O presidente Bolsonaro e o ministro Sérgio Moro (Justiça) amargaram uma grande derrota na noite desta terça-feira (24) com a derrubada 18 feitos à Lei de Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019), outros 15 foram mantidos. Com isso, voltarão a valer dispositivos como o que torna crime de abuso de autoridade a decretação, substituição ou relaxamento de prisão irregular. Também foi derrubado o veto que torna crime constranger preso a produzir prova contra si. “Foi uma vitória muito importante não apenas para a esquerda, mas para todos os democratas que querem preservar a justiça no País”, afirmou o líder da Minoria no Congresso, deputado Carlos Zarattini (PT-SP).
Zarattini enfatizou ainda que foi derrotada uma política autoritária. “Foi uma grande decisão do Senado e da Câmara contra a repressão antidemocrática que imperava no País”. O deputado enfatizou que a Lei de Abuso de Autoridade foi amplamente discutida no Parlamento, tanto no Senado quanto na Câmara, em debates com a participação de juristas, do Ministério Público, do Poder Judiciário, que chegaram a um resultado amplamente consensual naquele momento.
“Quem é que não defende que deve ser punido quem decretar uma medida de privação da liberdade, em desconformidade com hipóteses legais? Ora, um juiz que não cumprir a lei e prender alguém deve ser punido ou não? E alguém que executar a captura, prisão ou busca e apreensão de pessoa que não esteja em flagrante delito ou sem ordem escrita de prisão? Será possível prender uma pessoa fora dessa situação?”
Na avaliação do deputado José Guimarães (PT-CE), a derrubada dos vetos o Congresso se impôs, mostrou ao governo que o Parlamento “não se curva, nem está de cócoras para o governo que não tem competência sequer para gerir a sua relação com o Congresso Nacional”.
Condução Coercitiva
Ao defender a derrubada dos vetos, o deputado Jorge Solla (PT-BA) disse que os abusos de autoridade no Brasil se tornaram quase que regra. “Vamos pegar o exemplo da condução coercitiva. A lei diz que condução coercitiva é para aquele convocado a depor, e se nega a comparecer para dar o seu depoimento. Aqui, no Brasil, deixou de ser isso. Condução coercitiva é para os réus, os investigados, aqueles que querem fazer o combate político, como foi o caso do ex-Presidente Lula que foi conduzido coercitivamente sem nunca ter sido chamado a depor. Já o Queiroz, que é aquele que cuidava do dinheiro roubado pela Família Bozo, está blindado, não vai nem depor, nem é levado por condução coercitiva”, criticou.
Solla disse ainda que as informações divulgadas a partir do site The Intecept Brasil, que ficou conhecido como “Vaza Jato” estão mostrando os inúmeros “abusos de autoridades, ilegalidade, conspiração política, conspiração contra o Supremo Tribunal Federal, atuação político-partidária do Judiciário e do Ministério Público, destruição da economia, milhares e centenas de milhares de postos de trabalho, desemprego no País”.
E o deputado Alencar Santana Braga (PT-SP) destacou que o poder de todo servidor público, de toda autoridade pública, detentora de mandato ou não, tem que ser exercido de maneira adequada, de maneira razoável. “E, mais do que isso, dentro da lei. Portanto, a Lei de Abuso de Autoridade, com novos mecanismos, é fundamental, para controlar esse poder, que deve ser exercido em nome do povo e para o povo”, defendeu.
Vetos derrubados
Com a derrubada dos vetos, entre os crimes que agora retornarão ao texto da Lei 13.869/19 estão:
– o responsável pelas investigações que, por meio de comunicação, inclusive rede social, antecipar atribuição de culpa antes de concluídas as apurações e formalizada a acusação: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa;
– decretar prisão sem conformidade com as hipóteses legais. Válido também para o juiz que, dentro de prazo razoável, deixar de relaxar a prisão manifestamente ilegal; deixar de substituir a prisão preventiva por medida cautelar ou conceder liberdade provisória, quando manifestamente cabível; ou deixar de deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando manifestamente cabível: pena de detenção de 1 a 4 anos e multa;
– constranger o preso ou o detento, mediante violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, a produzir prova contra si mesmo ou contra terceiro: pena de detenção de 1 a 4 anos, e multa, sem prejuízo da pena cominada à violência;
– violar direito ou prerrogativa de advogado como a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho e sigilo de comunicação; a comunicação com seus clientes; a presença de representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) quando preso em flagrante por motivo ligado ao exercício da advocacia; e prisão temporária especial: pena de detenção de 3 meses a 1 ano;
– deixar de se identificar ou se identificar falsamente ao preso quando de sua prisão. Aplica-se também para quem, como responsável por interrogatório, deixa de se identificar ao preso ou atribui a si mesmo falsa identidade, cargo ou função: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa;
– prosseguir com o interrogatório de pessoa que tenha decidido exercer o direito ao silêncio ou de pessoa que tenha optado por ser assistida por advogado ou defensor público: pena de detenção de 1 a 4 anos e multa;
– impedir, sem justa causa, a entrevista pessoal e reservada do preso com seu advogado. Aplica-se a pena também a quem impede o preso, o réu solto ou o investigado de entrevistar-se pessoal e reservadamente com seu advogado ou defensor, por prazo razoável, antes de audiência judicial, e de sentar-se ao seu lado e com ele se comunicar durante a audiência, salvo no curso de interrogatório ou no caso de audiência realizada por videoconferência: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa;
– dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente: pena de detenção de 1 a 4 anos e multa;
– negar ao interessado, seu defensor ou advogado acesso aos autos de investigação preliminar, ao termo circunstanciado, ao inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou administrativa; ou impedir a obtenção de cópias: pena de detenção de 6 meses a 2 anos e multa.
Vânia Rodrigues, com informações da Agência Câmara