Com várias modificações, inclusive algumas sugeridas pela Bancada do PT, o plenário da Câmara aprovou, na madrugada desta quarta-feira (30), o projeto de lei (PL 4.850/16) com medidas contra a corrupção. Das propostas originais do Ministério Público Federal foram mantidas a tipificação do crime eleitoral de caixa dois, a criminalização do eleitor pela venda do voto e a transformação de corrupção que envolve valores superiores a 10 mil salários mínimos em crime hediondo.
A principal modificação do texto trata da punição para abuso de autoridade. A emenda foi apresentada pelo PDT e foi aprovada por 313 votos a 132 e 5 abstenções. O líder do PDT, Weverton Rocha (MA), afirmou que a aprovação da possibilidade de punição de promotores e juízes por abuso de autoridade representará o “fim de privilégios” e que o próprio MPF deveria ter incluído essa proposta no pacote de medidas de combate à corrupção. “A primeira medida deste pacote deveria ser o fim dos privilégios e abusos de poder da categoria deles. Não pode haver castas”, reforçou Rocha.
Em nota divulgada nesta quarta-feira (30), o deputado Patrus Ananias (PT-MG) afirmou que respeita e zela pelas regras do Estado Democrático, “particularmente ao princípio de que ninguém deve estar fora do controle da Lei”. Ele fez questão de destacar o seu voto a favor da emenda que dispõe sobre crimes de abuso de autoridade de magistrados e membros do Ministério Público.
“Institutos fundamentais como o devido processo legal alicerçado no direito de defesa, no contraditório e na presunção de inocência até que se prove a culpa, por exemplo, não podem estar ameaçados por autoridade ou agente público, de qualquer poder ou instância, sob pena de comprometermos todo nosso ordenamento jurídico”, argumentou o deputado do PT mineiro.
Patrus Ananias acrescentou que este parece ser precisamente o objetivo de alguns que apontam perigosamente para o arbítrio e a ditadura. “Convivemos hoje, no país, com a exacerbação de setores do Poder Judiciário, do Ministério Público e também da Polícia Federal. É uma exacerbação ameaçadora à autonomia e à independência dos poderes da República – e ao Estado Democrático de Direito”, enfatizou.
Abuso de autoridade – Pelo texto aprovado, juízes poderão responder por crime de responsabilidade, nos seguintes casos: alterar decisão ou voto já proferido (exceto se por recurso); julgar quando estiver impedido ou suspeito; exercer atividade político-partidária; proceder de modo incompatível com a honra e dignidade e decoro de suas funções; exercer outra função ou atividade empresarial; receber custas ou participação em processo; manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento.
Pela proposta aprovada, qualquer cidadão poderá representar contra magistrado perante o tribunal ao qual está subordinado. Se o Ministério Público não apresentar a ação pública no prazo legal, o lesado pelo ato poderá oferecer queixa subsidiária, assim como a Ordem dos Advogados do Brasil e organizações da sociedade civil constituídas há mais de um ano para defender os direitos humanos ou liberdades civis.
Já os promotores podem responder por crimes de responsabilidade nos casos de emitir parecer quando estiver impedido ou suspeito; se recursar a agir; proceder de modo incompatível com a dignidade e o decoro do cargo; receber honorários, percentagens ou custas processuais; exercer a advocacia; participar de sociedade empresarial; exercer qualquer outra função pública, com exceção do magistério e exercer atividade político-partidária.
Acordo de leniência – Por iniciativa da Bancada do PT, foram retirados do projeto de lei todos os artigos sobre reformulação das regras relativas aos acordos de leniência (espécie de delação premiada em que empresas reconhecem crimes em troca de redução de punição). O líder da bancada, deputado Afonso Florence (BA), afirmou que o partido se posicionava contra a proposta por entender que o assunto precisa ser discutido na comissão especial da Câmara que já trata dos acordos de leniência. Florence disse ainda que é contra o dispositivo que obrigava o acordo de leniência ser referendado pelo Ministério Público. “Isso altera profundamente a lei vigente e o que está sendo construída na comissão, além de ser uma exigência obstaculizadora para os acordos de leniência, que a legislação prevê que sejam realizados, no caso da União, por exemplo, pela Controladoria-Geral da União.
Prescrição de crimes – Ainda, de autoria da bancada petista foi aprovado destaque que retirou do texto mudanças nas regras de prescrição dos crimes, como a sua contagem a partir do oferecimento da denúncia e não do seu recebimento e a prescrição retroativa. O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) explicou que esse regime de prescrição que estavam querendo mudar não dizia respeito apenas à corrupção. “Ele vai para todos os crimes. Transborda esse tema aqui”, afirmou.
Paulo Teixeira argumentou que a mudança na chamada prescrição retroativa, como estava proposta no texto, iria superlotar as cadeias brasileiras que, segundo ele, já têm 600 mil presos. “Vamos explodir de presos pobres nas cadeias brasileiras, sem nenhum estudo de impacto sobre o sistema penal penitenciário e sobre quem não deve estar nas cadeias”, alertou.
Progressão do regime – Foi aprovada ainda emenda da Bancada do PT que retirou do texto o condicionamento da progressão do regime de cumprimento de pena ao ressarcimento de danos causados por crime contra a administração pública. O texto original do MPF condicionava, nos crimes contra a administração pública, que a progressão para uma pena mais branda ficaria condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais. A mudança, segundo Paulo Teixeira só afetaria as pessoas mais pobres.
Veja abaixo outras propostas retiradas pelos deputados:
Enriquecimento ilícito – Foi retirado do texto o dispositivo que tornava crime o enriquecimento ilícito de funcionários públicos e previa o confisco dos bens relacionados ao crime.
Reportante do bem – Também foi retirado o dispositivo que previa a criação da figura do “reportante do bem” para incentivar o cidadão a denunciar crimes de corrupção em qualquer órgão, público ou não. Como estímulo, o texto dele previa o pagamento de recompensa em dinheiro para quem fizesse isso.
Acordos entre defesa e acusação – Outro ponto que não passou foi o que permitia a realização de acordos entre defesa e acusação no caso de crimes menos graves, com uma definição de pena a ser homologada pela Justiça.
Responsabilização de partidos – O plenário rejeitou ainda pontos do relatório que previam a responsabilização dos partidos políticos e a suspensão do registro da legenda por crime grave.
Vânia Rodrigues, com agências