Frentes parlamentares se unem à sociedade civil contra PEC que retira direitos de comunidades tradicionais

pec215
Foto: Gustavo Bezerra
 
A unanimidade sobre a inconstitucionalidade e o retrocesso presentes na proposta de emenda à Constituição (PEC 215/00) dominou o debate nesta terça-feira (19) promovido pelas três frentes parlamentares: de Apoio aos Povos Indígenas; Ambientalista e de Defesa dos Direitos Humanos. A PEC pretende transferir para o Congresso Nacional a competência para demarcação de terras indígenas, quilombolas e unidades de conservação.  No mesmo evento, o comitê constituído pelas três frentes, entidades da sociedade civil, indígenas e quilombolas lançou um manifesto contra a PEC, em tramitação no Congresso Nacional. 
 
“A PEC é inconstitucional. Ela versa sobre uma cláusula pétrea sobre  direitos e garantias fundamentais dos povos indígenas”, denunciou a deputada Erika Kokay (PT-DF), coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Humanos. 
 
Para a petista, trazer esse debate para o Congresso, tirá-lo do âmbito do Poder Executivo explicita que eles querem acabar com a homologação das terras indígenas, quilombolas  e das reservas ambientais. “O Brasil não pode permitir isso. O Brasil não pode rasgar sua própria história, sua memória e não pode rasgar sua própria Constituição”, recomendou Erika.
 
Para o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, deputado Paulo Pimenta (PT-RS) o debate que o país presencia a partir da PEC 2015 revela o momento que o Brasil vive hoje no Congresso Nacional. “Vivemos aqui um processo de retomada conservadora- que busca retirar direitos,  ampliar a influência  do capital, dos interesses econômicos. O direito territorial dos povos indígenas é uma matéria que está na ordem do dia  e que vai avançar também sobre os direitos de mineração e de outras questões que interessam muito ao capital e, que, tem hoje, uma maioria consolidada dentro desta Casa. E que, infelizmente, tem no presidente da Câmara o principal representante desse movimento”, alertou Pimenta.
 
“Trazer para o Congresso Nacional a questão da demarcação, é trazer direitos originais para a negociação, para a barganha”, denunciou Antonio Carlos Souza Lima, representante da Associação Brasileira de Antropologia.
 
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti enfatizou que a entidade também tem posição contrária à proposta. Ele classificou de “equívoco” e “inconcebível” o Congresso Nacional querer legislar sobre essa matéria.
 
Na mesma linha, a Secretária-Geral da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Moema Bonelli disse que a proposta não “congrega a preocupação com a defesa efetiva das causas indígenas”. Disse ainda que a finalidade da proposta é “criar óbice, embaraço na defesa dos direitos dos povos indígenas”. 
 
O ex-presidente da Funai, Márcio Santilli, explanou sobre as pendências na demarcação das terras no Brasil. Ele disse que durante 65 anos foram criadas 310 áreas de conservação federais. Destas, lembrou, apenas cinco foram criadas por iniciativa do Congresso Nacional. Ele observou que existem 1.611 processos de identificação e titulação de terra quilombola em andamento e apenas 171 foram tituladas. 
 
Márcio Santilli alertou que estão em processo de demarcação 7,7 milhões de hectares. Nesse sentido, ele classifica o debate sobre o dispositivo constitucional que pretende modificar o processo, de “retórica de palanque eleitoral”. Para ele, a PEC 215 vai trazer impactos “devastadores” ao subordinar os direitos e garantias ao processo legislativo. 
 
Já para o deputado Alessandro Molon (PT-RJ) a PEC, além de inconstitucional, coloca em risco a separação de poderes “na medida em que o Legislativo quer usurpar do Executivo uma prerrogativa que não é sua”. O petista lembrou que a atividade de demarcação de terras “é uma atividade iminentemente administrativa, meramente declaratória”. Para ele, o que está em curso, não é só a PEC 215. Segundo ele, a PEC é um símbolo do que a Câmara quer fazer nesses dias. “A demarcação não é uma doação, não é concessão. É a declaração, é o reconhecimento de uma terra que já é dos indígenas pela decisão dos constituintes de 1988 que  disseram: A terra pertence aos indígenas”, afirmou.
 
Para o deputado  Nilto Tatto (PT-SP) o encontro das três frentes com setores da sociedade como indígenas, quilombolas, ambientalistas, trabalhadores da cidade e do campo se configura em uma unidade para enfrentar as ameaças que ora se verifica  no Congresso Nacional. “Essa agenda, essa aliança que hoje está se iniciando tem um calendário daqui pra frente que é ampliar para outros setores da sociedade. Dialogar, chamar a atenção da sociedade brasileira para o que uma parcela significativa dos deputados estão fazendo nesta Casa, que  é ameaçar direitos e conquistas do povo brasileiro”, afirmou Tatto.
 
Já o deputado Zé Carlos (PT-MA) fez questão de reafirmar o compromisso do seu mandato na  luta contra a PEC 215 e seus “malefícios”. “Nossa luta agora é contra a instituição desse artifício que vai trazer enormes prejuízos para índios, quilombolas e para as reservas ambientais”, disse.
 
Benildes Rodrigues
 
 

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