A criação da Secretaria da Promoção da Igualdade Racial, do Estatuto da Igualdade Racial, a inclusão do ensino da história africana nas escolas, o aumento do número de negros nas universidades e a diminuição da desigualdade social entre brancos e negros foram lembradas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na terça-feira (23) como avanços no reconhecimento dos negros e de sua história. Ele participou do Festival Latinidades, que acontece em Brasília.
O encontro começou com uma fala do rapper Gog, que falou sobre as conquistas e atuais lutas dos negros e conduziu todo o evento. “Tem gente que reclama dos aeroportos lotados, a gente reclama da violência contra os negros da periferia”, disse ele. Lula foi chamado ao palco ao som de um canto a Xangô, na voz da Yalorixá Railda, que conduziu o cortejo do Ilê Axé Oya Bagan.
A fala de Lula teve como tema “Desigualdades raciais e políticas públicas no seu governo e na sua atuação pós-governo”. Ele ressaltou o preconceito que enfrentou por ter proximidade com mães de santo e terreiros e ressaltou que fazia questão de dizer a todos: “A liberdade só é válida para você, se aceitar a liberdade dos outros. Não existe liberdade pela metade”.
O ex-presidente falou da invisibilidade dos problemas que a população negra vive e das ações que foram feitas na última década para enfrentar isso. “Quantas jornalistas negras estão cobrindo este evento?”, questionou. “Com o Prouni e o Reuni, isso logo vai mudar”, completou.
O aumento das relações do Brasil com a África também foi lembrado no discurso. Lula falou da emoção da sua visita à Ilha de Goré, quando esteve na porta do nunca mais, onde os escravos eram colocados em navios negreiros e tirados do continente. Ele também falou do aumento das relações comerciais com os países africanos e da importância da criação de novas embaixadas brasileiras no continente.
O ex-presidente abordou temas da política nacional e falou que resolveu voltar a deixar as unhas crescerem já que a presidente Dilma Rousseff é alvo de preconceito de conservadores. “Eu acho que a gente tem que dizer que a Dilma não é nada mais do que uma extensão da gente lá. Nós somos responsáveis pelos erros e acertos. Portanto, o que a gente percebe é que mais uma vez os setores conservadores começam a colocar as unhas do lado de fora e eu, que já estava cortando as minhas com os dentes, vou deixar a bichinha crescer”, afirmou arrancando aplausos da plateia.
Mais uma vez, Lula reafirmou sua atuação na vida política brasileira e defendeu o governo da presidenta Dilma. “Eu não fiz tudo que fiz na vida para agora achar que estou errado, estou mais motivado. Se alguém pensa que Lulinha está com 67 anos, pegou câncer e está velho, saiba que com pernambucano não acontece isso. Eu não tenho tempo para parar e não preciso ser governo para fazer as coisas nesse país. Vou continuar incomodando, falando e ajudando a companheira Dilma”, completou.
Questionado sobre a movimentação de setores que têm defendido que ele concorra as eleições Presidenciais do próximo ano, Lula afirmou que “não existe essa possibilidade”. “Eu, se pudesse, ia voltar a jogar bola, mas o Felipão acho que não está me olhando com bons olhos”.
Ele também negou eventuais divergências com a presidente. Segundo Lula, sua sucessora sofre mais preconceito do que ele no Planalto. “Tentaram fazer a Dilma diferente do Lula. Tentaram criar uma divisão entre nós. Ela deu um chega para lá. Depois tentaram sempre mostrar diferença, mas depois que viram que não tinham. Eles estão com preconceito contra Dilma maior do que o que tinham contra mim. É a maior falta de respeito a uma mulher da qualidade da Dilma Rousseff. Será que eles têm essa falta de respeito com a mãe deles, com a mulher deles, como têm com a Dilma?”, perguntou.
Lula saiu em defesa das propostas lançadas por Dilma em resposta às manifestações de junho e rebateu às críticas das classe médica contra o programa Mais Médicos, que prevê a importação de profissionais para atuar no interior e na periferia do país.
“É preciso melhorar a saúde, sim. Se os médicos brasileiros não querem trabalhar no sertão, que a gente traga médicos de fora. Ninguém quer tirar emprego de ninguém. Longe de mim tirar emprego de médico brasileiro, mas o que quero é dar emprego em lugar aonde não tem médico”, disse.
Ele exaltou a concessão de novos direitos trabalhistas aos trabalhadores domésticos. “Eu, na verdade, acho que nós só vamos ter um país justo quando a gente não tiver empregada doméstica”.
O ex-presidente não criticou a proposta defendida pelo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves e pelo vice-presidente Michel Temer para a redução de 14 dos 39 ministérios — ambos do PMDB, principal aliado do governo federal. “Estou vendo um zum-zum-zum na imprensa de que tem gente que vai pedir para a Dilma reduzir o número de ministérios. Fiquem espertos porque ninguém vai querer acabar com o Ministério da Fazenda nem com o da Defesa. Vão tentar mexer no Ministério da Igualdade Racial, no das Mulheres e no dos Direitos Humanos”, advertiu.
Lula se referiu à imprensa em tom crítico e voltou a dizer que era vítima de “maldade” e “preconceito”. O ex-presidente negou desgaste na relação de Dilma com o PT. “Eu não sei quem descobre umas divergências que não existem. Eu fui presidente da República e muitas vezes não pude ir a uma reunião do diretório do PT e nem por isso teve divergência. O PT apoia 150% a presidenta Dilma, se precisar 200%. Não há hipótese de ter divergência que não possa ser superada. Se tiver alguma coisa, será discutido entre o partido e a presidenta”, afirmou.
Lula disse ainda que o governo está atento, mas precisa fazer um esforço monstruoso sobre inflação. “A inflação é o mal a ser extirpado da política econômica brasileira. Tenho certeza que a presidenta Dilma pensa exatamente isso, o ministro Guido pensa exatamente isso. Temos que fazer um esforço monstruoso da sociedade e do governo para não permitir que a inflação tenha qualquer sinal de volta”, disse. “Tenho a convicção de que ela está no caminho certo, a despeito das dificuldades que enfrenta.”
Portal Vermelho
Foto: Ricardo Stuckert/Instituto Lula