Economia Solidária é a melhor forma de gerar trabalho e distribuir renda no País, apontam especialistas

Andre Singer, no telão, participou do seminário sobre Economia Solidária. Foto: Gabriel Paiva

Especialistas afirmaram nesta quinta-feira (5) que o Brasil precisará, em um futuro governo Lula, estimular a Economia Solidária como um modelo alternativo de desenvolvimento econômico para gerar trabalho e distribuir renda no País. As declarações aconteceram durante mais um Seminário Resistência, Travessia e Esperança, que debateu o tema e ao mesmo tempo homenageou o economista e professor Paul Singer, considerado o “Pai da Economia Solidária no Brasil”, falecido em abril de 2018. O evento foi coordenado pela secretária de Economia Solidária do PT, Tatiana Valente.

Durante as discussões, o jornalista e cientista político André Singer – filho de Paul Singer – ressaltou que o trabalho de seu pai, autor de diversos livros sobre Economia Solidária, sempre foi na defesa da Economia Solidária como um modelo mais justo e igualitário em alternativa ao capitalismo.

“Se entendemos, como disse Karl Marx, que os trabalhadores devem se apossar dos meios de produção por meio de gestões coletivas, isso se traduz modernamente na Economia Solidária, que é a melhor forma de construirmos um socialismo já. E se pensarmos que a regressão da democracia, que vemos ocorrer no Brasil e no mundo, também regride a possiblidade de alcançarmos o socialismo, veremos que a Economia Solidária também é a melhor forma de se fortalecer a democracia”, ressaltou.

Já o professor do Departamento de Política Científica e Tecnológica da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas-SP) Renato Dagnino ressaltou que a Economia Solidária pode ser a alternativa mais viável para a reconstrução do País.

“O Brasil vai precisar se reindustrializar, mas precisamos desmontar o mito de que essa reindustrialização só pode vir do setor privado. A Economia Solidária pode produzir bens de consumo para a população. A Economia Solidária é forte, fracas são as políticas públicas para promover essa política pública, que vem perdendo cada vez mais incentivos nos últimos anos”, denunciou.

Ex-ministra Tereza Campello. Foto: Gabriel Paiva

Sobre a importância da Economia Solidária para o futuro do País, a ex-ministra do Desenvolvimento Social no governo Dilma e economista Tereza Campello destacou que esse é o melhor modelo para atender a agenda de desafios sociais e ambientais que o País precisará enfrentar na era pós-Bolsonaro.

“A economia traz esse olhar inclusivo para o futuro e pode se tornar ponto central para combatermos a pobreza e a fome, além de combatermos as demais desigualdades existentes no País”, afirmou.

A ex-ministra lembrou ainda que durante o Plano Brasil Sem Miséria, entre 2011 e 2014, várias ações foram adotadas para fortalecer a Economia Solidária no Brasil. Entre elas, a liberação de R$ 850 milhões em crédito, que atenderam 2.275 municípios e beneficiaram 240 mil pessoas em 11 mil empreendimentos em todo o País. “Precisamos recuperar aquilo que já foi feito, e ampliar esses números em um futuro governo do PT”, ressaltou Tereza Campello.

Ex-ministro Miguel Rossetto. Foto: Gabriel Paiva

O ex-ministro do Desenvolvimento Agrário, e do Trabalho, nos governos Lula e Dilma, Miguel Rossetto, alertou que no atual estágio de desenvolvimento do capitalismo será difícil conseguir a proeza realizada nos governos do PT de criar 20 milhões de empregos. “Apostar que com esse modelo capitalista vamos conseguir superar as desigualdades é algo ingênuo. O grande capital não tem interesse em reduzir a desigualdade, e nem quer. Por isso, a Economia Solidária pode ser a grande solução para resolver esse problema social”, observou.

Promover a Economia Solidária por meio da educação

Durante o seminário, palestrantes também apontaram que a educação pode ter um papel fundamental na promoção da Economia Solidária no País. Para o filósofo, pedagogo e professor da Unicamp Demerval Saviani, “será preciso adotar um projeto pedagógico de formação integral voltado ao novo sistema”.

Por sua vez, a professora e doutora em Educação pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) Lucinda Ferreira da Silva ressaltou que essa mudança precisará passar por uma reformulação das leis que regem a educação no País.

“O atual modelo de educação no País está voltado para a manutenção do atual sistema capitalista de produção. A própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) diz que os processos formativos nas unidades escolares devem dialogar com o mundo do trabalho. O problema é que na Economia Solidária o trabalho não está vinculado ao emprego”, explicou ao salientar que no modelo de produção da Economia Solidária não existem patrões e sim, uma autogestão do empreendimento.

Já a doutora em Sociologia e professora do Departamento de Educação da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) Ana Dubeux disse que “a Economia Solidária não pode ser encarada apenas como um meio de produção, mas como um modo de vida mais adequada à questão da sustentabilidade do planeta”.

Economia Solidária no Desenvolvimento Urbano, Rural e Territorial

Durante o Seminário também foi debatida a importância da Economia Solidária no desenvolvimento urbano, rural e territorial. A representante da Rede Brasileira de Bancos Comunitários Leonora Mohl defendeu novas vias para o fomento de empreendimentos ligados a esse modelo.

“Precisamos criar no Brasil um Marco Regulatório para o funcionamento dos bancos comunitários, que permita a eles fomentar o crédito e distribuir renda via programas sociais. Os bancos comunitários já têm como objetivo a luta contra a pobreza e a desigualdade em seus territórios”, argumentou.

Já o sócio-fundador da Cooperativa EITA (Educação, Informação e Tecnologia para Autogestão), Daniel Tygel, também defendeu em um futuro governo Lula a adoção de políticas públicas para fomentar empreendimentos solidários que envolvam tecnologia de informação.

“Faltam políticas públicas para apoiar cooperativas no setor da tecnologia da informação, com apoio de universidades federais e que auxiliem experiências de autogestão. Também poderíamos ter software livre para o setor público, garantindo a nossa soberania tecnológica, além de políticas públicas para desenvolvimento de aplicativos onde trabalhadores do setor de mobilidade, transporte e entregas pudessem ter a autogestão de negócios sem depender de tecnologia estrangeira”, disse ao se referir aos milhões de trabalhadores que trabalham por aplicativos no País.

Para além do incentivo do governo, o representante da União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes), Vanderlei Zygel, também alertou que o próprio segmento precisa criar capital próprio ao invés de apenas esperar por decisões de governo.

“Temos como desafio a criação de capital próprio. Governos são sazonais e cíclicos, mas se estivermos fortalecidos com capital teremos perenidade em nossas ações”, advertiu.

Economia Solidária como forma de inclusão

No encontro, a Economia Solidária também foi defendida como o melhor modelo econômico para incluir as mulheres e populações marginalizadas no País. A secretária Nacional de Mulheres do PT, Anne Moura, lembrou que elas já são maioria nos empreendimentos da Economia Solidária no País.

“Este modelo dialoga com o feminismo ao possibilitar a emancipação das mulheres. Por meio da Economia Solidária as mulheres vítimas de violência ou idosas rejeitadas no mercado de trabalho formal, conseguem obter renda”, apontou.

A secretária Nacional LGBTQIA+ do PT, Janaína Oliveira, também destacou que a Economia Solidária se transformou em um dos poucos meios que respeita a diversidade sexual do País. “A Economia Solidária é um espaço onde a população LGBTQIA+ ainda encontra respeito e igualdade, para assim serem incluídos economicamente”, explicou.

Segundo o representante do Unicopas Quener Chaves dos Santos, “a Economia Solidária também é um modelo de geração de renda que respeita o modo de vida das comunidades tradicionais”.

Já o Coordenador Nacional do Movimento Nacional da População de Rua (MNPR), Leonildo Monteiro Filho, ressaltou que Economia Solidária é um dos poucos meios pelo qual uma pessoa em situação de rua pode obter uma ocupação.

“As pessoas em situação de rua tentam encontrar um emprego, mas não conseguem porque não possuem um endereço. A Economia Solidária tem sido a porta de entrada para muitas pessoas nessa situação terem seu dinheiro para se alimentar, comprar uma roupa ou mesmo conseguir pagar um aluguel. Com o presidente Lula esperamos ter políticas públicas voltadas à população de rua por meio da Economia solidária”, afirmou.

A professora de Enfermagem da USP (Universidade de São Paulo) Ana Aranha também ressaltou que os empreendimentos ligados à Economia Solidária são um dos poucos que aceitam pessoas com transtornos mentais.

“A Economia Solidária é o refúgio para muitas pessoas com transtornos mentais que enfrentam dificuldade de acessar o mercado de trabalho tradicional. Infelizmente faltam políticas públicas para incentivar o trabalho cooperado. Em São Paulo, as poucas iniciativas que temos da Rede de Saúde Mental foram implementadas com recursos de parcerias com instituições estrangeiras”, apontou.

O seminário contou ainda com a participação do deputado Bohn Gass (PT-RS) e dos representantes da Articulação Brasileira pela Economia de Francisco e Clara (ABEFC), André Ricardo de Souza; da Rede Brasileira de Grupos de Consumo Responsável, Gustavo Oliveira; e da representante da Rede de Economia Solidária Feminista, Helena Bonumá.

Héber Carvalho

 

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