Enquanto a atual direção da Petrobras mantém nas mídias uma campanha em que tenta defender a indefensável política de preço de paridade internacional (PPI), a gasolina bate uma marca histórica. Em outubro, o preço médio chegou a R$ 6,341, patamar mais alto deste século, tanto em valores nominais como reais. A estimativa é do monitor de preços do Observatório Social da Petrobras (OSP).
A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) calcula que a gasolina acumula alta de 45,3% nos postos este ano. Na segunda-feira (1), Jair Bolsonaro insistiu em transferir para o ICMS a responsabilidade pela carestia dos combustíveis. Em entrevista coletiva em Roma, disse ainda que soube “extraoficialmente” que em 20 dias a Petrobras iria anunciar novo aumento. Foi desmentido pela empresa no mesmo dia.
Ao jornal Valor, o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) André Braz disse que o preço da gasolina interfere diretamente na inflação. Em suas contas, o combustível compromete 6% do orçamento familiar.
“É uma pressão inflacionária que faz toda diferença, porque tem impacto grande, direto e deve vigorar ao longo de 2022”, avaliou. “Não existe previsão de queda no barril de petróleo ou de nenhuma melhoria no câmbio no Brasil, dada a discussão sobre fontes de financiamento para o governo no ano que vem”.
Braz ressaltou ainda que a economia do país vai colher em dezembro e janeiro parte dos aumentos de outubro. Se a gasolina terá um impacto mais imediato em novembro, o efeito do preço do diesel demora mais a chegar ao consumidor, por vias como o valor do frete e o preço de bens que usam transporte de carga.
“O impacto do diesel se transmite pela cadeia lentamente”, explicou o economista, lembrando dos transportes urbanos. “Isso engrossa o caldo do IPCA de 2022”, comentou. “Cada mês tem uma coisa a mais que acontece com a inflação. Novembro não tinha nada para pressionar e vieram os combustíveis”, lamentou Braz.
Golpe distanciou a Petrobras da realidade dos brasileiros
A presidenta nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), apontou a causa dos preços exorbitantes. “Preço da gasolina é o mais alto em 1 século. Foi por isso que deram o golpe, vender refinarias e ativos da Petrobras, dolarizar a produção… Me pergunto, cadê aquela gente que usava adesivo da presidenta nos carros e a xingava. Será que agora entendem onde tudo aquilo levou o País?”, questionou no Twitter.
Preço da gasolina é o mais alto em 1 século. Foi p/ isso que deram o golpe, vender refinarias e ativos da Petrobras, dolarizar a produção…Me pergunto, cadê aquela gente que usava adesivo da presidenta nos carros e a xingava. Será q agora entendem onde tudo aquilo levou o país?
— Gleisi Hoffmann (@gleisi) November 5, 2021
A Federação Única dos Petroleiros (FUP) criticou o “anúncio com sotaque estrangeiro, para inglês ver e ouvir” da Petrobras. Para a entidade, a peça publicitária não tem compromisso com a realidade dos brasileiros, “que enfrentam inflação galopante com reajustes abusivos da gasolina, do diesel e do GLP”.
Coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar lembra que a gasolina já passou dos R$ 7,00 em alguns postos do país, e dos R$ 9,00 no Acre. Para ele, a campanha enganosa da gestão do general Joaquim Silva e Luna segue a linha negacionista do desgoverno Bolsonaro, atribuindo a terceiros a causa principal dos aumentos dos preços da gasolina.
“A empresa esconde a verdade ao não mencionar que os seguidos reajustes são determinados pela política de PPI, que norteia os demais agentes do mercado”, aponta o dirigente. A assessoria econômica da FUP estima que 1/3 dos custos de produção de petróleo e refino no Brasil possuem aderência ao câmbio e preços internacionais. Mesmo o país sendo autossuficiente em petróleo, com grande parte dos custos em real.
“A propaganda omite que, individualmente, a Petrobras fica com a maior parte do preço total”, ressalta Bacelar. Na peça publicitária, a empresa alega ser responsável por apenas uma das cinco parcelas do preço final da gasolina e que recebe R$ 2,33 pelo litro.
“A gestão da Petrobras está se especializando em propaganda mentirosa. Utilizou dinheiro dos brasileiros para produzir e veicular na mídia esse anúncio que esconde uma grande verdade: a gestão bolsonarista explora o povo brasileiro”, conclui o dirigente.
Lava jato travou investimentos e abriu portas para o desmonte
Detentor do mandato mais longevo à frente da Petrobras (22 de julho de 2005 a 13 de fevereiro de 2012), José Sergio Gabrielli afirma que a disparada dos preços é “a consequência inevitável” de uma política imposta à Petrobras desde 2015. Na ocasião, o lawfare promovido pela força tarefa da operação lava jato estava a pleno vapor.
“Se você abre o país para mais importação, se você diminui o uso do petróleo nacional, porque aumenta a exportação do petróleo cru e não processa o petróleo cru nas refinarias, que não estão crescendo – aliás, a expansão das refinarias foi inviabilizada com a lava jato –, você tem uma situação em que o país passa a ser dependente do mercado internacional”, explicou o economista em entrevista a Paulo Moreira Leite, no programa Sexta-feira 13h, do canal TVPT no Youtube.
“Tudo foi feito para que o país ficasse mais dependente dos preços internacionais, porque aumentou-se muito a importação de derivados, algumas refinarias foram desativadas e em outras reduziram a utilização, foram criados mais de 400 importadores de derivados no país e a Petrobras está desmontando seu parque de refino”, elenca.
Nesse momento em que “você tem simultaneamente o aumento do preço internacional e a depreciação do real”, constata Gabrielli, a dolarização promovida desde o golpe de 2016 faz a explosão de preços ser inexorável. Mas com o PT não foi assim.
“Nós vivemos, de 2006 a 2012, um período de altos preços de petróleo. O preço chegou a US$ 140 o barril em 2010, 2011 (US$ 82 na cotação atual). A gasolina brasileira não bateu recorde naquela época. Por quê? Porque a Petrobras administrava os aumentos”, ressalta o economista.
“A Petrobras não se desconectou completamente do preço internacional porque não pode, o Brasil é um país aberto, mas você não precisa passar todo dia o aumento dos preços para o consumidor”, prossegue. “Você não precisa fazer isso, principalmente se você tem produção nacional, em que seu custo é muito baixo, em reais”.
A prática de ajustar quase cotidianamente o preço da gasolina e do diesel acelerou os reajustes domésticos, estourou os preços e criou a situação atual, diz Gabrielli. “O que nós temos hoje é a inviabilidade dessa política no médio e longo prazo e acusações absolutamente falsas, em que a parte é responsável pelo todo. Ou seja, não se pode atribuir a variação do preço à percentagem fixa do preço da bomba, que é o ICMS”.
Segundo ele, o grande problema no curto prazo é o atrelamento acelerado dos preços domésticos aos preços internacionais, mas no médio e longo prazo o país está condenado a um problema grave, atrelando-se mais e mais ao mercado internacional.
“Não podemos esquecer de mudar a política geral de abastecimento. Se o Brasil voltar a crescer um pouquinho, estoura a capacidade de refino do país. Nós estamos no limite porque não criamos capacidade de produção de derivados de petróleo”, alerta.
Para Gabrielli, que era o presidente da Petrobras quando as reservas do pré-sal foram confirmadas, a estatal caminha rapidamente para se transformar de uma empresa integrada “do poço ao posto” em mera exportadora de óleo cru.
Propaganda da Petrobras é + nova fake news do governo. Mentir é política de Bolsonaro e os seus. Mentem descaradamente e institucionalizam a mentira. Fazem o $ dos combustíveis explodir pela ganância dos acionistas privados e p/ convencer o povo q a Petrobras deve ser privatizada
— Gleisi Hoffmann (@gleisi) November 7, 2021
Com Lula e Dilma, Petrobras se reinventou
Influenciados pelo movimento das peças no tabuleiro geopolítico global, os preços do petróleo no plano internacional variam ao sabor das conjunturas. Já o seu repasse para os valores de derivados depende da estrutura dos mercados de refino e distribuição de cada país e das respectivas políticas na repartição das rendas petrolíferas.
Nos governos Lula e Dilma, a Petrobras adotou uma política de preços que repassava de forma parcial as variações de curto prazo dos preços internacionais de petróleo para os preços domésticos de derivados. A empresa se valia da condição de quase única grande produtora de petróleo, grande refinadora e grande importadora e distribuidora de derivados no país.
A frequência dos reajustes, a relação deles com as taxas de câmbio e as condições do mercado interno do Brasil combinavam a contenção dos impactos inflacionários dos aumentos com as necessidades de lucratividade de longo prazo dos acionistas. Ao mesmo tempo, a empresa se mantinha capitalizada para fazer seus investimentos.
Em 2005, a Petrobras atingiu a certificação de investment grade da agência Moody´s. As outras agências, Standard & Poor’s e Fitch, fizeram o mesmo em 2007, reduzindo ainda mais os custos para a empresa captar recursos.
Em 2010, a Petrobras promoveu a maior capitalização da história das bolsas de valores do mundo. Foram US$ 70 bilhões em lançamento de ações, que reforçaram o capital da estatal para garantir os investimentos no pré-sal e sua integração com outros setores.
Durante os governos de Lula e Dilma, a Petrobras se tornou uma das maiores empresas em valor nas bolsas. O preço do título PBR, equivalente a ações da empresa no mercado de Nova York, saiu de US$ 3,67, em 31/12/2002, para US$ 55,31, em 1/08/2008, aumentando 15 vezes, até a crise de 2008. Mesmo depois dela, em finais de 2011, esses papéis eram negociados a US$ 24,67, o equivalente a 6,7 vezes do seu valor em 2003.
Para o futuro próximo, o PT chama a atenção para o grande debate com a sociedade sobre a transição dos combustíveis fósseis para os renováveis. Com a destruição do modelo de desenvolvimento centrado na construção de uma cadeia nacional de suprimento de equipamentos e serviços para o setor de petróleo e gás, com o desmonte da Petrobras e com as concessões para novas áreas exploratórias do pré-sal, é preciso definir um novo modelo para o setor.
Em seu Plano de Transformação e Reconstrução do país, o PT defende o fortalecimento do papel da Petrobras e a garantia da expansão de uma cadeia de fornecedores no Brasil, para internalizar uma parte maior da renda petroleira.
Há também a necessidade de revisão da política de aceleração dos leilões das áreas exploratórias no pré-sal, ampliando os mecanismos de expansão da parte governamental nas receitas geradas pela atividade e seu direcionamento para o financiamento da educação, além de alternativas tributárias e regulatórias para financiar a transição energética e uma nova política industrial para o país, voltando a gerar emprego e renda.
Da Agência PT de Notícias