O líder do PT na Câmara, Elvino Bohn Gass (RS), rechaçou hoje (11) a tentativa da base bolsonarista de mudar o regimento interno da Câmara. Em artigo no site da Folha de S. Paulo, ele denunciou que o projeto de resolução (PRC 35/2021) de autoria do deputado Efraim Filho (DEM-PB) “é, na prática, uma lei da mordaça para dar às forças oposicionistas um mero papel figurativo frente a um rolo compressor de uma maioria eventual. Sob o disfarce de agilizar os trabalhos, reduz-se a voz dos contrários, o que configura um atentado à democracia.”
Disse que se trata de um “retrocesso inadmissível”, uma vez que o projeto acaba com os destaques, limita requerimentos e aniquila o direito à manifestação de divergências. “Significa que pode haver sessão sem requerimento nenhum e sem contestação. A minoria, em vez de ter requerimentos próprios, só poderá discutir”, alertou o líder do PT.
Bohn Gass observou que todos os governos nos últimos 30 anos que antecederam o atual — os dos presidentes José Sarney, Fernando Collor, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff— enquadraram-se nas normas e foram levados a dialogar com as bancadas minoritárias. “Nem por isso, deixaram de aprovar matérias de seu interesse, mas não foi calada a voz e nem cerceada a atuação das oposições”, frisou.
“Democracia sólida pressupõe liberdade de voz e atuação da oposição e da minoria no Congresso Nacional”, escreveu Bohn Gass. “O bolsonarismo, com a proposta atual, não quer aprimorar normas, mas restringir esse direito essencial. Em outras palavras, a maioria quer que o governo fale sozinho e não seja contestado”.
Leia a íntegra do artigo:
“Querem calar a voz da oposição na Câmara”
É inaceitável a tentativa das forças bolsonaristas de calar a voz da oposição e da minoria com a mudança do regimento interno na Câmara dos Deputados. O projeto de resolução (PRC 35/2021) de autoria do deputado Efraim Filho (DEM-PB) é, na prática, uma lei da mordaça para dar às forças oposicionistas um mero papel figurativo frente a um rolo compressor de uma maioria eventual. Sob o disfarce de agilizar os trabalhos, reduz-se a voz dos contrários, o que configura um atentado à democracia.
É legítima a discussão sobre um ou outro item, desde que seja no sentido de aprimorar o funcionamento da Câmara. Entretanto, o projeto acaba com os destaques, limita requerimentos e aniquila o direito à manifestação de divergências. Significa que pode haver sessão sem requerimento nenhum e sem contestação. A minoria, em vez de ter requerimentos próprios, só poderá discutir.
O projeto não acaba só com a possibilidade de obstrução da oposição. Ele fortalece o relator, impedindo qualquer minoria de atuar contra o interesse da maioria voltada à defesa de um projeto específico. Um retrocesso inadmissível.
Desde a promulgação da Constituição de 1988, Câmara e Senado elaboraram seus regimentos internos que garantiram de uma só vez a limpeza do entulho autoritário herdado do regime militar e asseguraram o direito da oposição dentro do Parlamento, com um conjunto de instrumentos agora alvo do bolsonarismo.
Todos os governos nos últimos 30 anos que antecederam o atual —os dos presidentes José Sarney, Fernando Collor, Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma Rousseff— enquadraram-se nas normas e foram levados a dialogar com as bancadas minoritárias. Nem por isso, deixaram de aprovar matérias de seu interesse. Mas não foi calada a voz e nem cerceada a atuação das oposições.
Desde sua posse, em janeiro de 2019, o presidente neofascista Jair Bolsonaro tenta mudar as regras para que a sua maioria no Congresso Nacional, ignorando a minoria, “tratore” tudo e “passe a boiada”, para usar duas expressões comuns a este momento sombrio em que vivemos.
Nenhum ex-presidente da Câmara cedeu a essas pressões. Prevaleceu, sempre, o entendimento democrático de que a minoria de hoje pode ser maioria de amanhã, e vice-versa. A garantia dos espaços de atuação da oposição e da minoria é pré-requisito essencial de qualquer Parlamento.
Se o projeto passar, o governo vai aprovar suas pautas sem debatê-las. Isso não permite que se exerça a principal atividade do Parlamento, que é debater os temas, aprofundando-os até que se encontre o caminho mais seguro, a síntese mais completa das opiniões. O governo quer aprovar suas pautas entreguistas e demolidora de direitos da população sem debate. Nós acreditamos que é com argumentação sólida que se constroem narrativas verdadeiras e transparentes.
Os instrumentos de que a oposição dispõe hoje, entre os quais a possibilidade de pedido de adiamento de debate sobre determinado projeto, inversão de pauta de votação e verificação de quórum, por exemplo, serão suprimidos. O caráter autoritário dos bolsonaristas ou os simples interesses clientelistas dos que por ora têm maioria na Câmara formam o pano de fundo em prol dessa mudança oportunista.
Alegam que os instrumentos existentes há mais de 30 anos paralisam ou retardam a votação de projetos importantes. Ora, é uma atitude antidemocrática tentar suprimir esses recursos; querem reduzir nosso papel e ferir a representação democrática na Câmara e a opinião do eleitor.
As ferramentas que garantem a atuação de quem pensa diferente são legítimas, existem em qualquer sistema democrático. Suprimi-las significa pavimentar um arriscado caminho para a “ditadura da maioria” no Congresso Nacional. Os que hoje pensam em golpear a democracia, com base em seus interesses momentâneos, devem se lembrar de que eventuais mudanças no regimento vão atingir frontalmente a liberdade do exercício parlamentar, numa atividade na qual quem é governo hoje pode ser oposição amanhã.
Democracia sólida pressupõe liberdade de voz e atuação da oposição e da minoria no Congresso Nacional. O bolsonarismo, com a proposta atual, não quer aprimorar normas, mas restringir esse direito essencial. Em outras palavras, a maioria quer que o governo fale sozinho e não seja contestado.
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2021/05/querem-calar-a-voz-da-oposicao-na-camara.shtml
Elvino Bohn Gass
Deputado federal (PT-RS) e líder do partido na Câmara