O capitalismo precisa de reformas – Jesus Rodrigues

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Foto: Gustavo Bezerra
 
Essa constatação tem sido cada vez mais frequente nas rodas dos grandes afortunados mundiais e também no meio acadêmico. Bilionários como Bill Gates e Warren Buffett já assumiram compromissos de disponibilizar parte de suas fortunas para funções sociais.
 
Vários grupos de grandes empresários criaram organizações do tipo Sistema B, Capitalismo Consciente ou Time B, para buscar um plano alternativo para correções de rumos no capitalismo. No meio acadêmico, a polêmica está em voga com o lançamento do livro “O Capital no Século XXI”, do economista francês Thomas Piketty, que derrubou a tese até então aceita, do Nobel de economia Simon Kuznets, de que o desenvolvimento, por si só, reduziria a desigualdade de renda. No centro da questão, o aumento das desigualdades ocasionado pela crescente e progressiva concentração da riqueza. O assunto foi capa da Revista Exame, de 11.06.2014, da qual trago pontos para fazer o debate nesse período eleitoral.
 
O economista francês Thomas Piketti, após analisar dados econômicos de mais de cem anos de vários países, chegou a uma conclusão tão simples quanto óbvia, embora ainda contestada por alguns estudiosos, qual seja, r > g – onde “r” representa a taxa média anual de retorno obtido pelo capital (ou seja, lucros, dividendos, juros e renda de imóveis) e “g” a taxa de crescimento econômico das economias analisadas (Revista Piauí 92, de Maio 2014). Enquanto “r” tem crescido entre 4 e 5%, “g” cresce em média 1 e 2%, daí as manifestações de preocupação dos 99% da população com a renda do 1% mais rico.
 
O FMI (Fundo Monetário Internacional) entra na discussão com muita cautela, mas constata com estudo realizado em 153 países que aquelas nações menos desiguais geram maior crescimento do PIB, consequentemente, as nações com grande desigualdade têm um crescimento menor. Essa é mais uma comprovação de que a concentração de renda não separa apenas as pessoas dentro de um mesmo país, mas também separa países.
 
Nesse contexto de autoquestionamento do capitalismo, precisamos tratar de dois conceitos-chave: igualdade de oportunidades e meritocracia. O que vemos nos países mais desiguais, além do prejuízo no crescimento do PIB como falamos anteriormente, é que os filhos de famílias ricas têm mais oportunidades de conquistarem as vagas dos melhores cursos de medicina, engenharia ou direito e também conquistarem os melhores empregos disponíveis no mercado. Dessa forma, a meritocracia não passa de uma despista.
 
Meritocracia é coisa séria e merece ser valorizada sempre, mas deve vir junto com a igualdade de oportunidades. Se um país não consegue propiciar que todos os seus filhos tenham as mesmas condições de disputarem os melhores espaços na sociedade, como ocorria nos Estados Unidos, país símbolo do capitalismo, que alardeava ser a nação “aqui você realiza seu sonho”, mas que vem concentrando riqueza entre os mais ricos, tanto que hoje é mais fácil tornar realidade o sonho americano lá na Dinamarca, pois “quem nasce na base da pirâmide social nos USA tem 40% de chance de ficar por lá, enquanto na Dinamarca essa chance cai para 25%”, segundo a revista Exame, de 11.06.2014.
 
No campo oposto, podemos tratar daqueles que não conseguem ascensão social ou que teriam chances mínimas ou lotéricas de vencer na vida. Quando esse contingente cresce muito e percebe que está participando de um jogo de cartas marcadas ou mesmo se sente fora do jogo, o tecido social tem maior possibilidade de romper. Um novo jogo, com outras regras, será criado à margem da sociedade, daí a necessidade de “urgenciar” mudanças estruturantes importantes.
 
Da mesma forma que praticamente se constrói um consenso de que o capitalismo precisa de reformas, também é consenso que nenhum outro sistema econômico foi capaz de gerar tanta riqueza. Não há quem duvide, pois nos últimos trinta anos a população mundial cresceu 50% e o número de pobres recuou de 2,6 bilhões em 1981 para 2,5 bilhões de pessoas em 2012. Em 1981 a população mundial era de 4,5 bilhões, os pobres representavam naquele ano expressivos 57,7% da população mundial. Em 2012 o mundo tinha 7 bilhões de pessoas e os pobres representavam 35,7%. Na verdade houve uma redução proporcional expressiva de 57,7% para 35,7%. Entretanto, a questão central é que a riqueza vem crescendo muito, porém, se concentrando. Esses dois fenômenos ocorrem na China, isto é, o governo chinês é o maior responsável pela redução mundial no número de pobres, mas reconhece que a riqueza vem se concentrando no seu próprio país após a adoção da economia de mercado. Em suma, todos pelo mundo a fora estão melhorando sua renda, porém, os mais ricos estão melhorando mais rapidamente.
 
Esta tem sido a regra no mundo capitalista e das grandes economias: ampliar e concentrar riqueza simultaneamente. Por exemplo, o 1% mais rico dos Estados Unidos absorve quase 50% dos ganhos de renda daquele país. Mas nem tudo está perdido. Desde o início dos anos 90 ao final dos anos 2000, México, Indonésia e Brasil conseguiram melhorar a distribuição de renda. Nesse quesito, o Brasil vem passando de ano com louvores, inclusive reconhecido pela ONU no atingimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (metas estabelecidas para o mundo todo), pois não só conseguiu reduzir a pobreza como fez também distribuição de renda. No Brasil, em 2001, o coeficiente de GINI, que mede a desigualdade de renda, registrou 0,553 (onde zero é a igualdade para todos e 1 seria a concentração máxima). Em 2012 o coeficiente de GINI foi 0,500. Quanto à renda per capita, tínhamos R$ 17.295 em 2001 e R$ 22.349 em 2012. Em nosso país, nos dez anos entre 2001 e 2011, os 10% mais pobres do Brasil tiveram um crescimento de renda acumulado de 91,2%, enquanto a parcela mais rica da população obteve nesse mesmo período um incremento de 16,6% da renda acumulada. Portanto, a variação do aumento de ganhos reais foi 5,5 vezes (550%) mais rápida para o décimo mais vulnerável dos brasileiros (Comunicado do IPEA nº 155, de setembro de 2012). Não é tudo, mas é um avanço importante.
 
Por conta dos resultados que temos obtido é que venho fazer uma avaliação de que o Brasil, embora ainda seja um país extremamente injusto, vem fazendo as reformas que o capitalismo precisa (gostaria eu que fosse reformas no socialismo), entretanto, agora nessas eleições de 2014 vamos fazer a opção entre dar continuidade aos avanços sociais da última década ou dar um passo atrás para um capitalismo mais selvagem e mais concentrador. Espero que você tenha tido a paciência de ler o artigo até aqui e que o mesmo possa ajudá-lo na decisão de que rumo nós devemos seguir nos próximos quatro anos.
 
Jesus Rodrigues deputado federal (PT-PI)

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