O plenário da Câmara aprovou na noite desta quarta-feira (26) o projeto de lei (PL 6229/05), que reformula a Lei de Falências com a possibilidade de financiamento na fase de recuperação judicial, o parcelamento de dívidas tributárias federais e a apresentação de plano de recuperação por credores. O líder do PT, deputado Enio Verri (PT-PR), defendeu emendas da bancada e da Oposição que visavam a proteção de emprego. “É lamentável a rejeição de destaques que tinha como objetivo manter direitos dos trabalhadores em caso de recuperação judicial. É justo proteger as empresas, mas é justo também que os trabalhadores sejam protegidos”, argumentou.
Enio Verri explicou que um dos destaque do PT era bem simples e tratava da sucessão das obrigações trabalhistas. “Se a empresa entra em recuperação judicial e se o administrador da recuperação judicial vende um direito ou parte da empresa, tem que estar caracterizada a sucessão das obrigações trabalhistas. Se não for assim, o que ocorre? Há o risco de a pessoa comprar a empresa que está em recuperação e não garantir, ao levar os servidores, a continuidade dos direitos trabalhistas”, alertou.
O líder reconheceu que o texto faz uma boa análise, monta uma boa proposta de recuperação judicial, mas ignora a importância da sucessão nos direitos dos trabalhadores. “Por isso, nós fizemos o destaque para garantir que, na medida em que aquele que comprar direitos da empresa ou comprar a própria empresa garante, naturalmente — e entendo que seja naturalmente, porque se trata de direitos trabalhistas —, a sucessão dos direitos trabalhistas e, consequentemente, o passivo trabalhista que possa existir naquele momento”, argumentou. A emenda, no entanto, foi rejeitada.
Em tom de desabafo, Enio Verri citou como exemplo o caso de, em recuperação judicial, uma pessoa comprar um carro. O deputado afirmou que essa pessoa levará junto a conta do IPVA. “Agora, quando ele contrata um trabalhador, ele não leva a conta do trabalhador. A mercadoria vale mais mesmo! Isso é injusto!”, protestou.
Obrigações trabalhistas
O líder do PT também defendeu a manutenção das obrigações trabalhista explicando que, se uma empresa está em recuperação judicial e vende um caminhão. Aquele que compra o caminhão não fica isento de pagar o IPVA atrasado. “Agora, se uma pessoa compra uma parte da empresa, os trabalhadores não vão receber seus direitos? O IPVA é pago, e o salário do trabalhador não é pago? Não é justo”, enfatizou Enio Verri, na defesa do destaque do partido para garantir que as obrigações trabalhistas não sejam extintas, independentemente da situação da empresa.
“Há um equívoco quando se prioriza a recuperação da empresa, esquecendo que a empresa só vai se recuperar se ela tiver trabalhadores e trabalhadoras para movimentar a máquina, para fazer essa produção do excedente. Por isso, o nosso destaque é para que, maneira nenhuma, sejam extintos os direitos trabalhistas implícitos, dentro da lei, lógico, no período, indiferentemente se for o caso de recuperação judicial ou não”, reforçou o líder do PT. O destaque, no entanto, também foi rejeitado.
O deputado Afonso Florence (PT-BA) também defendeu destaque da Oposição que pretendia salvaguarda os direitos trabalhistas. “É um erro num período de pandemia não prever a prioridade para os direitos trabalhista”, lamentou.
Texto aprovado
O texto aprovado que segue para análise do Senado é o substitutivo do relator, deputado Hugo Leal (PSD-RJ). Pela proposta, se autorizado pelo juiz, o devedor em recuperação judicial poderá fazer contratos de financiamento, inclusive com seus bens pessoais em garantia, para tentar salvar a empresa da falência.
Define ainda que se a falência for decretada antes da liberação de todo o dinheiro do financiamento, o contrato será rescindido sem multas ou encargos. Esse financiamento poderá ser garantido com bens da empresa, como maquinários e prédios, por meio de alienação fiduciária ou mesmo na forma de garantia secundária. Se houver sobra de dinheiro na venda do bem, ela será usada para pagar o financiador.
E, ainda que credores recorram da autorização de financiamento e ganhem o recurso, os valores adiantados pelo financiador e as garantias ficam de fora do rateio da massa falida entre os demais credores, sendo pagos por fora (extraconcursal).
Créditos trabalhistas
Ao contrário da proibição atual de incluir créditos trabalhistas ou por acidente de trabalho na recuperação extrajudicial, o substitutivo aprovado permite sua inclusão se houver negociação coletiva com o sindicato da respectiva categoria profissional.
O projeto amplia também a possibilidade de parcelamento de dívidas com a União para a empresa que tiver pedido ou aprovada a recuperação judicial. O texto aumenta o número de prestações (de 84 para 120 parcelas) e diminui o valor de cada uma. E é criada ainda outra opção, com a quitação de até 30% da dívida consolidada e o parcelamento do restante em até 84 parcelas.
Para pagar essa entrada, a empresa poderá usar 25% do prejuízo fiscal e 9%, 17% ou 25%, conforme o tipo de empresa, da base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Condições para parcelamento
Como condições para aderir ao parcelamento, o devedor assinará termo de compromisso pelo qual fornecerá ao Fisco informações bancárias e de comprometimento de valores a receber, além de direcionar ao pagamento da dívida até 30% do produto da venda de bens realizada durante o período de vigência da recuperação judicial. Caso a empresa deixe de pagar parcelas, se for constatado esvaziamento patrimonial para fraudar o parcelamento ou as condições sejam descumpridas, o parcelamento será cancelado e o débito total exigido.
Uma segunda modalidade de parcelamento é em até 24 meses e inclui débitos atualmente proibidos de parcelar, como aqueles de tributos com retenção na fonte ou de terceiros (imposto de renda do empregado, por exemplo) e o IOF. As microempresas e as pequenas empresas contarão com prazos 20% maiores (cerca de 29 meses).
O relator incluiu ainda a previsão de uso da chamada transação tributária, prevista na Lei 13.988/20. Nessa modalidade, o governo ou o devedor propõe descontos para quitar a dívida. No texto do projeto, o prazo máximo de quitação será de 120 meses.
Para pessoas físicas, micro e pequenas empresas, o prazo pode chegar a 145 meses e o desconto máximo a 70% do devido. Se a empresa desenvolve projetos sociais, o prazo pode ser aumentado em 12 meses, nos termos do regulamento da lei.
A maior parte das mudanças feitas pelo projeto poderá ser aplicada aos processos em andamento.
Vânia Rodrigues, com Agência Câmara