Mortes pela covid-19 crescem 45% nos bairros pobres em uma semana

Nos 20 distritos mais ricos, crescimento das mortes por covid-19 foi de 36%, enquanto a média da cidade foi de 38% no mesmo período.

O crescimento do número de mortes causadas pelo contágio da covid-19 (suspeitas ou confirmadas) na capital paulista vem refletindo a desigualdade social de uma cidade que concentra 60% de suas unidades de terapia intensiva (UTI) em apenas três distritos. Na última semana, entre os dias 17 e 24 de abril, houve aumento de 45% nas mortes ocorridas nos 20 distritos mais pobres do município. Já nos 20 distritos mais ricos o aumento foi nove pontos percentuais menor: 36%. A média na cidade foi de 38%. Os dados obtidos pela RBA são da Secretaria Municipal da Saúde, e ainda não foram divulgados oficialmente.

Em números absolutos, a desigualdade nas mortes causadas pela covid-19 também é clara. Embora tenham um menor número de casos, os 20 distritos mais pobres saltaram de 474 mortes para 679, entre os dias 17 e 24. No mesmo período, os 20 distritos mais ricos tiveram aumento de 263 para 357 no número de mortes. Em toda a cidade, o número total de mortes subiu de 1.935, no dia 17, para 2.688, no dia 24.

Os distritos com o maior número de mortes por covid-19 seguem sendo Brasilândia, na zona norte, com 81, e Sapopemba, na zona leste, com 77. Ambos tiveram aumento em torno de 50%. Já o maior aumento percentual ocorreu no Jardim Helena, também na zona leste, com 120% – de 15 para 33 mortes em uma semana. Já o distrito do Morumbi, onde o primeiro caso foi confirmado, teve uma nova morte por covid-19 em uma semana, indo de sete para oito casos.

A zona leste também é a região com o maior número de mortes de covid-19 na cidade: 1.098 até o dia 24. Depois vem a zona norte, com 612, a zona sul, com 591, a zona oeste, com 210, e o centro, com 127.

‘Periferização’ das mortes

Para o ex-ministro da Saúde Arthur Chioro, a situação é extremamente preocupante, às vésperas do período em que se espera um aumento significativo nos casos. “É a efetiva ‘periferização’ das mortes de covid-19, revelando toda vulnerabilidade da nossa população e a gravidade do quadro. Na medida em que são pessoas que vivem com piores condições sanitárias, têm estrutura habitacional muito mais frágil para poder fazer o isolamento preventivo ou quando houver casos na própria família. Não têm condições, às vezes, de acesso a produtos de higiene, material de limpeza de roupas, poder separar talheres, roupas de cama, as vezes dormem na mesma cama e, portanto, potencializa o processo de disseminação da doença”.

O médico infectologista e diretor do Sindicato dos Médicos de São Paulo Gerson Salvador também considera que os dados das mortes por covid-19 evidenciam a desigualdade na capital paulista e expõe a falta de assistência à saúde nos bairros pobres.

“A gente está vendo o número de mortos crescendo desproporcionalmente nos bairros mais pobres. Isso reflete uma iniquidade de acesso à saúde. Nas regiões periféricas tem um contingente de pessoas que dependem unicamente do Sistema Único de Saúde. A gente sabe que outras doenças de transmissão respiratória, por exemplo a tuberculose, acometem de maneira desproporcional as pessoas que vivem na rua, em cortiços e em favelas. O risco de transmissão da covid-19 em pessoas que vivem nessas condições vai ser maior. A falta de assistência e as condições de vida acabam resultando num número desproporcional de mortes na população mais pobre”, disse.

Falta de leitos

A falta de leitos de UTI na periferia foi evidenciada por um levantamento da Rede Nossa São Paulo. Apenas três distritos – Sé, Vila Mariana e Pinheiros – concentram 60% dos leitos de UTI da cidade. Outros sete distritos – Parelheiros, Cidade Ademar e Campo Limpo, na zona sul; Anhanguera e Tremembé, na zona norte; Aricanduva, na zona leste; e Lapa, na zona oeste – não possuem nenhum leito de UTI, mesmo concentrando 20% da população da cidade (2,3 milhões de pessoas).

Outros 16 distritos têm de dois a oito leitos de UTI para cada 100 mil habitantes da região para enfrentar a pandemia de coronavírus. O ideal, segundo a Organização Mundial da Saúde é entre 10 e 30 leitos desse tipo, para cada cem mil habitantes. Os distritos de Parelheiros e Freguesia do Ó poderiam ter uma situação menos complicada, se os hospitais que tiveram a construção iniciada na gestão do ex-prefeito Fernando Haddad (PT), tivessem sido concluídos no prazo por seus sucessores, Doria e Covas.

O Hospital da Brasilândia, região que concentra o maior número de mortes, devia ter ficado pronto em 2017, situação em que teria 305 leitos. Com o atraso, o governo do prefeito Bruno Covas (PSDB) está acelerando obras para ativar 150 leitos de UTI no local, até o final deste mês. No entanto, a previsão do hospital é atender cerca de 2,2 milhões de pessoas na região. Já o Hospital de Parelheiros, que devia ter sido entregue em 2017, foi inaugurado em março de 2018, apenas com o Pronto Socorro em operação. A prefeitura também informou que está acelerando as ações na unidade para ativar 268 leitos de UTI para atender casos de coronavírus no local, até o início de maio.

Por Rede Brasil Atual

 

 

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