Estupros de crianças quilombolas: CDHM cobrará do Judiciário fim da impunidade dos acusados

cdhm cavalcanteA Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara esteve em Cavalcante (GO), na última segunda-feira (20), realizando audiência pública para ouvir a comunidade sobre a ocorrência de crimes de exploração sexual contra crianças e adolescentes. Além da violência em si, a CDHM foi averiguar denúncias de suposta omissão por parte das autoridades públicas para coibir estas práticas no município, localizado a 320 quilômetros de Brasília (DF) e território onde vive a população Kalunga, comunidade quilombola cujas crianças são o alvo preferencial dos crimes sexuais na região.

Desde 2012, foram registrados 14 casos, mas a comunidade estima um número bem mais elevado, devido ao medo que as famílias têm de denunciar. A Polícia Civil trabalha no momento com 10 inquéritos de violência sexual contra menores de idade e colheu provas materiais que comprovam o crime de estupro de vulnerável – quando a vítima tem menos de 14 anos.

O deputado Paulo Pimenta (PT-RS), presidente da CDHM disse estar “indignado” com as informações de que o Tribunal de Justiça de Goiás tem absolvido acusados de crimes desta natureza. “Vou solicitar ao Conselho Nacional de Justiça que analise essas sentenças que têm sido dadas pelo TJ de Goiás. Queremos saber por que, se há provas, essas pessoas não estão presas”, adiantou o parlamentar.

Integrante da CDHM, a deputada Érika Kokay (PT-DF) também criticou o Poder Judiciário. “A impunidade também perpetua o crime e perpetua a violação de direitos. E quando temos poder político e poder econômico, a impunidade fica mais densa”, repudiou a parlamentar, que afirmou, ainda, que o Judiciário não é “intocável”.

Mais de duzentas pessoas participaram da audiência pública, que também foi acompanhada por representantes do governo federal, do Ministério Público e por deputados estaduais da Assembleia Legislativa de Goiás.

Poder político – O caso de maior repercussão envolve o vereador Jorge Cheim (PSD), marido da atual vice-prefeita de Cavalcante, e uma menina de 12 anos de idade da comunidade Kalunga. De acordo com o Delegado da Polícia Civil, Diogo Luiz Barreira, a prisão do vereador foi pedida em duas oportunidades, mas os pedidos foram negados, mesmo que, segundo ele, “tenham sido apresentados todos indícios necessários”. O juiz Lucas de Mendonça Lagares, que atua no caso e negou o pedido de prisão preventiva do vereador Jorge Cheim, foi convidado para participar da audiência pública, mas não compareceu. A Promotora de Justiça de Cavalcante, Úrsula Catarina da Silva Pinto, por ter parentesco com o vereador, declarou-se suspeita para continuar no processo e será substituída.

Mães precoces – Outro caso que chamou atenção da Comissão foi um relatório encaminhado pela promotoria do município à Delegacia de Polícia Civil de 57 adolescentes que foram mães aos 15 anos. Assim, o ato sexual ocorreu quando as adolescentes tinham entre 13 e 14 anos. “Isso envolve estupro de vulneráveis”, denunciou o deputado Pimenta. O delegado Diogo Luiz Barreira explica que é difícil fazer a identificação dos pais, nesses casos, porque as próprias adolescentes se negam a falar. Moradores asseguraram que o medo e a vergonha são os principais motivos do silêncio das vítimas.

Impunidade – Durante a audiência, moradores relataram que as famílias ficam intimidadas para fazer as denúncias, e tem medo de represálias. Após o caso ganhar repercussão na mídia, representantes do Conselho Tutelar afirmaram que sofreram ameaças de morte e a sede do Conselho foi invadida e relatórios referentes a crimes sexuais contra menores foram roubados.

Selma Moreira Santos, moradora do município, que teve vítimas de pedofilia na família, relatou que na cidade é normal ouvir de parte dos homens frases do tipo “vou pegar uma kalunguinha para criar”, em alusão às menores que pertencem à comunidade Kalunga e que são vítimas de trabalho infantil, escravo e exploração sexual. Segundo ela, quem tem coragem para denunciar ainda tem que conviver com o preconceito. “As pessoas olham na rua e dizem que é tudo mentira. Mas digo, não tenham vergonha de se expor, denunciem”, sugeriu.

Adriana Pirineus, também moradora de Cavalcante, disse que é preciso acabar com a ideia que há na cidade de que a violência sexual é uma questão cultural. “Não é, isso é fruto de uma sociedade machista”, disse. Outra moradora, que não quis ser identificada, relatou que há casos de meninas que são estupradas, engravidam e que são espancadas até sofrerem o aborto.

Segundo uma ex-conselheira tutelar de Cavalcante, a violência sexual contra as crianças e adolescentes é corriqueira. “Não é uma situação pequena, entretanto ela é calada, silenciosa, e a exploração é malvista pela comunidade”, criticou.

Preocupado com a segurança dos moradores, Paulo Pimenta informou que se houver qualquer constrangimento às pessoas que participaram da audiência pública, o fato será considerado uma ameaça ao trabalho da Comissão de Direitos Humanos e o caso será levado à Polícia Federal e demais órgãos competentes. “Vamos ajudar a comunidade a dar visibilidade a sua luta. Por isso, nós da Comissão de Direitos Humanos queremos ter a certeza de que o Ministério Público está agindo de maneira adequada e queremos ter a garantia de que o Poder Judiciário está fazendo sua parte”, declarou Pimenta.

Ainda esta semana a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e a Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial voltarão a Cavalcante para dar sequência à apuração dos crimes denunciados.

Em paralelo à audiência pública, técnicos da CDHM e da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos receberam, de forma reservada, denúncias de moradores que contribuirão com as ações que serão tomadas pelas autoridades responsáveis.

PT na Câmara com assessoria parlamentar
Foto: Rogério Tomaz Jr./PT na Câmara

 

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