Não é fatalismo, o Brasil de 2020 desenhado no Projeto de Lei Orçamentária enviado por Bolsonaro ao Congresso vai nos impor mais um ano sem crescimento e de mais desmonte de políticas públicas consagradas na Constituição de 88, notadamente saúde e educação.
O receituário de corte de gastos está em execução, a bem da verdade, desde 2015, com a gestão desastrosa do ex-ministro Joaquim Levy. Meirelles e Paulo Guedes apertaram fundo no acelerador do arrocho. Serão seis anos de insistência numa estratégia obsoleta, que está dando errado e que todos os manuais de economia (FMI e Banco Mundial inclusos) condenam pelo acúmulo de experiências malsucedidas.
Para 2020, Bolsonaro corta quase 50% dos investimentos públicos e chega ao menor patamar da história, apenas R$ 25 bilhões, 0,33% do PIB – na União Europeia é de 3%; nos países emergentes, 6,4%; na América Latina, 5,5%. Em 2018, relatório “Public Investment Management Assessment”, do FMI, já alertava para o erro brasileiro em cortar investimentos públicos em cenário de crise.
O discurso do governo, nem eles acreditam, é de uma retomada de investimentos privados via uma mágica conquista da confiança do mercado, que viria com o Teto dos Gastos, depois com a Reforma Trabalhista, e agora com a Reforma da Previdência. Tudo aprovado, e nada. Nos últimos 12 meses, R$ 100 bilhões saíram do país, uma fuga de capitais que denota o inverso e tem feito o dólar disparar a R$ 4,18.
Em vez de deseducar com falsas analogias das contas públicas com o orçamento doméstico, é preciso franqueza: só vamos equilibrar as contas se o país voltar a crescer, e só se produz riqueza com investimento. Com mais de 50 milhões de desempregados e desalentados, com a indústria com capacidade ociosa de 40%, qualquer investimento hoje gera crescimento sem inflação. Se o PIB cresce, aumenta a arrecadação de impostos e reduz o tamanho da dívida pública versus PIB. Fazer dívida para investir, neste caso, é um bom negócio.
Infelizmente, não interessa a esse governo. A estratégia deles é alongar a crise e usá-la de pretexto para esgotar a pauta de desmonte de direitos, privatizar tudo que for possível, reduzir o gasto público com o povo ao mínimo. Em 2021, anotem, teremos o fim do teto dos gastos e a retomada de algum investimento público. Quando isso acontecer, será em outro patamar institucional, com a riqueza produzida sendo apropriada quase que exclusivamente pela elite do país, que pagará menos ao trabalhador diretamente, via remuneração, e indiretamente, com menos tributos que financiariam previdência, saúde e educação de todos.
Com o orçamento de 2020, está projetado um apagão nos serviços públicos. Vão tentar pautar o fim da universalidade, integralidade e gratuidade do SUS. Se em 2019 já sofremos com falta de medicamentos e até vacinas nos postos de saúde, com redução de rede credenciada e leitos em todo o Brasil, imagine com R$ 10 bilhões a menos como previsto no orçamento?
*Jorge Solla é deputado federal (PT-BA). Artigo publicado originalmente no jornal A Tarde.
Foto – Gabriel Paiva