Após dois anos do golpe parlamentar que derrubou a presidenta eleita Dilma Rousseff, a saúde pública aparece com uma das áreas mais atingidas pelo governo golpista e ilegítimo de Michel Temer. Com a Emenda Constitucional do Teto dos Gastos (EC 95/17), de autoria do governo Temer, o Sistema Único de Saúde (SUS) – que já sofre com o subfinanciamento do setor – contará pelos próximos anos com recursos ainda mais escassos. Segundo estimativas da Comissão de Orçamento e Financiamento do Conselho Nacional de Saúde (CNS), apenas o teto de gastos deve reduzir em R$ 434 bilhões os recursos destinados ao SUS.
Além desse corte geral, programas específicos criados ou ampliados durante os governos de Lula e Dilma também foram atacados. É o caso do Programa Farmácia Popular, idealizado para garantir o fornecimento de medicamentos essenciais de maneira gratuita e de outros remédios com até 90% de desconto. Criado em 2006, no primeiro mandato do ex-presidente Lula, o programa foi praticamente dizimado. Das 393 unidades próprias existentes antes do golpe, atualmente apenas 11 estão em funcionamento. O diferencial dessas unidades em relação à rede conveniada é que, enquanto as unidades próprias do programa forneciam cerca de 110 produtos com desconto ou gratuitamente, a rede credenciada oferece apenas 42 produtos.
De acordo com o deputado Jorge Solla (PT-BA), médico e ex-secretário da Saúde do estado da Bahia, os ataques ao SUS têm como principal objetivo aumentar o lucro do setor privado de saúde. “É lamentável observarmos em tão pouco tempo os ataques graves desferidos pelo governo Temer contra as políticas implementadas na saúde pelos governos Lula e Dilma. O certo é que vários interesses estão por trás desses ataques”, revela o parlamentar.
Segundo o deputado, o golpe contra a saúde pública serve prioritariamente ao setor privado, com redes hospitalares e planos de saúde que se beneficiam a partir do desmantelamento do SUS. Ele cita como exemplos dessa desarticulação a tentativa do governo em ofertar planos de saúde com cobertura mínima e de beneficiar o complexo farmacêutico nacional e internacional, com a extinção do programa Farmácia Popular. “Como consequência, isso enfraquece instituições públicas, como a Fiocruz, responsável pela fabricação de medicamentos para o SUS”, aponta Jorge Solla.
Mais Médicos – Outra ação instituída no País pelo PT que vem sofrendo ataques do governo ilegítimo de Temer é o Programa Mais Médicos. Criado em 2013 pela presidenta eleita Dilma Rousseff, o Mais Médicos ampliou a assistência na atenção básica no âmbito do SUS. Por meio do programa, mais de 18 mil médicos passaram a atender a população de 4.058 municípios, cobrindo um total de 72,8% das cidades brasileiras e beneficiando 63 milhões de brasileiros.
Desde o golpe, o número de médicos baixou para menos de 16 mil (em 2017). Além disso, a quantidade de municípios atendidos caiu para menos de 3.800, o que significa que 7,7 milhões de pessoas deixaram de ser atendidas pelo programa, de acordo com o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES).
O governo ilegítimo de Temer também tenta emplacar a criação dos chamados “Planos de Saúde Acessíveis”. Esses planos seriam mais baratos, porém com restrições de serviços e atendimentos, piorando a cobertura mínima atualmente exigida. Segundo avaliação da assessoria técnica da Liderança do PT na Câmara, a medida é “uma tentativa de privilegiar as operadoras de planos de saúde em detrimento da população mais carente, que criará a ilusão de pagar barato por um plano que não oferecerá quase nenhum procedimento”. “Com isso, essas pessoas continuarão recorrendo ao Sistema Único de Saúde, e o poder público flexibilizará as exigências hoje monitoradas pela Agência Nacional de Saúde”, destaca ainda o estudo da assessoria do PT.
Medicamento e pesquisa – Além da redução de recursos para o SUS e do desmantelamento de programas na área da saúde, o atual governo também têm optado em comprar medicamentos do setor privado para abastecer o SUS. A medida, de acordo com Sindicato dos Servidores de Ciência, Tecnologia, Produção e Inovação em Saúde Pública (AsfocSN) – que representa os empregados da Fiocruz – atinge diretamente a entidade. “Com a mudança na política relacionada à área de produção não é possível manter profissionais em linhas que estão sendo descontinuadas”, segundo informação do sindicato.
Pela primeira vez o ministério da Saúde decidiu comprar por R$ 63,5 milhões da iniciativa privada o medicamento Alfaepoetina – utilizado para pacientes com anemia – mesmo existindo estoque na quantidade desejada na Fiocruz. O mesmo ocorreu com o remédio Ribavirina, usado para tratar a Hepatite C. A Fiocruz fornece o medicamento ao SUS desde 2008 ao preço de R$ 0,17 a unidade. O laboratório Blau Farmacêutica, que vendeu o medicamento para o SUS, cobrou R$ 5,19/unidade, o que daria para comprar 30 doses.
O desprezo do governo Temer pela saúde também alcançou o setor da saúde ligado à pesquisa. O corte no orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Comunicação para 2018 chegou a 30%. Somados aos 40% já contingenciados pelo governo (dos R$ 730 milhões destinados ao CNPq, R$ 672 milhões foram gastos até o fim de julho), essa medida afetará, entre outros pontos, estudos desenvolvidos por pesquisadores na área de arboviroses (doenças transmitidas por insetos), como as voltadas para febre amarela, zika, chikungunya e dengue.
Héber Carvalho