Especialistas no setor de energia afirmaram nesta quarta-feira (18), durante audiência pública na Câmara, que uma possível privatização da Eletrobras- como deseja o governo Temer- além de um atentado à soberania nacional, fatalmente traria enormes prejuízos ao desenvolvimento econômico e social do Brasil. Entre os retrocessos apontados no projeto de lei que tramita sobre o tema (PL 9.463/18), está a transferência do controle acionário da estatal para empresas estrangeiras, que passariam a controlar a geração e distribuição de energia, a vazão das águas de rios importantes, além de aumentos nas contas de luz muito superiores à inflação.
O ex-presidente da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e atual conselheiro da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), Nelson Hubner, destacou que nem mesmo países reconhecidamente adeptos do liberalismo econômico ousam privatizar sua principal matriz energética.
“A questão não é ideológica, mas, sim, pragmática. Não vou comparar o mercado brasileiro com a China, onde tudo é estatal. Vamos pegar a Noruega, cuja base da matriz energética são as hidrelétricas, assim como no Brasil. Lá, 90% da produção de energia está nas mãos do Estado. Na província de Quebec, por exemplo, onde a geração, a transmissão e a distribuição está nas mãos do governo, o custo da energia chega a ser de até um terço do valor que é cobrado onde existe a participação do setor privado”, explicou Hubner.
O especialista lembrou ainda que nos Estados Unidos o governo mantém 73% da produção de energia em usinas hidrelétricas nas mãos do governo. “As principais usinas ainda são administradas por um corpo de engenheiros do Exército norte-americano. Apenas as pequenas usinas estão sob a administração do setor privado”, ressaltou Nelson Hubner.
Durante a audiência o economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) Gustavo Teixeira também observou que a privatização fatalmente traria reajustes abusivos nas tarifas de energia e risco de apagão. Como exemplo, ele citou o que ocorreu em 2001, durante o governo tucano de FHC.
“As privatizações de várias concessionárias de energia trouxeram aumentos muito superiores à inflação. Se a privatização da Eletrobras ocorrer, teremos risco de desabastecimento principalmente em regiões com população esparsa, como no Norte, porque os investimentos passariam a obedecer a lógica do lucro no curto prazo”, destacou Teixeira.
Ainda sobre essa consequência, a representante do Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE)Fabíola Artezanacitou como exemplo o que ocorreu com a privatização da Companhia Energética de Goiás (CELG). “Além das mais de mil demissões na empresa, a tarifa aumentou muito acima da inflação e tem ocorrido uma piora visível na qualidade dos serviços. O índice de queda de energia em Goiás é sete vezes superior à média nacional”, observou.
Leilões de energia– O conselheiro da Cemig Nelson Hubner disse que no atual modelo de produção de energia em vigência no País, baseado em leilões de geração e transmissão de energia para promover a concorrência no setor e permitir a entrada no mercado de novos empreendedores, somente a atuação de uma estatal pode manter os preços das tarifas estáveis.
“Desde o processo de privatização do governo FHC, que permitiu a venda de várias concessionárias de energia, a participação da Eletrobrasnos leilões trouxe uma economia de mais de R$ 100 bilhões em tarifas que poderiam ter sido pagas pelos consumidores”, ressaltou.
Também participaram da audiência pública o representante do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea) José Chacon de Assis; o doutor em Direito Público da Universidade Federal do Pará (UFPA)Luiz Alberto Rocha; além dos deputados petistas Arlindo Chinaglia (SP), Patrus Lula Ananias (MG) e Paulão Lula (AL), membros titulares da Comissão, e os deputados Erika Lula Kokay (DF) e Henrique Lula Fontana (RS), suplentes do colegiado.
Héber Carvalho
Foto: Cléia Viana/Câmara dos Deputados