Desde que a aguardada entrevista de Lula foi autorizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que fez valer o que manda a lei após intensa queda de braço entre imprensa e instâncias jurídicas, todas as atenções se voltaram para a Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, local que tornou-se a materialização das injustiças cometidas contra o ex-presidente e onde ele recebeu nesta sexta-feira (26) as equipes de reportagem dos jornais da Folha de S. Paulo e El País.
As aparições públicas de Lula, desde que a prisão política foi decretada em 7 de abril de 2018, foram sempre carregadas de expectativas. Mas desta vez era ele quem havia decidido estar ali, de coração aberto, pronto para responder a qualquer questionamento. Lula não é e nem nunca foi um homem comum e, dadas as saudações iniciais, o que se viu desde a primeira pergunta foi uma análise precisa e franca sobre a vida pessoal, a obsessão em provar a própria inocência, os abusos de Sérgio Moro e Deltan Dallagnol e, claro, sobre tudo o que acontece no Brasil de hoje, governado por alguém que é exatamente o seu oposto no trato com as pessoas, com as instituições, com a democracia.
“Eu trabalho muito para vencer a questão do ódio, a questão da mágoa profunda. Eu tenho muitos momentos tristes aqui, mas o que me mantêm vivo? Eu tenho um compromisso com este País”, reiterou Lula.
Leia a seguir os principais trechos da entrevista:
Sobre Sérgio Moro e Dallagnol
“Tinha muita gente que achava que eu deveria sair do Brasil, tinha muita gente que achava que eu deveria ir para alguma embaixada, tinha muita gente que achava que eu poderia fugir. E eu tomei como decisão que meu lugar é aqui. Eu tenho tanta obsessão em desmascarar o Moro, em desmascarar o Dallagnol e a sua turma, desmascarar aqueles que me condenaram que eu ficarei preso 100 anos, mas eu não trocarei a minha dignidade pela minha liberdade. Eu quero provar a farsa montada. Montada aqui dentro, montada no Departamento de Justiça dos EUA, com depoimentos de procuradores, com vídeos gravados e agora mais agravado com a criação da fundação criança & Esperança do Dallagnol pegando 2,5 milhões da Petrobras”.
“Havia uma briga no sindicato aquele dia entre os que queriam que eu viesse e os que não queriam que eu viesse. Mas eu tomei a decisão: eu vou. Não vou esperar que eles venham até mim. Eu vou até eles porque eu quero ficar perto do Moro. Eu tenho que provar a minha inocência. Eu tenho certeza que eu durmo todo dia com a minha consciência tranquila e que Moro e o Dallagnol não dormem. E os juizes do TRF-4 que nem leram a sentença?”.
“Sei muito bem qual lugar que a história me reserva. E sei também quem estará na lixeira (…) Quando vejo essa gente que me condenou na televisão, sabendo que eles são mentirosos, sabendo que eles forjaram uma história, aquela história do powerpoint do Dallagnol, aquilo nem o bisneto dele vai acreditar naquilo. Esse messianismo ignorante, sabe? Então eu tenho muitos momentos de tristeza aqui. Mas o que me mantém vivo, e é isso que eles têm que saber, eu tenho um compromisso com este país, com este povo (…) Sempre riram de mim porque eu falava ‘menas’. Agora, o Moro falar ‘conje’ é uma vergonha”.
Resistência Lula
“Eu não tenho ódio, não guardo mágoa. Na minha idade quando a gente fica com ódio ou mágoa a gente morre antes. Eu quero viver até os 120 porque eu acho que sou um ser humano que nasceu para viver até os 120 eu vou trabalhar muito para provar a minha inocência”.
“Quem tem 73 anos de idade, quem construiu a vida que eu construí neste país, quem estabeleceu as relações que eu estabeleci, quem fez o governo que eu fiz neste país, quem recuperou o orgulho e autoestima do povo brasileiro, não pode se entregar. Então eles sabem que têm aqui um pernambucano teimoso”.
Quem nasceu em Pernambuco e não morreu de fome até os cinco anos de idade não se curva mais a nada.
“Vocês acham que eu não gostaria de estar em casa? Adoraria estar em casa com a minha mulher, adoraria estar em casa com meus filhos, adoraria estar em casa com os meus netos, adoraria estar em casa com os meus companheiros, mas não faço nenhuma questão porque eu quero sair daqui com a cabeça erguida como eu entrei. E inocente. Eu só posso fazer isso se eu tiver coragem de lutar por isso”.
Sobre a Justiça e o STF
“Eu penso que haverá um dia em que as pessoas que irão me julgar estarão preocupadas com os autos do processo, com as provas contidas no processo e não com a manchete do Jornal Nacional, não com a capa das revistas e não com as fake news. As pessoas se comportarão como juízes supremos”.
“Essa corte [ STF] já tomou decisões muito importantes. Votou células tronco contra boa parte da Igreja Católica, votou a questão da Serra do Sol contra os poderosos do arroz em Roraima, votou a união civil (homoafetiva) contra todo o preconceito evangélico, essa corte votou as cotas nas universidades para que os negros pudessem entrar. Ela já demonstrou que teve coragem e se comportou. Agora no meu caso a única coisa que eu quero é que vote de acordo com os autos do processo”.
Desgoverno Bolsonaro
“Vamos fazer uma autocrítica geral nesse país. O que não pode é esse país estar governado por esse bando de maluco que governa o país. O país não merece isso e sobretudo o povo não merece isso (…) Imagine se os milicianos do Bolsonaro fossem amigos da minha família?”
Da Agência PT de Notícias