O diálogo sobre a mobilidade urbana é a saída para o conflito e o caminho para o futuro

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As manifestações contra o aumento das tarifas de transportes públicos refletem um quadro muito mais complexo que o debate sobre custos e subsídio das passagens. O transporte público é parte de uma questão muito mais ampla, que é o papel do deslocamento nas grandes metrópoles do nosso pais. E tem a ver com a própria conformação dessas zonas de concentração populacional, que incharam em algumas décadas. A atitude irresponsável da Polícia Militar, que parecia nesta quinta estar agindo com desejo de confronto, amplificou o impacto das manifestações e indignou quem acredita nas liberdades democráticas.

As cidades cresceram sem planejamento, sob o domínio da especulação imobiliária e a reboque dos ciclos de industrialização e desindustrialização dessas cidades. A população mais pobre sempre foi deslocada para as periferias, premida pelo custo ascendente dos imóveis.

Nos últimos anos, com os governos petistas, as estatísticas mostram que a renda dos mais pobres cresceu cinco vezes mais do que a renda dos mais ricos. Mas o custo de metro quadrado nas regiões metropolitanas cresceu muito mais rápido. O setor público nunca teve força política ou vontade para intervir no mercado de terrenos urbanos. Esse ficou efetivamente desregulamentado, salvo tentativas esparsas de zoneamento e progressividade do IPTU.

Com o povo morando longe do trabalho, da escola e dos serviços públicos, é grande a demanda por mobilidade. É um fato: mais gente estuda e trabalha, multiplicando as viagens e consequentemente superlotando um sistema ineficaz, esquecido pelos governos passados e recentes. Chega a ser sarcástica a forma como o PSDB trata o transporte público em São Paulo, especialmente em suas propagandas partidárias e eleitorais. Propaganda enganosa.

A ampliação do metrô é lenta e cara, a viabilização de corredores ameniza, mas não resolve, e o PT sabe disso. O rodízio já esgotou seu papel. O espaço urbano é pouco para tantos veículos, particulares ou coletivos. Desfazer o absurdo construído pela especulação imobiliária é impossível. No máximo, podemos evitar que esse mal prossiga e induzir a reocupação diversificada de regiões de decadência industrial/comercial convertidas para residencial.

Em São Paulo, e em outras cidades, é hora de democratizar este assunto. A sociedade deve debater qual a tendência para os próximos anos/décadas, quais as alternativas, custo dos investimentos e manutenção, e o governo municipal petista tem que ir às ruas de ouvidos abertos. Por exemplo, quem defende a tarifa zero, que é uma proposta simpática e respeitável, deve dizer se esse custo sairá da redução brutal de investimentos ou de um aumento de tributos. Quem defende o pedágio urbano, deve explicar a proposta. Quem defende a restrição ao transporte individual nos horários críticos, deve detalhar como operacionalizar a fiscalização e como ampliar a oferta de transporte coletivo.

Esse é um desafio inadiável, urgente. E uma boa forma dos governantes reagirem diante das manifestações, além de repudiar a violência, é abrir o debate. Uma Conferência Democrática sobre a Mobilidade Urbana seria um marco. A participação de vereadores, deputados, membros dos governos, líderes dos movimentos que manifestaram pelo passe livre, sindicalistas, empresários, estudiosos e outros atores sociais seria um exercício pleno do que há de mais valoroso na democracia: o debate público, justo e transparente.

Ricardo Berzoini – deputado federal pelo PT São Paulo

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