Lideranças de organizações e órgãos brasileiros que atuam na defesa dos direitos humanos foram ouvidas na tarde desta segunda-feira (4) pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA). Por meio de uma reunião virtual que durou pelo menos duas horas, foram relatadas violações que o governo do presidente Jair Bolsonaro vem cometendo contra a sociedade brasileira, especialmente populações mais pobres e vulneráveis, no contexto da pandemia da Covid-19.
A doença causada pelo novo coronavírus, que avança sobretudo nas periferias, já matou mais de 7.300 brasileiros. O país tem mais de 105 mil infectados, segundo dados mais recentes do Ministério da Saúde.
Este fórum social realizado para tratar de assuntos brasileiros ocorreu uma semana depois do evento que discutiu a situação na Argentina. Entre as questões relatadas estão os efeitos da omissão, da desinformação e do negacionismo em relação à gravidade da doença que pôs o mundo em quarentena e de uma política que elegeu a economia em detrimento da saúde e da vida.
A covid-19 se espalha nas favelas, nos presídios, comunidades terapêuticas, entre a população de rua. Faltam políticas e orientação para a população trans e profissionais do sexo. Direitos indígenas são violados em suas terras, que inclui omissão ante ao contágio trazido por garimpeiros e desmatadores. A maneira desigual das ocorrências de mortes atingindo negros e negras e a subnotificação devido à falta de testes. A desassistência, o enfraquecimento da participação social, a escalada do autoritarismo, a perda de direitos. E em meio a isso tudo, a desinformação – o chefe de Estado contraria diariamente as recomendações das autoridades médicas do Brasil e do mundo.
Incapacidade de coordenação
Questões estruturais e relacionadas ao direito ao trabalho e renda foram relatadas pelo presidente da Unisol Brasil e vice presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), Leonardo Pinho. “Relatamos a escalada autoritária, com manifestações organizadas em torno do discurso do presidente Bolsonaro contra as instituições, que clamam por ruptura institucional, golpe e um novo AI-5, e a sua incapacidade de coordenação. Também que o governo federal não cumpre seu papel de coordenador de ações estratégicas, e que o presidente faz falas de boicote às medidas de isolamento social. Há necessidade de revogar a Emenda Constitucional 95 para garantir capacidade do Estado em investir para garantir direitos e renda “, disse Pinho.
O enfraquecimento e boicote à participação social também foram relatados. “No contexto da crise, o governo enfraquece ainda mais os conselhos e comitês, inviabilizando a realização de reuniões e de acesso à informação. Além disso, viola diretrizes constitucionais e da Organização Internacional do Trabalho (OIT), impondo a negociação individual contra a negociação coletiva”, destacou.
Segundo o conselheiro, a comissão da OEA foi informada sobre o fato de Bolsonaro promover a insegurança alimentar ao descumprir a lei federal que garante alimentação escolar para todas as famílias de estudantes de escolas públicas, de dificultar o acesso à renda básica emergencial – o que está provocando pontos de aglomeração nas cidades ao mesmo tempo que exclui populações vulneráveis do auxílio. E para completar, não sancionou o Projeto de Lei 873/20, que garante renda para milhares famílias que praticam a agricultura, catadores e a economia solidária.
Segunda rodada
A reunião foi dirigida pelo presidente da CIDH, Joel Hernández, a primeira-vice-presidenta Antonia Urrejola Noguera, a relatora especial para direitos humanos econômicos, sociais, culturais e ambientais, Soledad Garcia Muñoz, e o secretário-executivo da comissão, o brasileiro Paulo Abrão.
O fórum realizado ontem ocorre no âmbito da Sala de Coordenação e Resposta Oportuna e Integrada à crise em relação à pandemia da covid-19 (Sacroi Covid-19). Está inserida em uma estratégia para monitorar e acompanhar o impacto nos direitos humanos de populações e grupos em situação de vulnerabilidade no contexto da pandemia.
Está prevista uma segunda rodada de escutas com representantes das organizações, para atualização das informações. E também o envio de comunicados detalhados para subsidiar o trabalho da comissão.
“A gente espera que o relatório do Joel Hernández, presidente da CIDH e relator para o Brasil, seja mais um elemento de pressão internacional para que o governo adote medidas acertadas”, disse Leonardo Pinho.
Por Rede Brasil Atual