“Hoje só temo pela democracia…não aceitem um golpe”, afirma Dilma Rousseff em julgamento no Senado

Dilma senado EdilsonRodrigues

Em um discurso firme, (aqui na íntegra) mesclado por momentos de emoção e olhando nos olhos de todos os senadores, a presidente eleita Dilma Rousseff afirmou nesta segunda-feira (29), no Senado Federal, que é alvo de um “golpe de Estado” e que não cometeu os crimes de responsabilidade pelos quais é acusada. Disse ainda que o País corre o risco de uma “ruptura democrática”. Logo no início do seu discurso ela fez referência à tortura que sofreu quando presa política durante a ditadura militar. “Não posso deixar de sentir na boca novamente o gosto amargo da injustiça e do arbítrio”, afirmou.

Dilma disse para não esperarem dela o “obsequioso silêncio dos covardes”. “A retórica jurídica pretende atentar novamente contra a democracia e o Estado de Direito. A mim, cabe lamentar e resistir sempre. Resistir para acordar as consciências ainda adormecidas. (…) Eu estou do lado certo da história”.

A presidenta lembrou do apoio que vem recebendo dos brasileiros ao longo desse processo e fez um apelo final a todos os senadores para que não aceitem o golpe. “Peço que façam justiça a uma presidenta honesta, que jamais cometeu qualquer ato ilegal na vida pessoal ou nas funções públicas. Não interessa o que cada senador sente por mim, o que nós sentimos uns pelos outros importa menos nesse momento do que aquilo que todos nós sentimos pelo País, pelo povo brasileiro, pela democracia”, pediu.

Dilma destacou os 54,5 milhões de votos que recebeu do povo brasileiro para conduzir o Brasil por mais um mandato. Citou que a Constituição determina que para haver impeachment tem que se configurar crime de responsabilidade “e está claro que não houve tal crime. Não é legitimo, como querem meus acusadores, afastar o chefe de estado e governo por não concordarem com o conjunto da obra. Quem afasta o presidente por conjunto da obra é o povo, só nas eleições”, afirmou.

A presidenta eleita alertou que se o golpe for consumado resultará na eleição de um governo “indireto e usurpador”. Será a eleição indireta de um governo que na sua interinidade não tem mulheres nos ministérios, quando o povo nas urnas escolheu uma mulher para comandar o País. “Um governo que dispensa negros na sua composição ministerial e revelou profundo desprezo pelo programa escolhido e aprovado pelo povo em 2014”, disse Dilma.

Dilma disse que sempre acreditou na democracia e no Estado de Direito. “Jamais atentarei contra o que acredito ou praticaria atos contra os interesses daqueles que me elegeram”, e destacou que não luta pelo seu mandato por vaidade ou apelo ao poder “como é próprio dos que não têm caráter”. “Luto pelo povo do meu País, pelo seu bem estar”, assegurou.

Perseguição – A presidenta fez referência aos ex-presidentes Getúlio Vargas, Juscelino Kubtischeck e João Goulart, também alvos de tentativas de retirada do poder, e enfatizou que a “ruptura democrática” se dá agora sob pretextos constitucionais “embasados por uma frágil retórica jurídica”.

Vingança – Dilma fez críticas à atuação do ex-presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), réu no Supremo Tribunal Federal e alvo de um processo de cassação na Casa. Ela afirmou que o processo de impeachment é resultado de uma “chantagem” de Cunha, que agiu em retaliação depois que o processo de cassação foi aberto no Conselho de Ética da Câmara. “Todos sabem que este processo foi aberto por chantagem explícita do ex-presidente da Câmara, como chegou a reconhecer em declaração à imprensa um dos próprios denunciantes. Exigia aquele parlamentar que intercedesse para que deputados do meu partido não votassem pela abertura do seu processo de cassação. Nunca aceitei na minha vida ameaça ou chantagem. Se não o fiz antes, não o faria na condição de presidenta”, reforçou.

Quanto pior Melhor – Ainda sobre a articulação do ambiente para o golpe, Dilma citou que na presidência da Câmara, Cunha além de não ter dado apoio a medidas para combate à crise econômica, ainda apresentou pautas-bomba que aumentavam os gastos do governo. “Deve ser ressaltado que a busca de equilíbrio fiscal desde 2015 encontrou forte resistência na Câmara, à época presidida pelo deputado Eduardo Cunha. Os projetos enviados foram rejeitados parcial ou integralmente. Pautas-bombas foram apresentadas e algumas aprovadas” citou, e acrescentou: “Queriam o poder a qualquer preço. Tudo fizeram para desestabilizar a mim e a meu governo” – acusou.

TCU – A parcialidade do TCU (Tribunal de Contas da União) também foi destacada pela presidenta em seu discurso. Lembrou que procurador do Ministério Público junto ao TCU, Júlio Marcelo de Oliveira, foi considerado suspeito pelo presidente do STF, Ricardo Lewandowski, e o fato dele ter sido ouvido como informante e não como testemunha. Isso porque Júlio Marcelo convocou e participou de atos, em frente ao tribunal, pela rejeição das contas do governo Dilma. Atitude incompatível com o cargo que ocupa.

Dilma também mencionou o auditor do TCU, Antônio Carlos Costa D´Ávila Carvalho Júnior, chefe da equipe que elaborou o parecer do órgão sobre as chamadas pedaladas fiscais. Durante seu depoimento no julgamento do impeachment, Antônio Carlos admitiu que ajudou Júlio Marcelo na elaboração da representação que pediu a reprovação das contas de Dilma referentes a 2015.

“O autor da representação junto ao TCU (Júlio Marcelo) que motivou as acusações discutidas foi reconhecido como suspeito pelo presidente do STF. Soube-se ainda pelo depoimento do auditor responsável pelo parecer técnico (Antônio Carlos) que ele havia ajudado a elaborar a própria representação. Fica clara a parcialidade, a trama, na construção das teses por eles defendidas. São pretextos, apenas pretextos, para derrubar sem crime de responsabilidade um governo legítimo”, disse a presidente.

Conquistas – Dilma frisou que o que está em jogo no processo de impeachment “forjado” não é o seu mandato. “O que está em jogo são as conquistas dos últimos 13 anos”, enfatizou, destacando avanços das políticas sociais, como o acesso à saúde e educação e valorização do salário mínimo e de programas habitacionais. E mais uma vez lembrou que o programa de governo vencedor nas eleições não é esse que o “usurpador” Michel Temer e seus aliados estão querendo impor ao País.

“O que pretende o governo interino é um verdadeiro ataque às conquistas dos últimos anos. Será a destruição da previdência social. O resultado será mais pobreza, mais mortalidade infantil e a decadência dos pequenos municípios do país afora. Conquistas importantes para mulheres, negros e população LGBT estarão em risco pelo ultraconservadorismo. O nosso patrimônio, como o pré-sal, será fortemente ameaçado, e privatizado”, afirmou. E alertou ainda que a nossa ameaça é congelar “por inacreditáveis 20 anos as despesas com saúde, saneamento e educação”.

História – Dilma disse que hoje sofre de novo com sentimento de injustiça. “E receio que mais uma vez a democracia seja condenada comigo. Não tenho dúvida que todos nós seremos julgados pela História”. Falou ainda que, por duas vezes, viu a face da morte, quando foi torturada, situação que a fazia duvidar da humanidade e do próprio sentido da vida. E a outra quando uma doença grave podia ter abreviado a sua existência.

“Hoje só temo pela democracia”, afirmou lembrando que uma condenação política exige a ocorrência de crime de responsabilidade. “Lembrem-se do precedente que poderá abrir. Condenar sem provas, condenar um inocente. Faço um apelo final: não aceitem um golpe. Peço que façam justiça a uma presidente honesta. Votem, sem ressentimento. Votem contra o impeachment, pela democracia”.

Vânia Rodrigues

Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Assista o discurso:

https://www.facebook.com/DilmaRousseff/videos/1188629691190620/

Está gostando do conteúdo? Compartilhe!

Postagens recentes

CADASTRE-SE PARA RECEBER MAIS INFORMAÇÕES DO PT NA CÂMARA

Veja Também