Com o voto contrário da Bancada do PT, o plenário da Câmara aprovou nesta quarta-feira (29) o projeto de lei (PL 1304/20), que facilita a transferência definitiva de terras pertencentes à União para os estados de Roraima e do Amapá. O deputado Nilto Tatto (PT-SP) explicou que, embora considere legítima a reivindicação e a atualização da legislação para poder resolver um problema de 18 anos, o PT votou contra porque o texto do relator, deputado Acácio Favacho (Pros-AP), infringia a Constituição.
De acordo com o deputado Tatto, as unidades de conservação, os territórios quilombolas e os títulos, da forma como foi proposto no projeto, não podem ser transferidos. Ele criticou também o fato de o texto aprovado permitir a ocupação das terras de fronteira nos estados do Amapá e de Roraima, sem consulta ao Conselho de Segurança Nacional. “Portanto, estão isentando esses estados, na hora da titulação e da implementação de qualquer tipo de empreendimento, da consulta ao Conselho Nacional de Segurança, isso é uma aberração, e nós não podemos aceitar de forma nenhuma”, protestou.
Nilto Tatto acusou também o relator de ter feito uma manobra que é incomum no Parlamento brasileiro, e em especial nesta conjuntura. “Aqui nós estamos falando de pouco mais de 2.500 proprietários que fazem pressão e têm condição nesta conjuntura de pressionar a Câmara para mudar a legislação neste momento, enquanto a grande maioria da população afetada diretamente por essas mudanças que estamos fazendo aqui — os quilombolas, os indígenas, os posseiros — não tem neste momento condições de fazer esse debate”, protestou.
O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) manifestou preocupação com o texto aprovado. “O relator agiu com prudência ao retirar a possibilidade da transferência de terras indígenas para os territórios de Amapá e de Roraima, mas persistem ainda alguns problemas. A nossa bancada, por exemplo, apresentou emenda que visava impedir a transferência de áreas de ampliação de proteção ambiental, e isso não foi aceito”, protestou.
Chinaglia destacou que o próprio relator reconheceu que as dezenas de focos de incêndio comprometeram a imagem do País e o comércio exterior. “Portanto, seria fundamental que não se permitisse a transferência de áreas, onde pudesse haver a ampliação da reserva de proteção ambiental”, ponderou.
Ele também criticou a possibilidade da transferência das terras fronteiriças sem o parecer do Conselho de Segurança Nacional. “Isso tem uma relação direta com a defesa nacional, com a perda de controle da nossa própria soberania. Não que vá acontecer automaticamente, mas o risco é real. Se não fosse assim, essa não teria sido uma exigência de uma lei de 2001”, ponderou. O PT também apresentou emenda para manter a consulta ao Conselho de Segurança, mas ela foi rejeitada.
Estudo Ambiental
O deputado Bohn Gass (PT-RS) criticou o disposto do texto que flexibiliza as exigências do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima), que passam a ser exigido só em casos extremos.
E o deputado Joseildo Ramos (PT-BA) argumentou que essa matéria, pela relevância ambiental, pela defesa nacional e pela importância dos territórios indígenas e quilombolas não poderia estar sendo discutida e apreciada em sessão virtual.
Texto aprovado
O projeto aprovado retomou, com alterações, o texto da Medida Provisória 901/19, que tratou do tema e perdeu a eficácia em março passado. O texto especifica que as áreas doadas serão destinadas em especial à agropecuária diversificada, ao desenvolvimento sustentável e a iniciativas de colonização.
O texto também dispensa as áreas em faixa de fronteira da autorização do Conselho de Segurança Nacional para promover a regularização fundiária. A proposta exclui ainda das novas regras as glebas registradas em cartórios fora dos dois estados e prevê que a falta de georreferenciamento em certas situações não será impeditivo para as doações.
A doação destas terras já estava prevista (leis 10.304/01 e 11.949/09), mas não ocorreu de fato por causa de exigências para comprovação da posse das terras.
Vânia Rodrigues