A iniciativa dos parlamentares petistas para barrar junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) a privatização da Eletrobras é mais uma batalha na luta contra esse ataque à soberania nacional promovido desde Michel Temer e mantido por Jair Bolsonaro. O PT defende a realização de um referendo para a população brasileira deliberar sobre o assunto. A consulta é tema de um projeto de decreto legislativo protocolado pela presidenta nacional do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), no ano passado.
“A Eletrobras vale cerca de R$ 370 bilhões, além do valor de sua marca no mercado, e o governo quer arrecadar apenas R$ 25 bilhões com a sua venda”, denunciou a presidenta do PT ao apresentar a proposta. “Sem obrigação de investir e com possibilidade de obter altíssimos dividendos vendendo energia mais cara, o resultado será o enriquecimento dos acionistas e a diminuição dos investimentos na segurança energética, o que elevará o risco de apagões no país, como vimos acontecer no Amapá.”
Dois meses após 20 dias sem energia em 2020, o Amapá voltou a ficar sem luz em janeiro de 2021. A empresa privada Gemini Energy, que ganhou concessão pública para distribuir a energia na região, deixou de operar na manutenção, o que causou um incêndio em uma subestação. A energia só foi retomada de fato com ajuda pública. O episódio tornou-se um dos inúmeros argumentos contrários à entrega do Sistema Eletrobras a operadores privados.
Em julho do ano passado, após Bolsonaro assinar a lei 14.182/2021, que autoriza a privatização da Eletrobras, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) emitiu nota reforçando o alerta para os danos do entreguismo bolsonarista. “O povo trabalhador será a grande vítima dessa iniciativa do atual governo”, afirma o movimento.
As consequências da privatização
A nota do movimento destaca sete consequências da lei que autoriza a privatização, veja abaixo.
Tarifaço nacional na conta de luz: a privatização causará um aumento médio na conta de luz do povo acima de 25%. Conforme a Associação de Engenheiros e Técnicos da Eletrobras (Aesel), a conta deve encarecer em pelo menos 14% nos próximos três anos.
Desindustrialização e desemprego: o aumento dos custos de energia elétrica aumentará a crise na economia, levará à falência milhares de pequenas e médias empresas e causará desemprego em massa.
Destruição da soberania nacional: A privatização entregará 125 usinas de geração de energia, 71 mil quilômetros de linhas de transmissão e 335 subestações para bancos privados e fundos especulativos internacionais. A energia elétrica de nosso país ficará sob domínio completo do capital financeiro, que só tem interesse em especular, saquear e explorar ao máximo nossos recursos.
Aumento de apagões: a privatização causará queda na qualidade dos serviços de energia e levará o país ao caos futuro com aumento de apagões.
Privatização da água: a estratégia de privatização da água que está em curso irá beneficiar o novo proprietário da Eletrobras, que tende a estabelecer o monopólio do mercado mundial da água. As extraordinárias reservas de água e mananciais naturais da Amazônia estão entre os principais interesses das transnacionais que querem controlar a Eletrobras.
Destruição ambiental: ao se privatizar o setor elétrico, crescerá o número de crimes socioambientais, como Mariana (MG) e Brumadinho (MG), causados por uma companhia privatizada.
Violação dos direitos dos atingidos: as empresas privadas não aceitam reparar os direitos dos atingidos por barragens em suas obras. Por isso, a privatização leva ao aumento das injustiças e violações de direitos dos atingidos e trabalhadores do setor.
Dados publicados no estudo ‘Questionamentos à inserção de termelétricas a gás natural na Medida Provisória 1.031/2021’, do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA), também revelam que, privatizadas Eletrobras e subsidiárias, as emissões de gases de efeito estufa (GEE) anuais levarão a um aumento de 24,6% em relação às emissões do setor elétrico, e de 45% em relação às emissões do parque de termelétricas a gás natural verificadas em 2019.
“Ao propor uma reserva de mercado para usinas termelétricas, a lei poderá levar a um impacto indesejável na competitividade dos leilões de energia elétrica, elevando os custos do sistema elétrico. Além disso, aponta no sentido contrário ao da descarbonização da matriz elétrica”, afirma André Luís Ferreira, diretor do Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA).
O PT no Senado também produziu o informativo ‘Argumento’ (leia aqui) para apoiar o debate, trazendo um panorama da empresa, as lacunas e contradições da proposta do desgoverno Bolsonaro.
Maiores países mantêm empresas públicas ou reestatizaram o sistema
Ano passado, o presidente da Argentina, Alberto Fernández, revogou as privatizações de empresas de energia e centrais térmicas promovidas pelo antecessor, Mauricio Macri (2015-2019). Considerado um gesto de afirmação da soberania nacional, no momento em que o país se debate com a dívida milionária (US$ 200 bilhões) contraída em quatro anos de governo Macri, o Decreto de Necessidade e Urgência (DNU) 389/2021 foi assinado em 16 de junho por Fernández e grande parte do gabinete.
Ao recuperar para o Estado o controle sobre o sistema elétrico argentino, Fernández agiu em conformidade com a maioria dos países desenvolvidos. Mesmo na Grã-Bretanha, modelo de mercantilização dos serviços públicos desde Margaret Tatcher, uma pesquisa realizada há três anos por Matthew Elliott e James Kanagasooriam constatou que 83% da população é a favor da nacionalização da água e 77%, da eletricidade e do gás.
Em todo o mundo, já houve 374 reestatizações do setor, principalmente em países desenvolvidos. Onde predomina a geração hidrelétrica, como no Brasil, a participação do setor público é majoritária, pois o setor de Transmissão é considerado estratégico e, por isso, deve ser controlado por empresas públicas. Nos Estados Unidos, por exemplo, 75% da capacidade hidrelétrica do país é controlada pelo governo, com participação inclusive das Forças Armadas. Na Índia, o controle passa de 90%.
“A tentativa de privatização é um autêntico jogo de cartas marcadas e dados viciados”, denuncia o Coletivo Nacional dos Eletricitários (CNE). “Agentes públicos, nomeados para defender os interesses da União, defendem vergonhosamente interesses privados, enviesados, encomendados.” Para os eletricitários, “os jagunços do capital querem privatizar a Eletrobras no apagar das luzes, no fim de feira de um governo que já acabou.”
Para barrar a privatização e defender os direitos dos trabalhadores, eletricitários anunciaram uma greve da categoria em 17 de janeiro, com Furnas, CEPEL e Eletrobras. Uma semana depois, o movimento foi seguido pelas demais empresas do grupo: CGT Eletrosul, Chesf e Eletronorte.
Promovida por diversas organizações, a campanha ‘Salve a Energia – pelo futuro do Brasil’ afirma que “o governo acelera os processos e atropela todas as instâncias de fiscalização e controle para entregar a empresa o mais rápido possível ao mercado especulativo”.
PT Nacional