Em mais uma demonstração da pressa do governo Temer em transferir para o setor privado o controle do patrimônio público, e da forma autoritária como são conduzidos os trabalhos da Comissão Especial de Desestatização da Eletrobras, o presidente do colegiado, deputado Hugo Motta (PRB-PB), marcou para esta quarta-feira (9) a apresentação do relatório sobre o tema, a cargo do deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA). A decisão foi muito criticada pelos partidos de oposição, entre eles o PT, que negociavam a apresentação do texto somente após a realização de todas as audiências públicas. Durante a reunião, Hugo Motta também ordenou a expulsão do plenário de manifestantes do setor eletricitário que vaiaram o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia. O ministro defendeu a privatização da Eletrobras.
Sobre a apresentação do relatório, Hugo Motta tentou explicar que a data foi marcada para esta quarta porque não houve consenso entre governo e oposição. Enquanto o governo defendia a liberação do texto desde a semana passada, a oposição queria esperar o final dos debates públicos. O colegiado tem uma série de audiências públicas marcadas em estados como Sergipe, Roraima, Rio de Janeiro, São Paulo e também em Brasília. Dentre essas, duas foram aprovadas nesta terça-feira (8) no colegiado, de autoria do deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) e Erika Lula Kokay (PT-DF).
A parlamentar do DF acusou Hugo Motta de agir de forma antidemocrática e subordinada ao interesse do governo Temer, que age nos bastidores para privatizar rapidamente a Eletrobras. “Essa decisão demonstra que não se quer chegar a um consenso (sobre a apresentação do relatório), por isso o senhor quer a apresentação do relatório amanhã (quarta) de forma subalterna aos ditames do Palácio do Planalto. Aliás, num arroubo de sinceridade o relator disse na semana passada que já estava com o relatório pronto. Essa foi uma forma de dizer que não é preciso escutar ninguém”, apontou Kokay.
Durante a audiência pública, o ministro da Fazenda repetiu os desgastados mantras do neoliberalismo em defesa da transferência do patrimônio público para o setor privado. Guardia disse que a venda de ativos da Eletrobras é necessária para cobrir dívidas e arcar com os investimentos necessários ao desenvolvimento do setor energético. Ao responder o ministro, o deputado Arlindo Chinaglia lembrou que esse não é o caminho adotado por países que têm como matriz a energia hídrica, como no caso do Brasil.
“Somos contrários à venda dos ativos públicos porque em países mais fortes economicamente e militarmente, é o Estado que controla a produção de energia, principalmente hidrelétrica que é a maior matriz do Brasil. Nos Estados Unidos, 73% dessa produção está nas mãos do governo, e é administrado por engenheiros do exército americano”, destacou o parlamentar.
Segundo Chinaglia, o consumidor fatalmente pagará a conta pela privatização da empresa. Ele lembrou que os exemplos recentes demonstram que “a sociedade é quem paga a fatura”. “É óbvio que em algum momento vão querer recuperar o investimento. E nossa experiência com privatização mostra que a tarifa sempre aumentou e o serviço piorou”, afirmou.
O deputado também contestou informação prestada pelo ministro da Fazenda, de que ao se tornar acionista minoritário na Eletrobras o Estado continuaria a ter influência nos destinos da estatal. Segundo o ministro, essa posição seria garantida pelas chamadas Golden Share – ações que conferem poderes especiais ao Estado mesmo em caso de participação minoritária em empresas privatizadas – e pela limitação do controle máximo de 10% das ações nas mãos das empresas privadas.
“A Embraer, privatizada na década de 1990, também previa as Golden Shares. Agora que o governo Temer pretende transferir o controle da Embraer para a Boeing pretende-se até desconsiderá-las. Portanto, as Golden Shares não são garantia nenhuma. Se um governo abrir mão delas, tudo cai por terra”, observou. O deputado Arlindo Chinaglia disse ainda que a limitação percentual do controle de ações, não inibe uma ação combinada de empresas do setor privado.
“Se pegarmos como exemplo empresas chinesas, cada uma poderá adquirir 10% das ações. Nesse caso, alguém acha que elas agiriam de forma isolada ou em conjunto, principalmente se todas são controladas pelo Partido Comunista chinês? ”, indagou o petista.
O parlamentar paulista ainda criticou a proposta de transferência do controle acionário pela estimativa de arrecadar R$ 12 bilhões. “Segundo consultorias especializadas, o lucro anual da Eletrobras é de R$ 8 bilhões por ano. Não é possível privatizar uma estatal pelo valor de 1 ano e meio de lucro”, ressaltou.
A audiência pública contou ainda com a participação do ex-conselheiro de Administração de Furnas Centrais Elétricas Felipe Sousa Chaves; do representante dos Empregados no Conselho de Administração da Petrobras Distribuidora S/A Bruno César Silva; e dos representantes da Brasil Bolsa Balcão Thiago Isaac e Patrícia Pellini.
Héber Carvalho