Bolsonaro quer acabar com reajuste do salário mínimo acima da inflação

Jair Bolsonaro (PSL) deve retirar dos trabalhadores e trabalhadoras pobres mais um direito conquistado durante o governo do ex-presidente Lula: o reajuste do salário mínimo acima da inflação.

A fórmula atual de cálculo do reajuste, implantada em 2004, depois da entrada em vigor da Política de Valorização do Salário Mínimo proposta pela CUT e aprovada pelo Congresso Nacional, leva em conta o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes mais a inflação do ano anterior, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).

Segundo o Dieese, se não houvesse essa política, o valor do salário mínimo seria de apenas R$ 573,00 e não de R$ 998,00, como é hoje.

Bolsonaro quer interromper esse aumento do poder de compras dos mais pobres enviando, até o dia 15 de abril ao Congresso Nacional, o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020, sem a previsão de reajuste real. Pela proposta da equipe econômica, comandada pelo ministro da Economia, o banqueiro Paulo Guedes, o piso salarial deve ser corrigido apenas pelo INPC.

O governo alega que a revisão real do mínimo pressiona a inflação, contribui para o baixo nível de produtividade da economia e afeta as contas públicas porque são usados para revisar o valor mínimo de aposentadorias e outros benefícios assistenciais e trabalhistas.

A professora de economia da USP Leda Paulani, lamenta esta decisão, embora diga que não se surpreende com a medida adotada por Guedes e sua equipe, já que eles defendem a política de preservar o rendimento de quem detém a riqueza financeira, não pensam em distribuição de renda nem combate à miséria como o ex-presidente Lula.

A valorização do salário mínimo, diz ela, beneficiou cerca de 70 milhões de aposentados e beneficiários do INSS que recebem o piso nacional, além de ter aumentado o rendimento médio dos trabalhadores com salários mais baixos.

“Se multiplicarmos os 20 milhões de aposentados, entre rurais, urbanos e beneficiários do Benefício de Prestação Continuada (BPC), pelo tamanho médio da família brasileira que é de 3,5 pessoas, temos 70 milhões de pessoas beneficiadas com o aumento real do salário mínimo. Isso sem contar os trabalhadores e trabalhadoras que obtiveram ganhos médios de 20% em seus salários”, diz a professora.

“Esta foi a grande mágica que permitiu que o Brasil distribuísse renda e deixasse de ser o país em último lugar no índice Gini, que mensura a desigualdade no mundo”, afirma.

O reajuste acima da inflação tem efeito positivo não apenas para os trabalhadores e aposentados, mas para a economia do país em geral, acrescenta a secretária de Relações de Trabalho da CUT, Graça Costa, lembrando que mesmo num momento de crise financeira mundial, como em 2008, Lula manteve a Política de Valorização do Salário Mínimo.

“Lula entendeu que o impacto do aumento real não seria apenas para o trabalhador, mas para a sua família e, consequentemente, para todo um grupo que, com mais dinheiro na mão, poderia consumir e aquecer a economia”.

“Mas, infelizmente, o governo Bolsonaro quer que apenas os ricos continuem com seus privilégios em detrimento da maioria da população”, afirma.

De acordo com a secretária, “o que vai trazer o crescimento econômico de volta é investimento, criação de novos empregos e não cortar renda de quem trabalha. Fazer um ajuste fiscal baseado apenas em cortes precariza ainda mais as relações de trabalho e vai levar o país ao passado, de aumento da desigualdade social”.

A cartilha de Bolsonaro é a da época da ditadura

Para a professora da USP, Leda Paulani, o governo Bolsonaro estuda na mesma cartilha do período da ditadura militar quando o ex-ministro da Fazenda, Delfim Neto, dizia que era preciso o bolo crescer para depois dividir.

“Os governos do PT demonstraram o contrário. Não são os cortes nos reajustes das aposentadorias, do BPC e dos salários que vão resolver a crise econômica. Pelo contrário, vai acontecer o retorno das desigualdades sociais nos níveis de antes. O ganho vai se dissipar e a situação tende a piorar porque o desemprego aumentou”.

“As consequências disso para a sociedade serão ruins, porque vai piorar a distribuição de renda”, analisa, lembrando que foi a redistribuição de renda no país, com a valorização de mais de 75% de ganho real do salário mínimo, nos governos do PT, que fez o Brasil ser objeto de estudo no Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.

“Até hoje o Brasil é estudado como um caso de sucesso, fora da curva, por ter conseguido distribuir melhor a renda num curto período, ao contrário de outros programas sociais que demoram mais a apresentar resultados positivos”, diz.

A professora conclui que, associar a conjuntura econômica a uma política que vai estancar o crescimento do salário mínimo e à reforma da Previdência, que aumenta o tempo de contribuição e reduz o valor dos benefícios, vai prejudicar ainda mais os mais pobres.

Histórico da política de valorização do salário mínimo/Fonte: Dieese

Em 2004, as CUT e demais centrais sindicais, em um movimento unitário, lançaram a campanha pela valorização do salário mínimo. Nesta campanha, foram realizadas três marchas conjuntas em Brasília com o objetivo de pressionar e, ao mesmo tempo, fortalecer a opinião dos poderes Executivo e Legislativo sobre a importância social e econômica da proposta de valorização do salário mínimo.

Também como resultado dessas negociações, foi acordado, em 2007, uma política permanente de valorização do salário mínimo.

Desde 2003 até 2017, segundo o Dieese, o ganho real, ou seja, acima da inflação foi de 77,01%.

A partir de 1º de janeiro de 2017, o salário mínimo era de R$ 937,00. Este valor representou 6,48% sobre os R$ 880,00 em vigor durante 2016 e não correspondeu à variação anual do INPC, em 2016, que foi de 6,58%.

Caso o índice tivesse sido aplicado integralmente, o valor teria ficado em R$ 938,00. Uma vez que o PIB em 2015 não registrou crescimento, seguindo a regra em vigor, não foi aplicado este ganho adicional.

Já em 2018, o reajuste do salário mínimo foi o menor em 24 anos. Subiu apenas 1,81%, ficando em R$ 954,00.

Neste ano, a alta foi de 4,61%, de acordo com a inflação do ano anterior mais a variação do PIB dos dois anos anteriores, e chegou a R$ 998,00.

 

Por CUT

 

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