não foram eleitos. “Em 2018, 70% dos votos seriam desperdiçados, Ou seja, 68 milhões dos quase 100 milhões de eleitores que escolheram um candidato a deputado federal teriam seus votos descartados. Então, é uma afronta à democracia”, analisa.
Bohn Gass adverte, ainda, que outro retrocesso é a elitização da política, pois as campanhas ficarão caríssimas, abrindo caminho para a eleição apenas de milionários ou pessoas já muito conhecidas, sepultando a perspectiva de renovação dos legislativos.
“Isso é um estímulo ao populismo, ao hiperpersonalismo e ao abuso do poder econômico, com menos candidatos, campanhas milionárias e enfraquecimento dos partidos. Nenhuma das democracias mais maduras se constituiu sem o fortalecimento de partidos. Além disso, cada parlamentar será representante de si mesmo, sem sintonia com o partido pelo qual se elegeu, criando-se uma governabilidade caótica”, diz o deputado.
Retrocesso
Com o sistema de voto proporcional, conta-se o voto que a legenda recebeu, somando-se todos os candidatos e as vagas com base no número de votos que atingiu quociente eleitoral. O distritão acaba com isso.
Segundo Bohn Gass, o distritão prioriza popularidades de indivíduos em detrimento do aprimoramento do debate de ideias, programas e projetos para o país. E ainda acaba com qualquer incentivo ao esforço coletivo e com o voto na legenda. “Impede a possibilidade de se eleger parlamentares que representam melhor a diversidade de pensamentos que compõem a sociedade e derruba a qualidade do debate eleitoral.”
Votos no lixo
Ele frisa que o atual sistema proporcional, mantido pelas Constituintes de 1946 e 1988, funciona há 70 anos, possibilitando eleger parlamentar que tem os chamados votos de opinião, como intelectuais e líderes religiosos e comunitários. Lembrou que há criticas aos puxadores de votos por deformarem o sistema, mas enfatizou que distritão cristaliza e não corrige essa anomalia, “que pode ser solucionada com a exigência de patamar mínimo de votação”.
Bohn Gass diz, também, que o distritão induz os partidos à prática de apresentar poucos candidatos. E exemplifica: um estado como São Paulo, representado por 70 deputados de variadas legendas, “com certeza não teria mais que 90 candidatos”. E advertiu que o crime organizado, o tráfico ou as milícias teriam mais facilidade de eleger representantes nas regiões que controlam.”
Redação PT na Câmara