-(*) Pedro Uczai
A cassação de uma vereadora de Santa Catarina ganhou grande repercussão na última semana. Maria Tereza Capra, de São Miguel do Oeste, teve seu mandato parlamentar cassado por denunciar uma saudação nazista feita por um grupo de bolsonaristas que não aceita o resultado das eleições. Um processo injusto, mas também um episódio de violência política de gênero. Antes de ter seu mandato cassado com o voto de 10 homens, Maria Tereza foi perseguida, ameaçada e teve que deixar a cidade para se proteger.
Maria Tereza está sendo atendida no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, além de monitorada por uma equipe federal com medidas emergenciais de segurança. A vereadora aguarda a publicação do Decreto Legislativo com o resultado da cassação para ingressar com um recurso judicial a fim de reverter a decisão injusta e retomar seu mandato conferido nas urnas pela população de São Miguel do Oeste.
Lamentavelmente, essas violências têm se repetido contra outras mulheres em Santa Catarina. Por se solidarizar com Maria Tereza, as vereadoras Ana Lucia, de Joinville, e Carla Ayres, de Florianópolis, receberam e-mails com graves ofensas e ameaças. Vítima das mesmas ameaças, Giovana Mondardo, de Criciúma, também enfrentou processo de cassação pelo mesmo motivo de Maria Tereza, mas o seu foi arquivado. Marlina Oliveira, de Brusque, que recentemente teve seu mandato ameaçado por fazer oposição ao governo local, também foi atacada esta semana. Da mesma forma, em Concórdia e Maravilha, as vereadoras Ingrid Fiorentin e Eliana Simionato são perseguidas pela extrema-direita.
O que todas elas têm em comum? São mulheres de esquerda ocupando espaços que tradicionalmente estavam, de certo modo, “reservados” aos homens. A cassação de Maria Tereza não pode ser vista como um caso isolado, assim como a perseguição a mulheres de diferentes regiões de Santa Catarina não se trata de mera coincidência. Não tem nada de “quebra de decoro”, como alegam os vereadores que perseguem as nossas vereadoras. Trata-se de um ataque orquestrado às mulheres de esquerda e à democracia. Mas por que querem intimidar, calar e silenciar estas mulheres? Porque elas levam ao legislativo local questões importantes à vida das mulheres, alteram a rotina do parlamento, desafiam o status quo. Elas denunciam, fazem oposição, fiscalizam.
E o que nós vamos fazer diante desta ofensiva? Nós, homens e mulheres que lutamos por um país mais justo, plural e diverso, cabe lutar para que a representação feminina seja efetivamente garantida. Precisamos nos organizar, junto à sociedade brasileira, para defender estas mulheres. Iniciativas como o Movimento Humaniza, em Santa Catarina, e o Instituto Marielle Franco, com atuação nacional, tornam-se cada vez mais importantes diante da ofensiva machista da extrema-direita. Nossa luta não começa nem termina com a eleição de mais mulheres. O Estado precisa proteger a vida dessas vereadoras, que tenham seus mandatos garantidos e que não sejam vítimas de nenhum tipo de violência.
(*) Deputado Federal (PT-SC)
Artigo publicado originalmente no jornal O Globo