“Vou ao Senado para defender a democracia, o projeto político que eu represento, o que eu acho que são os interesses legítimos do povo brasileiro e, sobretudo, construir os instrumentos que permitam que isso nunca mais aconteça neste país.”, afirmou a presidenta eleita Dilma Rousseff, em ato promovido pela Frente Brasil Popular na noite desta quarta-feira (24) no Teatro dos Bancários, em Brasília.
Acompanhada de lideranças de movimentos sociais e do Partido dos Trabalhadores e de membros de seu governo, Dilma reforçou que o que está em curso um golpe contra seu mandato, contra um projeto de governo eleito democraticamente e contra 54 milhões de eleitores.
Dilma afirmou que, apesar do empenho de seus oposicionistas em atacá-la para que renunciasse, esta jamais foi uma opção, porque não existiu crime de responsabilidade que justificasse seu afastamento. “Na vida, a gente sempre tem que lutar. Da mesma forma como, lá atrás, lutamos contra a luta militar – e ganhamos – fizemos a Constituição de 88, desta mesma maneira, vamos aprofundar a democracia no nosso país”, afirmou. “Nesse processo, nós já ganhamos. Agora nós temos de saber que teremos de continuar lutando. Podem continuar comigo. Eu conto com vocês”
E lamentou: “Eu achei que nunca mais íamos viver um Golpe de Estado. E estou intensamente vivendo um”.
Entre os presentes no evento, estavam os ex-ministros Jaques Wagner (Casa Civil), Miriam Belchior (Planejamento), Eleonora Menicucci (Secretaria de Políticas para as Mulheres), Miguel Rossetto (Trabalho e Previdência) e Maurício Muniz (Secretaria dos Portos), assim como os deputados federais Érika Kokay (PT-DF), Patrus Ananias (PT-MG), Paulo Pimenta (PT-RS) e Moema Gramacho (PT-BA).
A presidenta cumprimentou nominalmente todos os presentes no palco, agradeceu as flores que recebeu quando chegou ao evento e falou que o país vive “tempos sombrios”: “Não tem tanque neste momento, não tem armas neste momento. Só tem uma arma, a arma que pretende ser discreta ao rasgar a Constituição. Estão me condenando por algo fantástico: um não-crime. Eu não cometi nenhum crime”.
Em sua fala, argumentou também que este é um golpe, apesar de instituições da democracia estarem de pé, porque golpes mudam de figura. Citou o suicídio de Getúlio Vargas, em 1954, episódio que adiou o golpe de Estado que interromperia, dez anos depois, a democracia brasileira. Nesta quarta-feira, a morte do ex-presidente completou 62 anos.
Para a presidenta, “a democracia do Brasil não caiu do céu e não surgiu do nada. Foi construída ao longo do tempo”. É por esta razão que o único jeito de combater este golpe é intensificar os debates sobre democracia, encontrar mecanismo para ampliá-la e fazer manifestações populares, artísticas e intelectuais.
A presidenta comparou a democracia a uma árvore e disse: “O golpe militar é um machado matando a árvore; já o golpe atual é uma infestação de parasitas. E única coisa que mata parasita antidemocrático é oxigênio da participação popular”, disse.
“Teremos de impedir que isto se consolide através de um processo que se chama participação, mobilização, debate, luta e organização”
Em sua avaliação, o golpe começou devido às quatro derrotas consecutivas dos opositores ao PT nas eleições presidenciais – a primeira, em 2002, quando Luiz Inácio Lula da Silva foi escolhido; a segunda, em sua reeleição; a terceira, quando ela foi eleita presidenta; e, a quarta, quando foi reeleita. “Aí entornou o caldo para eles”, disse.
“Numa eleição presidencial, a gente discutiu as principais pautas que o país tinha de enfrentar. Foi baseado nesta discussão que a eleição propicia, e que atinge todos os cantos do país, que eu me elegi presidenta”.
Dilma lamentou a situação em uma presidenta precisa se defender diante dos senadores sem ter cometido qualquer crime e afirmou que o “golpe deixa marcas profundas, pois uma ruptura democrática ocorreu”.
“Estão tentando substituir 100 milhões de pessoas que votam nas eleições por 81 senadores. Em uma eleição direta, todos nós discutimos o programa. Em uma eleição direta, só 81 senadores”
A presidenta criticou medidas que retrocedem nas políticas implementadas durante os 13 anos dos governos do PT e lembrou que os eleitores votaram a favor de uma política de valorização do salário mínimo, a favor do ProUni, do FIES, da política de cotas para negros, pobres e alunos de escolas públicas tivessem acesso ao Ensino Superior. “Votamos também a favor do Bolsa família, do Mais Médicos”.
Condenou a PEC 241, que propõe congelar os gastos da educação e da saúde por 20 anos. “Em termos reais, congela hoje e dura por 120 anos. Significa a redução do gasto de saúde por cada brasileiro, por cada brasileira e para educação no nosso país daqui para frente”. “É um golpe grandão”, avalia.
Sem citar nomes, falou de quem tentou comprar voto do chanceler do Uruguai. Fazia referência ao ministro golpista das Relações Exteriores, José Serra, que tentou comprar voto de seu par no país vizinho, com objetivo de boicotar a Venezuela.
“Estamos vendo que este processo tem respaldo de setores que nós consideramos a elite conservadora deste país. Sabemos também que houve uma participação da mídia, de segmentos da mídia, oportunistas e oligopolistas. Isto ficou muito claro para a imprensa internacional“.
A presidenta agradeceu o apoio que recebeu de milhares de mulheres em todo o País durante seu afastamento: “As mulheres têm me prestado um grande apoio. É mais do que qualquer coisa. É um símbolo. Sei que serei a primeira de muitas mulheres presidentas deste país”, afirmou. E agradeceu: “Quando, em ato de extrema mesquinharia, retiraram as rosas do Palácio da Alvorada, eu recebi rosas dessas mulheres. Nunca esteve tão florido”. “Quando falam que eu tenho capacidade de resistir… É porque eu tenho que honrar as mulheres do meu país”.
Foto: Roberto Stuckert Filho