O deputado estadual Alencar Santana (PT-SP), recentemente eleito deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores, ressalta no texto abaixo as consequências, principalmente para as populações mais pobres do Brasil, da saída dos médicos cubanos do Programa Mais Médicos. O governo de Cuba decidiu, na semana passada, chamar de volta seus profissionais depois que Jair Bolsonaro divulgou que pretendia mudar pontos do acordo bilateral com o Brasil, quebrando, assim, o contrato firmado entre os dois países, com intermédio da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).
Leia a íntegra do texto:
O anúncio da saída de Cuba do Programa Mais Médicos é não somente uma questão de prejuízo ao programa, mas também uma tragédia anunciada, principalmente aos mais pobres.
Apesar das manifestações de ódio desde a chegado dos médicos cubanos ao Brasil, amplificadas agora pelas falas irresponsáveis do presidente eleito, esses homens e mulheres, que deixam de lado seu país e suas famílias para se dedicar ao trabalho humanitário, tinham um papel importantíssimo no atendimento da população mais pobre e historicamente desassistida do país.
Cabe aqui, ao menos, três ponderações:
1 – Não há no Brasil falta de médicos, segundo a recomendação da OMS, mas sim uma distribuição desigual geográfica regional e até mesmo urbana, uma vez que nossos médicos não se dispõem – por inúmeros razões estruturais e culturais – a trabalhar longe dos grandes centros ou mesmo nas periferias. Por isso, 50 milhões de brasileiros não tinha acesso a atendimento médico de atenção básica, e os cubanos, por sua formação e experiência em ambientes de extrema pobreza e até de guerra, aceitavam trabalhar e até mesmo morar nessas regiões.
2 – Durante os governos de Lula, o País teve não somente uma ampliação do número de vagas, mas também uma descentralização dos cursos de medicina, medidas que, somadas às políticas afirmativas, permitiram a formação de médicos em regiões carentes e mais habituados a lidar com a população pobre. No entanto, a formação de um médico é demorada (de 6 a 10 anos) e os profissionais de Cuba resolviam emergencialmente parte da demanda.
3 – A saída de Cuba do Mais Médicos demonstra a primeira crise de relações bilaterais entre os dois países, algo extremamente prejudicial ao Brasil. Cuba vive um processo de abertura que poderia significar um importante mercado aos produtos e às empresas brasileiras, além de ser um país de ponta na pesquisa de medicamentos para doenças como HIV e outras enfermidades ligadas à exclusão social e cultural.
Dessa forma, mesmo antes de ser uma realidade, o novo governo mostra falta de sensibilidade com nossa política externa, com os acordos de cooperação, com as oportunidades de negócio e, principalmente, com o atendimento médico de ao menos 26 milhões de pessoas que antes eram assistidas pelos médicos cubanos e hoje voltam à condição de jogadas à própria sorte.
Vamos cobrar que esse próximo governo tome medidas logo de início para garantir a demanda com médicos brasileiros e que abra mais faculdades públicas de medicina nos vários cantos do país, em especial garantindo acesso dos mais pobres a essas vagas.
Alencar Santana Braga