A vacância de 30% do total de vagas do Mais Médicos revela que a descontinuidade do programa foi a atitude política mais desastrosa que o futuro presidente Jair Bolsonaro protagonizou antes de assumir o governo. Ao contrário do que ele prometeu, muitas comunidades que ficaram sem atendimento após a saída dos profissionais cubanos continuam sem médicos até este momento. Os locais mais afetados são aqueles de difícil acesso ou com pouca infraestrutura, como os distritos sanitários indígenas.
Segundo o Ministério da Saúde, dos 8.411 médicos brasileiros inscritos no edital para substituir os médicos cubanos, 2.520 não se apresentaram nem começaram a atender até a última sexta-feira (14), quando acabou o prazo para que eles iniciassem o trabalho. Afora isso, o órgão divulgou que outras 106 vagas do edital sequer despertaram o interesse dos brasileiros, ficando completamente ociosas.
“Já sabíamos que isso não iria dar certo. Esse resultado já era esperado. Quando o Mais Médicos foi idealizado, o objetivo de fazer esse convênio com Cuba era justamente preencher essas vagas em lugares distantes e que não interessam os médicos brasileiros”, avalia o deputado e médico Ságuas Moraes (PT-MT). O parlamentar explica que a ocupação dessas vagas exclusivamente por médicos brasileiros ainda é uma realidade inatingível no País.
Ele afirma que isso só seria possível com a adoção de algumas medidas. “Criar, por exemplo, uma carreira profissional médica nacional, para que esses médicos possam se fixar nessas regiões. Ou então estabelecer o serviço civil obrigatório. Depois da formação em universidades públicas, eles seriam obrigados a prestar um ano ou dois anos de serviço numa região isolada. Sem isso e em condições normais, não tem como colocar médico nessas regiões distantes”, argumenta o deputado.
Adiamento – Como 30% dos médicos brasileiros inscritos não se apresentaram até a última sexta-feira, o Ministério da Saúde decidiu adiar para esta terça-feira (18) o prazo final. Vale lembrar que todo esse transtorno atual, que prejudica sobretudo populações mais pobres e socialmente vulneráveis, foi gerado a partir de declarações injustificadas e inconsequentes do futuro presidente Bolsonaro. Ao anunciar que faria exigências aos médicos cubanos, ele na prática quebrou o acordo bilateral entre Brasil e Cuba, que foi viabilizado por meio da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).
Com isso, os médicos cubanos, que representavam quase metade dos profissionais do Mais Médicos, voltaram ao seu País de origem. Estima-se que cerca de 30 milhões de brasileiros ficaram sem atendimento médico do dia para noite. Criado em 2013 pela presidenta Dilma Rousseff, o programa levou assistência básica em saúde aos quatro cantos do País. Atualmente, o programa conta com 18.240 vagas em mais de 4 mil municípios e 34 distritos sanitários indígenas, com uma demanda para assistir a cerca de 63 milhões de brasileiros.
A crise gerada por Bolsonaro na saúde brasileira revela que ele põe suas questões ideológicas acima do bem-estar da população, já que seu objetivo fim era tão somente perseguir os cubanos. Isso porque, pelas regras do programa Mais Médicos, todos os cubanos ou médicos de qualquer outra nacionalidade só podiam se candidatar a vagas previamente recusadas por brasileiros. Esse fato elimina por completo o argumento equivocado, segundo o qual os cubanos estariam tirando vagas de trabalho de brasileiros.
Quem detalha essa situação é o deputado e médico Jorge Solla (PT-BA): “É preciso recordar e deixar claro que desde o primeiro edital do Mais Médicos, a convocação para todas as vagas sempre foi feita primeiro para os médicos brasileiros. Depois eram chamados os estrangeiros individuais e, só depois, os cooperados cubanos. Eles só eram chamados para as vagas que não foram ocupadas por falta de candidatos nas primeiras chamadas”.
Solla explica ainda que a ideia do Mais Médicos, quando concebido, não era apenas dar uma solução emergencial ao problema da escassez de médicos no Brasil, mas garantir uma solução definitiva, com o incremento de novas vagas tanto para a formação como para residência médica. “Ao longo dos cinco anos do programa, os médicos brasileiros recém-formados foram ocupando os postos que antes não havia procura, como havia sido nossa expectativa. Infelizmente, o que estamos vendo agora é que ainda estávamos distantes de prescindir desta cooperação com os cubanos”, lamenta.
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