Antes de conceder entrevista à Folha de S. Paulo e ao El País, na última sexta-feira (26), o ex-presidente Lula fez um pronunciamento no qual reafirma sua inocência e reforça que suas ideias e seus ideais continuam vivos na memória e no coração do povo brasileiro. “Mantenho minha esperança e confiança no futuro, em um julgamento justo (…) Eu sei muito bem qual é o lugar que a História nos reserva, meus companheiros e companheiras. E sei também quem estará na lixeira dos tempos quando o povo vencer mais essa batalha”.
Veja a íntegra do pronunciamento:
“Minha condenação injusta e minha prisão ilegal há mais de um ano são mais que o resultado de uma farsa jurídica. São consequências diretas do fracasso social, econômico e político do golpe do impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff em 2016. Aquele golpe começou a ser preparado em 2013, quando a Rede Globo usou sua concessão pública para convocar manifestações de rua contra o governo e até contra o sistema democrático. Tudo valia para tirar o PT do governo, inclusive a mentira e a manipulação pela mídia.
Isso aconteceu quando nossos governos tinham alcançado nossas maiores marcas: multiplicamos o PIB por várias vezes, chegamos a 20 milhões de novos empregos formais, tiramos 36 milhões da miséria, levamos 3,5 milhões de jovens à universidade, acabamos com a fome, multiplicamos de modo espetacular a produção e comércio da agricultura familiar, multiplicamos por quatro a oferta de crédito. E isso em meio a uma das maiores crises do capitalismo na história mundial.
O novo Brasil que estávamos criando, junto com o povo e as forças produtivas nacionais, foi retratado pela Rede Globo e seus seguidores na imprensa como um país sem rumo e corroído pela corrupção. Nem em 1954, contra Getúlio, nem em 1964, contra Jango, se viu tanta demonização contra um partido, governo ou presidente. Centenas de horas no Jornal Nacional e milhares de manchetes e capas de revistas contra nós. Nenhuma chance de defender nossas opiniões.
Mesmo assim, em 2014, derrotamos os poderosos nas urnas pela quarta vez consecutiva. Para quem não conhece o Brasil: nossas “elites” dizimaram milhões de indígenas desde 1.500; destruíram florestas e enriqueceram por 300 anos à custa de escravos, tratados como bestas; colonos e operários tratados como servos; divergentes como subversivos; mulheres como objeto, e diferentes como párias. Negaram terra, dignidade, educação, saúde e cidadania ao nosso povo.
Mas a Globo, o mercado, os representantes dos estrangeiros, os oportunistas da política e os exploradores da gente simples disseram que era preciso tirar o PT do governo para resolver os problemas do Brasil. Hoje o povo brasileiro sabe que foi enganado.
Criamos o PT, em 1980, para defender as liberdades democráticas, os direitos do povo e dos trabalhadores. O acúmulo das lutas do PT e da esquerda, do sindicalismo, dos movimentos sociais e populares nos levou a consolidar um pacto democrático na Constituinte de 1988. Esse pacto foi rompido pelo golpe do impeachment em 2016 e por seu desdobramento, que foi minha condenação sem culpa e minha prisão em tempo recorde para não disputar eleições.
Reafirmo minha inocência, comprovada por todos os meios de prova nas ações em que fui injustamente condenado pelo ex-juiz Sergio Moro, sua colega substituta e três desembargadores acumpliciados do TRF-4. Repudio as acusações levianas dos procuradores da Lava Jato e denuncio Deltan Dallagnol, que nunca teve a coragem de sustentar ante meus olhos as mentiras que levantou contra mim, minha esposa e meus filhos.
Mais de um ano depois de minha prisão arbitrária, está cada dia mais claro para o povo brasileiro que fui injustiçado para não ser candidato nas eleições presidenciais do ano passado, nas quais, segundo todas as pesquisas de opinião pública, teria sido eleito em primeiro turno contra todos os adversários. O povo sabe que minha prisão teve motivos políticos. Posso dormir com a consciência tranquila por ser inocente. Os que me condenaram, não.
Fui condenado sem provas e sem crime; minha pena ilegal foi agravada pelo arbítrio de três desembargadores do TRF-4, tão parciais quanto o ex-juiz Moro; os recursos de minha defesa, lastreados em argumentos sólidos, foram ignorados burocraticamente pelo STJ; meus direitos políticos foram negados –contra a lei, a jurisprudência e uma decisão da ONU – pela Justiça Eleitoral.
Mesmo assim minhas ideias e meus ideais continuam vivos na memória e no coração do povo brasileiro. Mantenho minha esperança e confiança no futuro, em um julgamento justo, por causa das generosas manifestações de solidariedade que recebo todos os dias aqui em Curitiba, por parte de companheiros maravilhosos da Vigília e de todos os cantos do Brasil e do mundo.
Eu sei muito bem qual é o lugar que a História nos reserva, meus companheiros e companheiras. E sei também quem estará na lixeira dos tempos quando o povo vencer mais essa batalha. Mais importante do que isso: sei que a injustiça cometida contra mim recai sobre o povo brasileiro, que perdeu direitos, oportunidades, salário justo, emprego formal, renda e esperança num futuro melhor.
Hoje estou aqui para falar com jornalistas, como sempre fiz ao longo da vida. Na verdade, para falar com nosso povo. Esse direito me foi negado por mais de sete meses e durante o processo eleitoral, o que estava absolutamente fora da lei.
Mas guardo comigo uma certeza: preso ou livre, censurado ou não, tenho com o povo brasileiro uma comunhão eterna que o tempo não vai apagar. Contra todos os poderosos, contra a censura e a opressão, estaremos sempre juntos por um Brasil melhor e mais justo, com oportunidades para todos.”
Luiz Inácio Lula da Silva
Por Lula.com.br