A comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara (CDHM) divulgou nota em repúdio às declarações do ministro da Justiça, Osmar Serraglio, que menosprezou a luta histórica dos povos indígenas pela posse legítima de terras ao afirmar que “terra não enche barriga”. Para o presidente e o vice-presidente da comissão, deputados Padre João (PT-MG) e Nilto Tatto (PT-SP), respectivamente, “a declaração do ministro desconsidera a ancestralidade indígena e a relação que mantém com a terra, que vai além da produção e da simples moradia. Os índios tratam a terra como santuário, que não pode ser simplesmente removido de um lugar para outro, ao arbítrio do interesse financeiro e agrícola”. Leia a íntegra:
“A luta dos povos indígenas pelo acesso à terra é uma das maiores preocupações de todos aqueles que lutam pelos Direitos Humanos em nosso país. Portanto, repudiamos com veemência as declarações do novo ministro da Justiça, Osmar Serraglio, que declarou que “terra não enche barriga”. A declaração do ministro desconsidera a ancestralidade indígena e a relação que mantém com a terra, que vai além da produção e da simples moradia. Os índios tratam a terra como santuário, que não pode ser simplesmente removido de um lugar para outro, ao arbítrio do interesse financeiro e agrícola.
A postura do ministro Serraglio, que mostra despreparo para assumir o cargo logo em seus primeiros dias, nada mais é do que o reflexo de uma política que já vinha sendo implementada desde a posse de Michel Temer, de privilégio aos grandes latifundiários, grileiros e conglomerados econômicos que atuam na exploração do agronegócio, e que veem a presença dos indígenas como um obstáculo para os seus interesses financeiros e de poder.
São exemplos dessa política de Temer e do ministro que antecedeu Serraglio no MJ, Alexandre de Moraes, a tentativa de articular com a maioria aliada – muitos deles da bancada ruralista – no Legislativo a aprovação no Congresso da PEC 215, que submete ao próprio parlamento a validação de processos de demarcação de terras, o ressurgimento da CPI da Funai, com o objetivo de enfraquecer o órgão, e o anúncio de portaria do Ministério da Justiça que alterava todo o arcabouço que regula o processo de demarcação de terras indígenas. Somente após a pressão dos povos indígenas é que essa portaria foi retirada, no dia seguinte ao seu anúncio.
Além dos interesses políticos do agronegócio que estão por trás da figura do novo ministro, sua fala também revela que o atual governo está sendo norteado por uma perspectiva ultrapassada do papel do Estado quanto aos povos originários. Na contramão de um processo histórico e político de reconhecimento das diferenças, de valorização da diversidade cultural e de valores sociais, o novo Ministro da Justiça nega aos indígenas o direito de ter acesso à terra que, para eles, além de símbolo religioso de vida, é o meio fundamental de subsistência.
O uso, nas políticas públicas, da percepção de que é necessário integrar os povos indígenas à cultura ocidental para “desenvolvê-los” a fim de que atinjam “boas condições de vida” é, sobretudo, discriminatório. Precisamos combater essa lógica desenvolvimentista ligada à adequação ao modo de vida ocidental e, em contraponto, lutar pela garantia à terra, à vida e à dignidade dos nossos povos originários.
Esta Comissão manifesta o apoio irrestrito à luta indígena pelo direito à terra e se solidariza aos povos indígenas em mais uma tentativa do atual governo de criar animosidade, conflitos e de colocar a estrutura institucional do Poder Executivo a serviço daqueles que são contra os direitos dos índios.
Deputado Padre João
Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias
Deputado Nilto Tatto
2º Vice-Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias”
Assessoria da CDHM
Foto: Gustavo Bezerra
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