Tragédia em Brumadinho completa 3 anos, e petistas denunciam que governos estimulam mineração

Foto: Gustavo Bezerra/Arquivo

O rompimento da barragem da Vale S/A em Brumadinho (MG), um dos maiores desastres socioambientais do País, completa três anos neste 25 de janeiro. Embora a gigante da mineração já tenha sido obrigada pela Justiça a pagar indenizações a parte das vítimas, nenhuma pessoa física foi formalmente acusada pelo crime. Além do luto pela perda de 272 vidas, o saldo é de avanço na luta popular por medidas compensatórias. A devastação deixada pela lama tóxica, porém, continua fazendo vítimas.

O rio Paraopeba, destino dos 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos da mina Córrego do Feijão, ainda está contaminado. Em 2020, uma análise da ONG SOS Mata Atlântica concluiu que a água apresentava metais pesados. A quantidade de cobre, por exemplo, era 44 vezes maior do que o permitido.

Parlamentares da Bancada do PT na Câmara usaram suas redes sociais para relembrar a tragédia, pedir punição e afirmar que o “lucro não vale a vida”. O líder do partido, deputado Reginaldo Lopes (MG), enfatizou que o crime da Vale em Brumadinho deixou 272 pessoas mortas e danos irreparáveis ao meio ambiente. “O acordo de reparação de danos sequer ouviu a população das comunidades atingidas”, lamentou.

 

O deputado Rogério Correia (PT-MG) destacou que, como relator da CPI de Brumadinho e representando a Câmara dos Deputados, participaria da missa com Dom Valmor e Dom Vicente, em solidariedade às famílias e amigos das vítimas do crime da Vale. “No relatório indiciamos 21 responsáveis, além da Vale e da Tüv Süd e exigimos justiça”, afirmou.

Rogério Correia disse ainda que Brumadinho hoje, em atos, relembram o rompimento da barragem da Vale. “São 272 mortes e três anos de impunidade”, lamentou. “Com a enchente no Paraopeba, além da dor das lembranças a região sofre agora com o retorno dos rejeitos em forma de lama e poeira tóxicas”, completou.

Ao criticar os 3 anos de impunidade, o deputado Patrus Ananias (PT-MG) citou que três meses depois do crime da Vale em Brumadinho, o governador de Minas, Romeu Zema (Novo), afirmou que “não podemos conviver com o passado, temos de olhar para o futuro”. O deputado disse que, no entanto, até hoje, “convivemos com a impunidade e com a ameaça. Mas não vamos esquecer nem deixar de lutar!”, assegurou.

Na avaliação do deputado Ananias, a vida da população tem que estar acima do grande capital. “Justiça para os mais de 2,5 milhões de atingidos por barragens no Brasil!”, pediu e enfatizou: “Nossa luta é para que crimes semelhantes não ocorram e para que a justiça seja feita. Brumadinho nunca mais! Infelizmente não é esta a realidade de milhares de mineiros que vivem próximos a barragens de mineração”, afirmou, ao acrescentar que pelo menos 31 barragens estão em situação de emergência em Minas Gerais.

Comunidade destruída

O deputado Padre João (PT-MG) ao protestar contra os três anos de impunidade destacou que a comunidade de Brumadinho foi destruída. “Três anos do crime da Vale que matou 270 pessoas em Brumadinho. Seis ainda estão desaparecidas. A comunidade foi destruída, bem como a bacia do Paraopeba. E ninguém foi punido. Chega de morte, destruição e ganância. A ‘Mãe Terra’ geme e grita por socorro”.

Padre João afirmou ainda que os crimes que aconteceram em Brumadinho, na bacia do rio Paraopeba, e em Mariana, na bacia do rio Doce, não foram casos isolados, acidentes ou por acaso. “Fazem parte de um modelo de mineração que é destrutivo, predatório e que visa o lucro acima de tudo”, denunciou.

O deputado Nilto Tatto (PT-SP), ao manifestar solidariedade aos familiares e amigos das vítimas de Brumadinho, destacou que hoje o dia era de luto, pela tragédia que completa três anos. “Minha solidariedade também àqueles que sobreviveram e lutam para reconstruir suas vidas”, afirmou, ao destacar que segundo a doutora Aline Dutra de Lima, que coordenou a equipe de psicólogos em Brumadinho, “o impacto da tragédia é muito mais amplo e duradouro do que nós podemos imaginar”.

E o deputado Rubens Otoni (PT-GO) também indagou de quem é a culpa pelos desastres naturais.

Contra a “minerodependência”

Nos últimos 36 meses, a população atingida se organizou e obteve conquistas importantes. A Vale reconheceu uma ampla gama de atingidos em toda a Bacia do Rio Paraopeba. A mineradora considerava apenas as mortes e perdas de bens como impactos do crime. Com isso, 100 mil atingidos receberam o auxílio econômico emergencial.

Outra consequência da pressão popular foi uma decisão judicial que obrigou a Vale a financiar as chamadas Assessorias Técnicas, grupos de profissionais especializados que subsidia os atingidos com análises e informações relevantes, ajudando a apontar caminhos para quem busca justiça. Até então, populações atingidas tinham que confiar nos estudos feitos pela própria mineradora.

“Tais conquistas dos atingidos foram imprescindíveis para seguirem na luta pela reparação integral”, afirmou Fernanda de Oliveira Portes, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

Há 26 meses, a população atingida vem se organizando não só pela concretização das medidas compensatórias, como também pela construção de um modelo de desenvolvimento econômico que torne a região menos dependente da mineração predatória.

O Plano de Recuperação e Desenvolvimento da Bacia do Rio Paraopeba e Lago de Três Marias prevê participação popular na definição de como serão gastos R$ 3 bilhões, fruto de um acordo entre Vale, Justiça e governo de Minas Gerais. A quantia financiará projetos nas comunidades atingidas, conforme diretrizes estabelecidas coletivamente.

“O nosso plano é a possibilidade que o nosso povo tem de construir um futuro diferente. Um futuro que enfrente as mazelas provocadas pelo modelo de desenvolvimento que foi imposto para esse território: o modelo da mineração, do agronegócio, da fome e da morte”, enfatizou Silvio Neto, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

Povos originários da região também foram impactados. Indígenas Pataxó e Pataxó Hã-hã-hãe, habitantes da aldeia Naô Xohã, deslocaram-se para os centros urbanos em razão do risco de contaminação, enquanto outros permaneceram no território.

Segundo o Greenpeace, dezenas de indígenas lutam para serem reconhecidos como atingidos e que exigem que a Vale S/A pague os valores emergenciais, além de garantir a realocação das famílias para um novo território.

Risco de novas tragédias

Na contramão da atuação popular, o governo mineiro de Romeu Zema (Novo) estreitou laços com mineradoras, assinando cinco novos acordos que preveem a ampliação da atividade no estado, elevando o já alto risco de novos desastres como a de Brumadinho.

Segundo a Agência Nacional de Mineração (ANM), das 47 barragens de rejeitos em risco iminente de rompimento, 42 estão em Minas Gerais. Uma delas é a barragem de Serra Azul, onde a produção anual de minério de ferro passará de 1,6 milhão para 4,5 milhões de toneladas, com o aval do governo estadual.

“A gente já está cansado de viver nesta ‘minerodependência’, em que a gente não consegue ver outras perspectivas e outros horizontes. O que a gente quer, não é pedir muito. É o justo. A gente quer água de qualidade, comida na mesa de todo mundo, educação. A gente quer que encontrem as joias desaparecidas na lama e que a verdade seja contada”, defendeu Marina Oliveira, articuladora da Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário (Renser)

Outro “presente” de Zema para o setor minerário veio em novembro de 2021, no aniversário do rompimento da barragem em Mariana – de responsabilidade da Samarco, controlada pelas mineradoras Vale e BHP Billiton.

Desta vez a beneficiária é a New Steel, subsidiária da Vale. O documento prevê a implementação de pilhas estéreis de rejeito em três minas da empresa, prolongando em 20 anos a vida útil dos empreendimentos.

Impasse judicial gera Impunidade

Responsável pelo caso desde 2019, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) chegou a ajuizar uma ação penal contra o ex-presidente da Vale, Fábio Schvartsman, e outras 15 pessoas pelos crimes de homicídio qualificado das 272 vítimas.

Mas em outubro do ano passado, a pedido da defesa de Schvartsman, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o caso deveria ser julgado pela Justiça Federal.

Contrário à decisão, o MPMG anunciou no início deste ano que tentará revertê-la no Supremo Tribunal Federal (STF), instância máxima do judiciário brasileiro. “Esperamos que não fique só no papel. Que de fato tenha o quanto antes o julgamento desse processo”, afirmou Joceli Andrioli, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

Outro inquérito, elaborado pela Polícia Federal (PF), terminou com o indiciamento da Vale e da Tüv Süd, empresa responsável pela auditoria da estrutura da barragem, pela prática de crimes ambientais contra fauna, flora, recursos hídricos, unidades de conservação e sítios arqueológicos.

Além das multinacionais, 19 pessoas – entre consultores, engenheiros, gerentes e diretores – foram indiciadas por homicídio doloso, com dolo eventual, duplamente qualificado pelo emprego de meio que resultou em perigo comum e de recurso que dificultou ou impossibilitou a defesa do ofendido.

O inquérito foi encaminhado ao Ministério Público Federal (MPF), que vai definir se apresenta ou não denúncia contra os indiciados.

Tamanho da devastação

Na Mata Atlântica, o rompimento da barragem provocou a perda de uma área aproximadamente do tamanho de 153 campos de futebol. Mais de 70 hectares de Áreas de Preservação Permanente (APP) também foram atingidos pelos rejeitos de mineração. Os dados são do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Nos mais de 300 km do Rio Paraopeba analisados pela SOS Mata Atlântica (desde a região de Córrego do Feijão até o reservatório de Retiro Baixo, em Felixlândia), a água estava imprópria, sem condições de uso. A ONG também verificou que os rejeitos contaminaram até o Rio São Francisco, um dos mais importantes do Brasil.

Segundo as assessorias técnicas, foram afetadas áreas urbanas de 26 municípios no entorno do Rio Paraopeba, atingindo cerca de 200 mil pessoas.

Redação PT na Câmara, com site Brasil de Fato

 

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