Especialistas da área do direito afirmaram durante seminário realizado na Universidade de Brasília (UnB), nesta segunda-feira (29), que vários métodos de investigação autorizados pela Justiça e executados pelo Ministério Público atualmente ferem as liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos e criminalizam entidades, causas e partidos políticos, contrariando os alicerces do Estado Democrático de Direito garantido pela Constituição de 1988. A afirmações aconteceram durante o seminário o Estado de Direito ou Estado de exceção, promovido pelas bancadas do PT na Câmara e no Senado, pela Fundação Perseu Abramo e a Frente Brasil Juristas pela Democracia.
Na primeira mesa do seminário, o tema em debate foi o Sistema de Justiça no Brasil e sua atuação na democracia: Táticas do Estado de exceção?. Sob a mediação da professora da UnB e representante da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares, Beatriz Ramos Vargas, especialistas apontaram riscos à democracia com os métodos recentemente adotados pela justiça e Ministério Público, principalmente no suposto combate à corrupção.
Para o professor da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, Pedro Serrano, tecnicamente ainda vigora no País o Estado Democrático de Direito. Mas ele alertou que, mesmo dentro desse regime, podem ser lançadas as sementes do Estado de exceção.
“O Estado de exceção se traduz na ausência de normas, onde acaba a valência do direito e predomina a do poder. A partir daí a ação passa a ser política e autoritária, com a justificativa de se enfrentar o inimigo. Portanto, não estamos totalmente dentro de um Estado de Direito, nem em um Estado de exceção, mas temos medidas de exceção sendo tomadas”, alegou.
Nesse sentido, Pedro Serrano destacou que a tese do pensamento único antecede o Estado de exceção. “Estamos ouvindo por aí afirmações de que a esquerda divide a sociedade. Não, isso é democracia. A ideia de um povo que pensa igual, segue a ideia da ordem, que é justificativa para o Estado de exceção combater os inimigos ideológicos”, ressaltou.
Ao também ressaltar que atualmente a justiça tem adotado medidas que ferem as normas legais, o professor de Direito Penal da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Antônio Pedro Melchior, destacou que algumas dessas práticas persecutórias “sequer mantém a aparência de imparcialidade”.
“Assim ocorre quando usam coação ou ameaças, inclusive de investigação contra membros da família, como meio de estimular uma delação premiada. Também há os vazamentos ilegais de conversas telefônicas ou delações, interceptação e gravação de conversas entre advogados e clientes e a banalização das conduções coercitivas. Essas são algumas das estratégias ardis utilizadas para obter provas ou informações por meio de legalidade duvidosa ou claramente ilícita”, ressaltou.
Já a professora de Direito da Universidad Carlos III, Madrid/Espanha, Maria José Farias Dulce, disse que o crescimento dos abusos cometidos pela justiça cresceu com o fortalecimento do neoliberalismo no mundo.
“Se é para servir de consolo, o Brasil não está sozinho nesse contexto de crise institucional da democracia e de ataques ao Estado Democrático de Direito. Na Europa, o neoliberalismo tem tomado de assalto o Estado. Vivemos um ciclo de crise na separação de poderes e de restrição de direitos”, explicou.
Héber Carvalho