Alguns veículos da grande imprensa divulgaram de forma entusiasmada os resultados mais recentes das estimativas para a safra de grãos 2019/2020. De acordo com os dados da CONAB do mês de agosto, o volume da safra será de 253.677,5 mil toneladas, o que representará incremento de 4.8% em comparação com os resultados da safra anterior. Para o IBGE serão 250.5 milhões de toneladas. O que não foi dito é que 89% desse volume de grãos são constituídos de apenas dois produtos: soja e milho. Em ambos os casos, produtos que majoritariamente são destinados ao mercado externo.
Nada contra as crescentes exportações pelo agronegócio brasileiro, não fosse a gama de problemas associados e normalmente ignorados. Em especial, omite-se o fato do avanço das culturas para exportação sobre as áreas com produtos basicamente destinados para o abastecimento alimentar da população o que empurra o Brasil para a possibilidade de uma grave crise na segurança alimentar.
São falsos os discursos segundo os quais a propalada exuberância da agricultura do agronegócio no Brasil seja fruto dos ganhos de produtividade nas culturas nobres do agronegócio.
Na realidade, essa expansão vem se dando principalmente graças ao incremento da área plantada com esses produtos. Não é usual em um artigo dessa natureza, mas vamos recorrer ao gráfico a seguir para demonstrar de forma cabal nossa afirmação. Com base nos dados da Conab, e tomando-se como exemplo o caso da soja – principal commodity exportada pelo agronegócio, o gráfico apresenta as evoluções dos índices de área plantada e da produtividade da cultura, da safra 1995/96 à safra 2019/20. Constata-se que o “índice de área plantada” da soja evoluiu de 100, para 173.3, enquanto o “índice de produtividade” subiu de 100 para 134.2. Portanto, fica claro que é a incorporação de área, com todas as suas sequelas, a principal base da sustentação da trajetória expansiva da cultura da soja.
Em reforço à constatação acima, vale enfatizar que o aumento da área plantada com soja no período em consideração foi de 24.5 milhões de hectares, o que fez saltar a participação da área plantada com soja sobre a área total plantada com grãos no Brasil, de 28% na safra 1995/96, para 56% na safra 2019/20. De oura parte, juntas, as áreas plantadas com arroz e feijão que participavam com 24.8% da área total com grãos em 1995/96, passaram a representar apenas 7% em 2019/20. Resultado desse contexto, considerando o acumulado do ano (janeiro a julho) as taxas de inflação do feijão preto e do arroz foram, respectivamente, 64 e 34 vezes superiores à taxa de inflação do período (0.46%).
O curioso é que esse fato que se reflete gravemente no abastecimento alimentar da população das populações mais pobres do país não gera notícia. Porém, exportar ‘montanha’ de soja para alimentar porcos na Europa e na China, isto, sim, é motivo de celebração!
Beto Faro é deputado federal (PT-PA)