Foto: Gustavo Bezerra
Está na mira da Operação Zelotes uma fraude que envolve R$ 19,6 bilhões em créditos tributários devidos à União e uma organização criminosa bem engendrada para burlar a tramitação de processos no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Apesar da vultosa soma e da sofisticada rede de corrupção envolvidas, a Operação Zelotes, diferentemente de outras investigações em curso no País, não conta com o mesmo empenho do Poder Judiciário nem com a dedicação da grande imprensa para divulgar o caso. Atualmente, está sob o poder do Carf julgar um total de R$ 516 bilhões em créditos tributários devidos à União – quase cinco vezes o orçamento federal para a área da saúde em 2015.
O passo a passo da operação, as dificuldades de conduzir a investigação e a forma como os agentes criminosos agiam foram detalhados nesta quarta-feira (13) pelo procurador Frederico Paiva, do 6º Ofício de Combate à Corrupção da Procuradoria da República no Distrito Federal, que é responsável pela Zelotes. O depoimento ocorreu durante audiência da subcomissão que acompanha a investigação do caso, no âmbito da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara, presidida pelo deputado Vicente Cândido (PT-SP). A iniciativa da audiência foi dos deputados Paulo Pimenta (PT-RS) e Leo de Brito (PT-AC).
Para dimensionar o tamanho da fraude investigada pela Zelotes, basta comparar e verificar que todo o esforço atual do governo federal para corrigir distorções nas concessões de benefícios previdenciários e trabalhistas por meio de duas medidas provisórias (MP 664 e MP 665) resultará numa economia estimada em cerca de R$ 18 bilhões – quase R$ 2 bilhões a menos da quantia que pode estar envolvida no esquema de corrupção dentro do Carf. “Parte dos débitos lançados e cobrados foi cancelado por esses julgamentos”, explicou Frederico Paiva, que também detalhou as dificuldades que enfrenta atualmente no processo de investigação.
Até o momento, a Justiça negou abrir o sigilo da investigação, impedindo que a sociedade conheça quem são as empresas sobre as quais pesam comprovação de ilícitos; negou por duas vezes a prisão preventiva de 26 pessoas que fazem parte do núcleo da organização criminosa, impossibilitando a oitiva delas sem a possibilidade de combinação de depoimentos; negou escuta telefônica por tempo mais prolongado, dificultando os investigadores acompanhar a conclusão de uma negociação escusa; e negou a realização de algumas buscas e apreensões fundamentais ao levantamento de provas.
Durante a audiência, o deputado Paulo Pimenta demonstrou sua indignação diante da postura diferenciada e seletiva do Judiciário frente à Operação Zelotes. “Foi feito o pedido de prisão das 26 pessoas e foi negado pelo Poder Judiciário. Algo que não é comum. O mais inusitado é que houve um pedido de reconsideração, argumentando sobre a necessidade das prisões para o sucesso das investigações, e foi negado de novo. Outro fato que chama a atenção é que já existem fatos semelhantes envolvendo esses mesmos investigados, com denúncia do Ministério Público feita há muito tempo, mas há casos em que a Justiça nunca ouviu ninguém até hoje no processo”, detalhou o parlamentar.
Esquema – O procurador disse que os R$ 19,6 bilhões sob suspeita de fraude envolvem um total de 74 julgamentos, ocorridos entre 2005 e 2013, e que, desse universo, R$ 5 bilhões, que envolvem entre 15 e 20 processos, já têm provas mais consistentes a partir do que foi apurado até o momento.
O procurador Frederico Paiva detalhou que o esquema era muito bem arquitetado e segmentado em tarefas definidas. Elas eram delegadas para agentes específicos dentro da organização criminosa, de forma que quem estava lá na ponta, desempenhando determinada ação, dificilmente conhecia quem eram os cabeças da trama. Segundo o procurador, a falta de transparência do Carf facilitava toda a fraude.
Contou que inicialmente, um mensageiro, para quem já haviam sido repassadas informações sigilosas sobre processos em andamento no Carf, procurava as empresas que estavam com débitos tributários sendo questionados dentro do Conselho. Esse mensageiro oferecia os “serviços” da organização, que, basicamente, consistia em extinguir os débitos sub judice no Conselho em troca do pagamento de determinado valor para os participantes do esquema.
Frederico contou ainda que geralmente os empresários não acreditavam na proposta e, para provar que o “negócio” era de fato garantido, o tal mensageiro fazia uma espécie de sinalização do tráfico de influência dentro do Carf. Ele marcava dia, hora e nome do conselheiro que iria pedir vista de determinado processo. Quando a promessa se confirmava, dava certeza ao “contratante” de que o serviço oferecido seria verdadeiramente executado.
Faziam parte do esquema ex e atuais conselheiros, advogados da área tributária e ex e atuais servidores da Receita Federal do Brasil. Um fato inusitado envolvendo o esquema de corrupção é que a propina era travestida de certo caráter de “legalidade”, já que as empresas e os agentes criminosos, para disfarçar a corrupção, assinavam contratos de consultoria tributária, por onde o dinheiro escorria para os participantes da quadrilha. “O esquema de corrupção era sofisticado, por isso mesmo, existe o desafio de conseguir montar essa quebra-cabeças”, completou o procurador.
PT na Câmara