“Quem elegeu a junta militar que gerencia a crise que nos governa?”, indaga líder Paulo Pimenta

Em artigo, o líder do PT na Câmara, deputado Paulo Pimenta (RS), faz um diagnóstico dos primeiros 45 dias do governo de Bolsonaro. O parlamentar critica pelo menos duas proposições que chegaram ao Congresso Nacional nos últimos dias: a Reforma da Previdência e o “pacote anticrime” de Moro. Os projetos apontam para o que representa, de direito e de fato, o governo ultraneoliberal e de extrema direita no Brasil, ou seja, a introdução do modelo de destruição do Estado Democrático de Direitos, que visa a acabar com os avanços sociais obtidos com a Carta de 88, além de recrudescer o estado policialesco no País.

Leia o artigo na íntegra.

 

A necessidade do estado policial

Chegam ao Congresso nesta terceira semana de fevereiro, os dois projetos que sustentam a permanência do capitão no mais alto posto do País: o pacote anticrime do ministro da justiça – prudentemente expurga o capítulo que tratava de Caixa 2, para evitar contaminações que poderiam leva-lo à derrota no plenário – e a Reforma que pretende liquidar com a Previdência Pública no Brasil expurga o capítulo sobre a aposentadoria dos militares, por razões óbvias, considerando o perfil de um governo que mostra à sua frente os rostos caricatos de quatro generais. Aliás, o Brasil arrasta consigo historicamente uma queda irreprimível pela caricatura: um dos quatro generais é o Floriano Peixoto, ‘ressuscitado’.

De um lado, abre-se, assim, o calendário da disputa pelo que realmente importa para o bloco de forças sociais e políticas que articulou o movimento iniciado logo após as eleições presidenciais de 2014 e levou ao golpe em 2016, com o impeachment da Presidenta Dilma Rousseff, consolidando o bloco dos segmentos mais conservadores da sociedade brasileira contra as conquistas sociais e políticas abrigadas na Carta de 1988. De outro, os assalariados que iniciam seu processo de mobilização com assembleias e atos contra a destruição dos direitos conquistados ao longo de mais de meio século de lutas por uma partilha menos injusta da riqueza do País, e contra a máquina de violência do Estado contra suas famílias que vivem nas favelas e periferias das cidades brasileiras.

O Capitão, bem, o Capitão tem as mãos ocupadas a dedilhar no Twitter intervenções nas desavenças entre seu partido, seus filhos e seus ministros, o mais próximo deles – Secretário- Geral da Presidência da República – demitido na segunda-feira, 18 de fevereiro, depois de marchas e contramarchas reveladoras do estado de confusão e amadorismo do entorno de um presidente.

Além da demora, o percurso entre a denúncia do laranjal do PSL e a demissão de Bebianno, revela uma duplicidade de critérios: o Ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, também denunciado pela participação na colheita de cítricos durante a campanha eleitoral permaneceu, até agora, apesar do desconforto, dentro do governo.

Gustavo Bebianno, acusado de mentiroso, causa imediata alegada para sua demissão do cargo, decidiu brindar o público com o conteúdo dos áudios que documentam seus contatos com o Capitão, negados pelo filho. Prestou, assim, um serviço à sociedade: revidou provando quem está mentido ao País.

Depois de 45 dias de vexames sucessivos, o teatro de fantoches que busca se fazer passar por governo, entrega ao Congresso o “pacote anticrime” oferecido pelo ministro da justiça. É necessário que os setores democráticos da sociedade voltem o olhar para essa monstruosidade e para a convergência sinistra entre o conteúdo proposto – uma guerra aberta de classe que mobiliza o Estado contra a população pobre do País e o fortalecimento do comando fardado do governo.

Já a Comissão Arns, que entrou em atividade nesses dias, a Ordem dos Advogados do Brasil, além de outras entidades de Juristas, de Defensores Públicos comprometidas com a defesa do Estado Democrático de Direito, entidades religiosas, e de Defesa dos Direitos Humanos vieram a público expressar seus pontos de vista contra uma proposta que viola a Constituição e pode se definir como a institucionalização do Estado Policial, o sonho dourado de Sérgio Moro.

O Estado brasileiro, dirigido por um governo com relações suspeitas com as milícias, trata de dotar-se de um escudo institucional, por meio do pacote, para impor a agenda ultraneoliberal, agora com a destruição da Previdência Social e a entrega deste vasto mercado de serviços – garantidos até agora como direitos pela Seguridade Social, de acordo com a Carta de 88 – agora convertidos em mercadorias e oferecidos graciosamente aos bancos, brasileiros e estrangeiros.

A sucessão de acontecimentos bárbaros do último mês afasta o Brasil de qualquer parâmetro que possa identificar-nos como uma sociedade civilizada: o massacre da favela do Fallet-Fogueteiro, no Rio, 15 jovens executados; o assassinato de Pedro Henrique Gonzaga de 19 anos pelo Segurança de um Hipermercado, Davi Ricardo Moreira diante de testemunhas entre elas a mãe da vítima, falam por si.

Num quadro tão aterrador, a proposta do ministro da justiça se constitui em um código de guerra contra os pobres ao abrir as portas para maior letalidade da ação policial. Quando assegura na proposta que modifica o Art. 23, parágrafo 2: “O juiz poderá reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso (do agente do Estado) decorrer de excusável medo, surpresa ou violenta emoção”. O texto “desloca o poder político da esfera democrática, onde opera o legislador, para a discricionariedade do magistrado”, como sustenta o Dr. Roberto Bueno em artigo recente. Penetramos no pantanoso terreno da subjetividade e da discricionariedade que conduziu, nos anos 30 de século XX, às aberrações perpetradas pelo judiciário alemão sob o nazismo.

A síntese aterradora desse movimento que o País assiste nos primeiros 45 dias de governo no que toca às questões de fundo – Reforma da Previdência que vai multiplicar a multidão de pobres proposta por Guedes e o Pacote anticrime proposto por Moro – cabe numa linha: “Guedes os cria, eu os mato!”

O plano inclinado em que resvala o governo nesses primeiros dias impõe ao bloco de forças que lhe dá sustentação a necessidade de ampliar e conferir uma densidade cada vez maior e, assim, legitimar a ação dos generais para salvar o governo de si mesmo e garantir o avanço da agenda neoliberal.

Perguntar não ofende: quem elegeu a junta militar que gerencia a crise que nos governa?

Paulo Pimenta

Líder da Bancada do PT na Câmara dos Deputados

 

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