Vítima da desigualdade social e da perda de direitos ocorrida nos últimos anos, e ainda sofrendo com os efeitos da pandemia do novo coronavírus, a população negra brasileira nada tem a comemorar neste dia 13 de Maio, data oficial da “Abolição da Escravatura”. Essas são as opiniões da deputada Benedita da Silva (PT-RJ) e dos deputados Valmir Assunção (PT-SP) e Vicentinho (PT-SP), ao avaliarem a situação atual da população negra do País. Segundo eles, essa é justamente a parcela dos brasileiros que mais tem sofrido com a crise social e a pandemia que assola o País.
Ao avaliar o processo histórico de exclusão social da população negra, desde a “Abolição da Escravatura” pela Princesa Isabel em 1888, Benedita da Silva lembra que esse gesto não foi suficiente para reverter esse cenário. “Deixaram o povo negro livre, mas sem condições decentes de sobrevivência, e isso se perpetuou ao longo do tempo no País”, lamenta.
Sobre o resgaste dessa dívida social, Benedita lembrou que apenas no curto período de 13 anos dos governos Lula e Dilma houve disposição política para tentar reverter esse quadro. “Tivemos um breve período de conquistas durante os 13 anos dos governos Lula e Dilma, na qual a população negra foi a mais beneficiada com a adoção de políticas sociais como o Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, geração de emprego e renda, adoção da política de cotas na educação, além das medidas de combate ao racismo e à discriminação. Isso sem falar em muitas comunidades pobres que pela primeira vez tiveram acesso à agua e à luz, e que saíram do Mapa da Fome”, destaca.
Na mesma linha, o deputado Valmir Assunção destacou que os avanços obtidos nos governos de Lula e Dilma foram os mais visíveis na luta pela igualdade racial e social no País desde a Abolição oficial da Escravidão. “O movimento negro não costuma comemorar o 13 de Maio. As conquistas do povo negro não são oriundas de uma caneta, mas de muita luta. Foi por muita luta que conseguimos as políticas de cotas, atendidas nos governos do PT; também foi nos governos petistas que comunidades remanescentes de quilombos ganharam respeito. Mas ainda falta muito a fazer!”, aponta.
Resquícios da Escravidão no Brasil
Para o deputado Vicentinho, apesar dos avanços obtidos com a inserção do negro na sociedade, fruto de muita luta e não de benesses governamentais, ainda é possível observar alguns resquícios da época da escravidão no País. De acordo com o parlamentar, isso pode ser mais claramente observado com a exclusão do negro em certas posições na sociedade.
“Algumas pessoas ainda torcem o nariz ou se assustam quando veem um negro parlamentar, juiz, advogado ou prefeito. Pensam que um negro não pode ter uma posição de destaque na sociedade. Esse é um resquício da época da escravidão que, infelizmente, ainda existe principalmente por parte da elite, que por sua vez também influencia parte da classe média e até dos pobres. E a prova disso é que é muito raro ver um general ou militar de alta patente negro, um grande fazendeiro ou um alto executivo de uma grande empresa nacional ou multinacional. O mesmo podemos observar em relação aos salários, que para os negros, e principalmente as negras, são quase sempre mais baixos”, observou.
Apesar de lembrar dos avanços obtidos nos governos petistas, a deputada Benedita da Silva lamenta que desde o golpe de 2016 grande parte dessas conquistas vem sendo destruída. “Todas essas conquistas, que beneficiaram diretamente a população negra, foram se perdendo desde o golpe de 2016, com a perda de direitos com a Reforma Trabalhista, que aumentou o trabalho informal e a terceirização, além da redução de programas sociais”, critica.
População negra mais afetada pela Covid-19
Sobre a atual pandemia, os parlamentares petistas observaram que os casos de hospitalização e de mortes por conta do novo coronavírus escancarou as desigualdades raciais e sociais existente no País. “A Pandemia nos mostra que as desigualdades incidem sobre os mais pobres. Eles que morrem, consequentemente estamos falando da população negra deste País! É fundamental que tenhamos essa nitidez para que possamos combater com eficiência o coronavírus”, ressalta Valmir Assunção.
Sobre este assunto, a deputada Benedita lembra que ela própria enfrentou recentemente a perda de uma irmã e de um sobrinho vítimas da Covid-19, no Rio de Janeiro. Segundo ela, o descaso com a população, principalmente a negra, é visível nas comunidades mais pobres do País, onde a maioria do povo negro tenta escapar do contágio pelo vírus.
“Agora que a pandemia chegou, pegou justamente a população negra no momento em que está mais vulnerável, até mesmo para enfrentar o coronavírus. E para piorar temos um presidente que ainda estimula as pessoas a saírem de casa, ao invés de assegurar que a população mais pobre, de maioria negra, e que está sem emprego, possa ter condições de ficar em isolamento para evitar se contaminar”, argumenta a parlamentar.
Segundo dados da Agência Pública, baseado em boletins epidemiológicos o Ministério da Saúde publicados até dia 26 de abril, do dia 11 de abril até esta data a quantidade de pessoas negras que morreram de Covid-19 no Brasil quintuplicou. No mesmo período, o número de brasileiros negros hospitalizados pela Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), causada pelo coronavírus, aumentou em 5,5 vezes.
Na comparação, o aumento das mortes de pessoas brancas foi bem menor. Nas duas semanas analisadas, o crescimento entre brancos foi pouco mais que o triplo. Já o número de brancos hospitalizados aumentou praticamente na mesma proporção.
Segundo reportagem publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, em 4 de maio, dados do boletim epidemiológico da prefeitura de São Paulo do dia 30 de abril apontavam que o risco de morte por Covid-19 ente negros era 62% maior do que entre brancos. Especialistas ouvidos na matéria afirmaram que questões socioeconômicas, como saneamento básico, insegurança alimentar e dificuldade de acesso à assistência médica aumentam o risco de adoecer o morrer.
De acordo com a Agência Pública, na capital carioca os bairros com maior concentração de negros têm mais mortes por coronavírus, em números absolutos, do que em bairros com menor população negra. Atualmente, Campo Grande (com 50% de negros) é o bairro com maior número de mortes, seguido de Copacabana, que antes ocupava a primeira posição. Em 3º e 4º lugar em mortes por coronavírus se encontram Bangu e Realengo, bairros com maioria de população negra.
.Fora do Eixo Rio-São Paulo também é possível observar que a desigualdade racial e social também potencializa os efeitos da Covid-19 sobre a população negra. De acordo com a Agência Pública, o estado do Amazonas – o primeiro a ter lotação máxima de unidades de terapia intensiva para pacientes com Covid-19 – também tem registrado um aumento mais expressivo de mortes entre negros do que entre brancos. Mais de 13 negros morreram para cada falecimento de branco.
A secretaria de saúde do estado já registrou cerca de 850 doentes negros em situação grave e mais de 340 mortes. Já entre brancos, foram 81 casos graves e 25 mortes. Os dados de raça e cor foram atualizados em 29 de abril.
Héber Carvalho