Representantes do Ministério Público do Trabalho (MPT), governo federal e da indústria debateram nesta quinta-feira (30), na Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços da Câmara, o projeto de lei (PL 2.563/15) que institui o monitoramento do uso de trabalho forçado ou infantil em outros países. A proposta tem como relator na comissão o deputado Helder Salomão (PT-ES) – impõe restrições à importação de produtos fabricados ou obtidos de países que adotam essas práticas.
Segundo Helder Salomão, o Brasil precisa estimular a erradicação de práticas que atentem contra a dignidade humana em outros países, mas sem esquecer de fazer o dever de casa. “O Brasil não pode retroceder no combate interno ao trabalho forçado e ao trabalho infantil. O país, precisa voltar a ser referência mundial no combate a essas práticas. Recentemente vimos medidas adotadas pelo governo Temer que colocam em risco toda uma trajetória de sucesso”, explicou.
Entre os exemplos de retrocessos, a Coordenadora Nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente (Coordinfância) do Ministério Público do Trabalho (MPT), Patrícia de Mello Sanfelice, destacou o decreto de flexibilização do conceito de trabalho escravo e a mudança na metodologia de percepção do trabalho infantil.
“Antes de querermos criar um monitoramento internacional, o Brasil precisa reposicionar o estado para voltar a ser referência no combate ao trabalho forçado e trabalho infantil. Não podemos ter a pretensão de realizar um monitoramento internacional, enquanto aqui adotamos o caminho inverso”, ressaltou. Ao também elogiar a intenção do projeto, o assessor da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, João Francisco Maia, também criticou os recentes retrocessos ocorridos no País.
“Acreditamos que qualquer tipo de monitoramento deve considerar a integralidade do conceito de trabalho análogo ao escravo, considerando a jornada exaustiva e as condições de alojamento e alimentação, e não apenas a restrição ao direito de ir e vir, como foi flexibilizado no decreto do ministério do trabalho e que foi liminarmente suspenso pela ministra do STF, Rosa Weber”, observou.
O presidente da Associação da Indústria Têxtil e de Confecção, Fernando Pimentel, disse que a indústria nacional está aberta para ser avaliada. “Existem padrões diferentes de compliance, de legislações nos diferentes países, mas estamos abertos a avaliações principalmente em relação a países que concorrem conosco utilizando formas inadequadas de trabalho”, disse.
Dificuldade– Em relação ao projeto, Helder Salomão elogiou o objetivo da proposta, de autoria do deputado Vanderlei Macris (PSDB-SP). Porém, reconheceu dificuldades para aplica-la. A observação foi corroborada pelo Diretor do Departamento de Direitos Humanos do ministério das Relações Exteriores, Alexandre Pena Ghisleni.
“Na parte jurídica, o direito internacional não permite que um país alegue a utilização de trabalho forçado ou infantil para barrar a importação ou exportação de mercadorias. O GATT (General Agreement on Tariffs and Trade)- Acordo Geral de Tarifas e Comércio- proíbe a comercialização de produtos que ofendam a moral pública, mas o trabalho forçado e infantil não é enquadrado neste quesito”, explicou Alexandre Ghisleni.
Nas relações comerciais, o coordenador de Competitividade Exportadora da Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Marcus Vinícius Ferreira de Melo, ressaltou a dificuldade de adoção da proposta.
“Em tese, cada país é soberano e responsável por suas políticas públicas. Sob o ponto de vista comercial, é muito difícil implementar uma proposta de monitoramento para fins comerciais”, avaliou.
Já o Chefe de Fiscalização para a Erradicação do Trabalho Escravo do ministério do Trabalho, Maurício Fagundes, destacou a dificuldade em utilizar parâmetros confiáveis para monitorar o trabalho forçado e infantil em outros países.
“Até as convenções da Organização Internacional do Trabalho que tratam dos temas não são reconhecidos por países importantes. A convenção 29, do trabalho forçado, não é reconhecido pela China, Estados Unidos e Coréia do Sul. Já a convenção 182, sobre o trabalho infantil, não é reconhecido pela Coréia do Sul, por exemplo”, revelou.
Héber Carvalho