Programa Luz para Todos incluiu 16 milhões de brasileiros na economia

Em dezembro de 2005 a eletricidade começou a chegar à aldeia Sapukai, em Angra dos Reis (RJ). Junto, vieram aparelhos de televisão, antenas parabólicas, geladeiras. Assim, em 13 de junho de 2006, os índios assistiram pela TV à estreia da seleção brasileira de futebol na Copa da Alemanha.

A reportagem “Mundial Chega à Aldeia”, do jornalista Eduardo Nunomura e do fotógrafo Robson Fernandes, para o jornal O Estado de S. Paulo, retratava uma parte do país que começava a sair do esquecimento. Naquele ano, além das 74 famílias da comunidade Guarani Mbya, de Angra, outras 3 milhões haviam acabado de sair do escuro com a chegada do programa Luz Para Todos.

O programa fora apresentado pela então ministra das Minas e Energia, Dilma Rousseff, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda em seus primeiros meses de governo, e implementado em novembro de 2003. A meta era levar energia elétrica aos rincões do Brasil. Antes disso, o simples ato de apertar o interruptor para iluminar um ambiente, enxergar o filho dormindo ou abrir a geladeira para ter água fresca era apenas sonho, que acabou sendo realizado por 3,4 milhões de famílias, ou 16,3 milhões de pessoas nos anos seguintes.

Dos atendidos, cerca de 35 mil eram famílias indígenas, 29 mil famílias quilombolas. Além disso, 14 mil escolas em áreas rurais puderam viabilizar a abertura de cursos noturnos e o uso de equipamentos de informática, ventiladores e geladeiras para a conservação da merenda.

Dados do Ministério das Minas e Energia, de 2013, demonstravam que a renda dos atendidos pelo programa aumentou 41%. Metade dos lares onde chegou a energia era chefiada por mulheres.

 

Prioridade

O programa Luz para Todos foi criado para atender prioritariamente escolas rurais, áreas de pobreza extrema, comunidades indígenas, quilombos, assentamentos, pequenos agricultores, populações ribeirinhas, famílias em áreas próximas de reservas, os afetados por empreendimentos do setor elétrico, ou seja, os atingidos por barragens.

Para se alcançar essa população, foi preciso superar estimativas e obstáculos que historicamente haviam acomodado o poder público. “Disse que íamos universalizar o Luz para Todos, e vamos”, afirmou a então presidenta Dilma Rousseff, na comemoração de 10 anos do programa, em 2013.

“Estamos na fase de universalização, estamos na fase mais difícil. Por fim, fica o que é mais difícil de fazer. Por que onde está o que falta? No meio da Floresta Amazônica. Ou em lugares de difícil acesso. (…) Achávamos que tínhamos 10 milhões de pessoas, em torno de 2 milhões de ligações, descobrimos que tinha 12 milhões, depois eram 15 milhões. E, hoje, falta 270 mil. Aí vai me perguntar se cumpriu a meta? Cumpri. Estamos agora nos 15 milhões e um pouquinho. Não ter 15 milhões sem luz faz toda diferença do mundo. É um outro país”, definiu Dilma.

Onde não havia acesso possível por terra, postes, cabos e transformadores foram levados de helicóptero. Para os trechos onde os rios não tinham profundidade suficiente para carregar postes pesados, foram produzidos outros, de fibra de vidro, com 10% do peso de um poste de concreto. E no meio das florestas, para evitar o desmatamento, a utilização de cabos com isolamento especial, presos nas árvores.

Assim, os 78% da população brasileira com acesso à energia elétrica saltaram para 97%. “Quando a gente começou a fazer o Luz para Todos, outra vez o preconceito: esse governo só pensa no pobre, nada para nós que moramos na cidade”, disse em junho de 2015, o presidente Lula. “Mas o interessante é que quando a pessoa colocava uma luz na casa dela, 79% das famílias compraram televisão; 73% compraram geladeira, 50% compraram liquidificador, outros compraram máquina de fazer ração, bomba d’água. Na verdade, foram 2,4 milhões de televisores e 2,2 milhões de geladeiras por conta do simples programa Luz para Todos.”

Lula falava na abertura da 39º Conferência da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). Em Roma, na Itália, o petista expunha ao mundo os feitos do “simples” programa federal para economia do país a partir de uma fórmula que não cansa de repetir: incluir o povo nos planos de um governo não é problema, é solução.

Na Comunidade Quilombola Ribeirão da Mutuca, na zona rural do município de Nossa Senhora do Livramento (MT), Laura Ferreira da Silva comemorava a chegada da luz. Formada em Pedagogia e estudante de Direito, ela se emociona ao falar do exemplo dos pais, João Pedro da Silva, 59 anos, e Justina Ferreira da Silva, 58, que conseguiram concluir o ensino médio após a chegada da eletricidade. Só assim o quilombo pôde receber uma escola com aulas noturnas.

Laura fala também do ganho em qualidade de vida para os moradores da comunidade. “Agora temos geladeira e nossos produtos não estragam mais, temos liquidificador e podemos aumentar a produção de doces, conservas, banana frita, que são fabricados pela associação de mulheres da nossa comunidade. A produção é vendida nas cidades do entorno, resultando numa renda de cerca de R$ 1.200 por mês, por família.”

Na zona rural de Uberlândia (MG), no Projeto de Assentamento José dos Anjos, 45 famílias também viram suas vidas mudar. A família de Elizabeth de Souza Vieira, que antes do Luz para Todos trabalhava numa plantação de eucaliptos, comprou uma bomba d’água, uma chocadeira elétrica e passou a criar frango caipira.

“Hoje nós trabalhamos por conta própria. A água, puxada pela bomba, é abundante e eu vendo limões e laranjas cultivados no meu pomar, além dos frangos, que é o nosso maior negócio.” Elizabeth também produz queijo com o leite da vaquinha que tem na propriedade.  “Antes não era possível sem a geladeira. Agora, eu posso tudo. Inclusive abri mão do Bolsa Família. Não preciso mais. Posso dizer com orgulho que agora tenho um trabalho, e renda para sustentar a minha família.”

 

40 voltas em torno da Terra

Até 2016, quando os dados deixaram de ser atualizados após o golpe que retirou Dilma Rousseff da Presidência da República, os investimentos no Luz para Todos somaram R$ 22,7 bilhões, R$ 16,8 bilhões do governo federal e o restante aportado por governos estaduais e distribuidoras de energia.

No mesmo período, foram instalados 8,5 milhões de postes para sustentar os 1,6 milhão de quilômetros de cabos de energia que, como gosta de contar o ex-presidente Lula, dariam 40 voltas em torno o planeta Terra – 135,6 mil quilômetros subaquáticos. “Nenhuma empresa privada, por mais humanista que fosse, iria fazer, porque não era rentável, apenas socialmente justo e eticamente necessário. E somente o Estado poderia arcar com essa responsabilidade.”

O programa, coordenado pelo Ministério de Minas e Energia, tem participação da Eletrobras e de cooperativas, organizações sociais, agentes e as próprias comunidades. Ou seja, corre riscos diante da possibilidade de privatização do setor.

Em entrevista à Agência PT, o ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e ministro interino de Minas e Energia em 2005, Maurício Tolmasquim, conta: “Quando chegamos ao governo, a energia elétrica era um setor traumatizado”. Tolmasquim se refere ao apagão de 2001, que submeteu o país a um racionamento que causou bilhões em prejuízo.

“O problema do racionamento é que as estatais estavam proibidas de investir, porque estavam em processo de privatização e na época o FMI considerava investimento como despesa. A ideia é que viria capital privado, que nunca veio”, disse o ex-presidente da EPE, que também é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Para ele, o grande trunfo do governo Lula no setor elétrico foi estabelecer modelos de tarifa que incentivaram a expansão da geração de energia com baixo custo, além de atender milhões de pessoas que ainda se encontravam na era do candeeiro.

 

Agência PT e Rede Brasil Atual

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