Parlamentares do PT afirmaram nesta quarta-feira (26) na Câmara que o discurso moderado do atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, não condiz com a prática negacionista demonstrada na prática pelo presidente Jair Bolsonaro. A afirmação dos petistas refere-se à participação do ministro em audiência pública realizada na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC), na qual o ministro relatou um cenário utópico de combate à Covid-19 no País e ainda defendeu medidas desprezadas por Bolsonaro, como a vacinação, uso de máscara e necessidade de distanciamento social.
Durante a inquirição, um dos autores do requerimento que viabilizou a audiência pública, o deputado Leo de Brito (PT-AC), questionou Marcelo Queiroga sobre que tipo de autonomia ele pode ter no comando do ministério para implementar as normas sanitárias de combate à Covid-19, definidas pela ciência e pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O petista lembrou que o presidente Jair Bolsonaro viola constantemente o distanciamento social e o uso de máscara, a exemplo do que ocorreu recentemente em uma “motociata” e uma espécie de “comício fora de época” no Rio de Janeiro.
Ao responder para Leo de Brito, o ministro disse que possui autonomia total no ministério, mas entrou em contradição na sequência. “Como vivemos em um sistema presidencialista, e fui indicado pelo presidente, é preciso validação técnica e política dos atos do ministério. Porque senão não tem como implementar as ações de combate à pandemia”, disse Queiroga, reconhecendo sem querer sua autonomia limitada.
“Eu acredito que é uma grande contradição o ministro da Saúde concordar em seguir as recomendações da OMS no combate à Covid, enquanto a prática do próprio presidente Bolsonaro é exatamente oposta, como por exemplo ocorreu no Rio de Janeiro. Existe uma grande incoerência entre o que o ministro fala e o que faz o presidente e grande parte de seus ministros”, apontou Leo de Brito.
Vacinação lenta
Durante a audiência, Marcelo Queiroga defendeu a vacinação como solução para amenizar a pandemia no País e tentou “pintar” um cenário otimista sobre o andamento do Plano Nacional de Imunização no Brasil, afirmando que o governo já providenciou a compra de 600 milhões de doses de vacinas. Porém, indagado sobre o ritmo da vacinação no País – considerado lento pelos especialistas – reconheceu que as 38 mil salas de vacinação existentes no Brasil têm a capacidade de vacinar 2,4 milhões de pessoas por dia, número muito inferior à média atual. Nessa terça-feira (25), por exemplo, foram aplicadas a 1ª dose em 451,9 mil pessoas e 2ª dose em outras 278,7 mil, totalizando 730,6 mil pessoas vacinadas no dia.
Também questionado a explicar a entrega das doses de vacinas previstas para o próximo mês de junho, Queiroga repassou a resposta ao secretário executivo do Ministério da Saúde, Rodrigo Cruz. Ao especificar a previsão de entrega dos imunizantes ele reconheceu que, ao invés das 54 milhões de doses previstas para o próximo mês, o País terá a sua disposição somente 41,9 milhões, 12 milhões de doses a menos.
Cloroquina
Em relação à liberação de recursos para a produção de cloroquina para tratamento precoce da Covid-19 – cuja eficácia não é reconhecida pela ciência – o ministro repassou a pergunta para ser respondida pelo secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Ministério da Saúde, Hélio Angotti Neto. Ele reconheceu que o medicamento é indicado para tratamento da malária – ao contrário do que defende o próprio presidente Bolsonaro e muitos de seus apoiadores – e disse ainda que o Ministério da Saúde não fez investimento direto para aumentar produção de cloroquina.
Durante a audiência pública, Marcelo Queiroga também foi confrontado sobre a atuação da secretária de Gestão do Trabalho do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, mais conhecida como “Capitã Cloroquina”. Porém, apesar da provocação o ministro não emitiu juízo de valor sobre as declarações de sua auxiliar, que defendeu o uso do medicamento no chamado tratamento precoce para a Covid-19, não reconhecido pela ciência. Essa omissão irritou o deputado Alexandre Padilha (PT-SP).
“Não existe a menor condição dessa senhora Mayra continuar no Ministério da Saúde. Além de mentir 11 vezes durante o depoimento na CPI da Covid no Senado, ela admitiu que indicou o uso de cloroquina durante o colapso da saúde em Manaus, ferindo o Código de Ética do Servidor Púbico e o CONITEC (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde – órgão que regula a indicação de medicamentos pelo SUS). Ela não pode continuar como sua assessora no Ministério da Saúde. Até ontem ela respondia por atos da gestão passada (de Pazuello), mas a partir de agora o senhor também poderá ser responsabilizado pelos atos dela. Demita essa senhora Ministro”, defendeu Padilha.
Marcelo Queiroga no banco dos réus
Ao se dirigir ao ministro, o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) observou ainda que não bastam do titular da pasta da saúde boas intenções. Segundo ele, a omissão do ministro em relação a atitudes negacionistas de Bolsonaro e de outros integrantes do governo, também podem colocar Marcelo Queiroga no banco dos réus no futuro.
“Por isso, ministro, para preservar a sua biografia o senhor não tem como defender essas coisas dizendo que não vai olhar para o passado. Porém, o senhor também não pode se omitir. O seu silêncio vai ser encarado como cumplicidade, e o senhor vai passar para a história como outros que se calaram diante de genocídios que ocorreram no passado e poderá um dia ser julgado no Tribunal Penal Internacional pelo genocídio deste governo”, alertou o petista.
Héber Carvalho