Luiz Alberto: Construindo a união de parlamentares da Diáspora africana

 

luizalberto2903D1A assessoria do deputado Luiz Alberto (PT-BA) divulgou a íntegra do pronunciamento do deputado, no encontro Diáspora Africana Mundial – Cúpula de Parlamentares, em Midrand, África do Sul. O parlamentar está no continente africano, em viagem oficial, com a delegação da Câmara dos Deputados, e foi eleito representante dos parlamentares da América do Sul.

Ele é presidente da Frente Parlamentar Mista pela Igualdade Racial e em Defesa dos Quilombolas

Também compõem a delegação as deputadas Benedita da Silva (PT-RJ) e Janete Pietá (PT-SP) e o deputado Márcio Marinho (PRB-BA).

Leia a íntegra:

Construindo a união de parlamentares da Diáspora africana

Por Luiz Alberto (PT-BA)

“(…) nossa aproximação com a África, que já começa a despertar do secular torpor trazido pela escravidão e o colonialismo, como mostram os inéditos índices de crescimento de algumas nações ao sul do Saara, não é apenas uma opção entre muitas. Trata-se, antes, de um imperativo que o Brasil, cedo ou tarde, terá de reconhecer e enfrentar. É nossa esperança, como brasileiro de origem africana, que o faça logo, em benefício dos africanos de todos os brasileiros.” Senador Abdias do Nascimento, em pronunciamento no Senado Federal em 25/6/2005.

Chegamos hoje a este Fórum de Parlamentares de Diáspora após uma longa trajetória. Trajetória de tantas mulheres e homens negros que nos precederam. Trajetória de todas e todos aqui presentes. Com orgulho represento aqui os parlamentares negros do país com a maior população negra fora do continente africano. Somos, afrobrasileiros, segundo dados do último censo, 50,74% da população brasileira. Por isso, aqui nos sentimos em casa. As palavras do grande Abdias do Nascimento, citadas em epígrafe, demonstram a consciência da tarefa de integração e colaboração que precisamos realizar.

Em seu Ato de Constituição, a União Africana assume o compromisso de “convidar e encorajar a plena participação da Diáspora africana como uma importante parte do nosso continente”. Diáspora é definida como “pessoas de origem africana vivendo fora do continente, independentemente de sua cidadania e nacionalidade e que estão dispostas a contribuir para o desenvolvimento do continente e a construção da União Africana”. Entendendo esse compromisso como uma convocatória, estamos presentes nesse Fórum.

Mas além de representar a Câmara dos Deputados do Brasil nesse evento, trago também o acúmulo dos parlamentares negros e negras da América Latina e Caribe. De fato, realizamos três encontros internacionais com o objetivo de estreitar laços e traçar estratégias comuns para superar as barreiras impostas pelo racismo e mecanismos de discriminção que confinam, ainda hoje, grande parte de nossa comunidade em níveis de pobreza e exclusão[1]. Nesses encontros elaboramos a Carta de Brasília, a Carta de Bogotá e o lançamento do Parlamento Negro das Américas (em anexo)

Obviamente, ainda há muito a ser feito na medida em que precisamos consolidar esses passos e tornar permanente os espaços de intercâmbio entre parlamentares afrodescendentes das Américas. Nesse sentido, só temos a ganhar fortalecendo os vínculos com os parlamentares da União Africana, integrando-nos todos como Diáspora à tarefa de construir nações justas e igualitárias em ambos os lados do Atlântico. Foi com essa orientação que participei do Encontro Preparatório de Parlamentares Africanos e da Diáspora, realizado em 16 de fevereiro de 2012 em Nova York.

Negros e negras foram um elemento fundamental na construção dos nossos países, de sua riqueza material e cultural. Nesse processo, não foram poucas as dores, os sofrimentos, as injustiças. Mas, prevaleceram a força da nossa determinação, a herança trazida da nossa África ancestral, o exemplo de luta e resistência dos nossos antepassados, e a marca que imprimimos nas nossas sociedades.

Foi longa e cheia de realizações a caminhada até aqui. Entretanto, resta ainda muito mais a ser feito e são muitos os desafios. Temos que criar as bases para que nossas sociedades tenham a inclusão e não a exclusão.

Ainda hoje no Brasil, vivenciamos na íntegra a reprodução sistemática das desigualdades raciais, a discriminação e o racismo como princípio estruturante da sociedade. O quadro geral da situação dos negros e negras no nosso continente é de piores índices socio-econômicos, alijamento do poder político e invisibilidade principalmente como elemento no projeto de desenvolvimento. Mas, chegou o momento de transformar esse quadro. E esse é o nosso papel como parlamentares, em conjunto com o movimento negro e suas organizações. Precisamos maximizar nossa capacidade técnica e política para influenciar na agenda nacional de nossos respectivos países.

Recorro mais uma vez às palavras de Abdias do Nascimento para recordar seu pronunciamento no 1º Encontro Nacional de Parlamentares Negros, realizado em Salvador, Bahia, Brasil em 26 de julho de 2001. Abdias afirmou que

“(…) a perspectiva mais importante deste Encontro está na possibilidade de fortalecer o movimento social afro-brasileiro. Precisamos construir as bases de nossa independência financeira e política. Precisamos exigir não apenas a formulação e implementação de políticas públicas como a nossa participação efetiva no monitoramento de sua execução e na fiscalização de seus resultados. Precisamos aumentar o peso de nossa força política, porque apenas assim iremos conquistar os nossos objetivos.”

Com satisfação registro os passos que conseguimos avançar ao longo das últimas décadas. Destaco aqui os seguintes marcos legais:

•Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 (Lei Caó) “Define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor”

•Lei no 9.315, de 20 de novembro de 1996: “Inscreve o nome de Zumbi dos Palmares no Livro dos Heróis da Pátria”.

•Lei nº 11.756, de 23 de julho de 2008: “Concede anistia post mortem a João Cândido Felisberto, líder da chamada Revolta da Chibata, e aos demais participantes do movimento”.

•Lei nº 12.391, de 4 de março de 2011: “ Inscreve no Livro dos Heróis da Pátria os nomes dos heróis da ‘Revolta dos Búzios’ João de Deus do Nascimento, Lucas Dantas de Amorim Torres, Manuel Faustino Santos Lira e Luís Gonzaga das Virgens e Veiga.

Em particular, destaco:

Palmares no Livro dos Heróis da Pátria”.

•Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003: “Que inclui no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”;

•Lei nº 12.288, de 20 de julho de 2010: “Institui o Estatuto da Igualdade Racial”.

A Lei 10.639/2003 lança as bases para que o processo educacional no Brasil passe a transmitir para nossas crianças o verdadeiro papel que homens e mulheres africanos e seus descendentes desempenharam na construção da riqueza material e cultural de nossa sociedade. O Estatuto da Igualdade Racial fortalece os esforços de políticas públicas de combate às discriminações e promoção da igualdade. Capitaneando os esforços para que tais objetivos se concretizem temos a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Ministério de assessoramento da Presidência da República, criada pelo Presidente Luis Inacio Lula da Silva e reafirmada como Ministério de assessoramento da Presidência da República no governo da Presidenta Dilma Roussef.

Destaco também a implantação no Brasil do Sistema de Cotas para negros e negras nas Universidades públicas brasileira. A constitucionalidade do sistema de cotas foi considerada pelo Superior Tribunal Federal brasileiro.Essa decisão do Supremo é histórica, aprofunda e consolida o sistema democrático do país. A atitude do Supremo reforça a ideia de o Congresso ainda é o espaço mais conservador presente no país. A partir dessa decisão vamos provocar o Congresso para que trilhe por esse caminho, que assuma a posição de não mais ser essa instituição tão conservadora em suas decisões e deixe de agir como se nada tivesse acontecendo do ponto de vista dos avanços da política social do nosso país.

O sistema de cotas para negros existe porque as universidades brasileiras são espaços de formação de profissionais de maioria esmagadoramente branca. E, ao manter apenas um segmento étnico na construção do pensamento dos problemas nacionais, a oferta de soluções se torna limitada e não reflete a diversidade étnica no nosso país. Destaco também a criação do Decreto 4887, assinado pelo então presidente Luís Inácio Lula da Silva, em 2003 que legitima os procedimentos administrativos para a identificação, o reconhecimento, a delimitação, a demarcação e a titulação da propriedade definitiva das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos.

Vale também recordar que a ênfase da política externa brasileira passou a ter no governo do Presidente Lula. Como destaca o Balanço de Governo 2003-2010, ao longo de seus dois mandatos, o Presidente Lula visitou 23 países africanos, e o Brasil recebeu 47 visitas de reis, presidentes e primeiros-ministros africanos, oriundos de 27 nações. A Presidenta Dilma Roussef imprimiu a mesma orientação ao seu governo, e antes de completar um ano de mandato já visitou três países africanos.

Sabemos que essas visitam são oportunidades para todo tipo de intercâmbio e devemos multiplicar os esforços para tais oportunidades sejam efetivadas e transformadas em melhoria das condições de vida para nossos povos. Devemos, então, ter sempre presente a mensagem da Conferência contra o Racismo, a Discriminação Racial, Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância. A Conferência de Durban, realizada em 2011, propiciou a que nos conhecêssemos melhor e que nos articulássemos mais efetivamente no plano internacional ao mesmo tempo em que nos ajudou no diálogo com nossos governos, forçando-os a uma tomada de posição. Entretanto, urge não deixar os documentos de Santiago e Durban transformarem-se em letra morta. É necessário transformar os Planos de Ação em políticas públicas que efetivamente confrontem as desigualdades raciais.

Essas políticas públicas devem inevitavelmente ser dois planos. Necessitamos de políticas focalizadas para acelerar em certas situações ou áreas geográficas específicas a diminuição das desigualdades raciais. Da mesma forma, necessitamos de políticas universais que incorporem as dimensões raciais e de gênero a fim de garantir o rompimento do ciclo vicioso de reprodução das desigualdades. Em outras palavras, trata-se de assegurar que as políticas universais não reintroduzam pela porta dos fundos os ganhos, sempre lentos e limitados, das políticas focalizadas.

Nosso encontro, com sua proposta de intercâmbio, troca de experiências, é mais um grande passo para a nossa articulação e consequentemente para a maior eficácia de nossas intervenções. Obviamente, representamos sociedades diferentes com suas peculiaridades e especificidades. Porém, o que nos une é ainda mais forte. Chegamos até aqui apenas para reafirmar nossa disposição em seguir caminhando juntos, na nossa diversidade e no salutar espírito de pluralidade democrática.

O Pan-Africanismo foi crucial na constituição da identidade negra, tendo sido um instrumento de unidade de luta destes por reconhecimento, direitos humanos, igualdade racial e depois como elemento agregador na luta pela independência, e também como componente aglutinador para formação de uma instituição continental.

Na construção do debate pan-africanista destaco a realização em 2005,  do terceiro Encontro Legisladores de descendência africana das Américas e do caribe, que aconteceu na Costa Rica, em San José Limon que é parte um processo importante de articulação que começou desde o primeiro Encontro de Parlamentares Negros.

Reunidos na província de Limon, Costa Rica, as mulheres parlamentares e deputados de ascendência Africano nas Américas e no Caribe, decidimos criar o Parlamento Negro das Américas, na Terceira Reunião de Parlamentares das Américas e do Caribe, com a participação de representantes da sociedade civil, convidados especiais de agências de cooperação internacional, universidades e governos, em conformidade com os compromissos assumidos em Brasília, em 2003.

Nossa decisão de criar o Parlamento Negro das Américas visa criar um fórum para a proposta, discussão, deliberação, coordenação e advocacia, para representar e integrar as lutas de descendência  africana e na América Latina e no Caribe. Além de intensificar os esforços para reivindicar o pleno gozo dos direitos humanos, as reivindicações históricas dos povos e das comunidades negras, e o reconhecimento do multiculturalismo, diferenças, desigualdades e injustiças que vivem todos os países das Américas e no Caribe.

Os argumentos para a criação do Parlamento Negro das Américas estavam limitados à analise das democracias na região, juntamente com a necessidade eminente para as pessoas de descendência africana de aprofundar as ferramentas, instrumentos e instituições democráticas como mecanismos fundamentais para o desenvolvimento da inclusão e melhoria da qualidade de vida.

Além de refletir na crescente participação de parlamentares e membros de organizações sociais de descendência africana. No ato da terceira reunião participaram do Encontro 117 legisladores de 17 países.

A constituição do Parlamento reconhece e faz parte das seguintes condições:

1) A marginalização social, o racismo, pobreza, exclusão e invisibilidade fazem parte das estruturas fundamentais das sociedades nas Américas e no Caribe, que regula e racionaliza as relações de poder desiguais;

2) As cidades e comunidades de ascendência Africana têm contribuído grandemente para a construção de todas as sociedades americanas e do Caribe, no entanto, continuam a enfrentar a exclusão e a discriminação, não sendo participantes ativos na construção de democracias, que, historicamente marginalizados e mulheres homens de ascendência Africana;

3) Nós, os descendentes nas Américas e no Caribe representam cerca de 150 milhões de pessoas, e têm contribuído para as sociedades de construção. No entanto, o mais debatido na pobreza e desigualdade econômica, uma situação agravada em mulheres, jovens e crianças;

4) Apesar de sermos cerca de 150 milhões de pessoas, são excluídos da decisão representação do espaço e da participação política, o que mostra a história das diferentes formas de dominação, exclusão e violência estrutural contra as comunidades e os povos de ascendência Africana; Exclusão e discriminação mostrado pouca ou nenhuma representação em todos os ramos dos Estados. Nossa participação nos congressos, senados e parlamentos é insignificante e, portanto, não democrático, além de invisibilidade sistemática, porque nós não somos mulheres ainda representadas e os homens, ou das estatísticas oficiais (principalmente enganosa) ou políticas, programas e projetos;

5) Racismo, discriminação e exclusão que se manifestam no discurso e ações contra e ascendência Africano. Apesar dos nossos esforços históricos, a cultura dominante não reconhece a diversidade e, portanto, nega e minimiza a nossa cultura e visão de mundo com um resultado de violência cultural;

6)As últimas décadas são caracterizadas por processos de integração através de acordos comerciais, que podem constituir um obstáculo, mas reconhecer os nossos modos tradicionais de produção é uma ameaça para as reivindicações e direitos dos descendentes de africanos, uma vez que incide sobre uma lógica de individualismo e redução de serviços a serem prestados pelo Estado. Estes acordos negam não apenas as formas de produção tradicional e de intercâmbio que tendem a ser mais justo, mas também o gênero cultural, social, étnica, reforçando e aprofundando as assimetrias no desenvolvimento cultural, econômico, social e ferramenta de desenvolvimento político, bem como chave de hoje como comunicação e informação.

7)Nós reivindicamos como nossa contribuição à nossa cultura de ascendência Africana para a formação de americanos e caribenhos essencialmente multicultural e multiétnica, e sua incorporação na educação de nossos países.

8) Reafirmamos a abordagem feita pelos governos da região a partir da Conferência Mundial contra o Racismo nas Américas, Santiago de 2000, que reconhece o tráfico humano Africano e escravidão como um crime contra a humanidade. Neste sentido, a imposição de medidas para repor séculos de reparação de racismo e discriminação.

9) Instalação de mecanismos nos Estados para atender as recomendações e compromissos assumidos pelas organizações e instâncias internacionais para combater a discriminação racial e suas consequências.

Estamos felizes pela contribuição que cada um de nós tem dado ao longo dos anos para que pudéssemos realizar esse encontro em solo africano. Mas, acima de tudo estamos cientes da nossa responsabilidade em nos engajarmos de forma construtiva para que tenhamos uma produtiva jornada e saiamos desse encontro com uma agenda realmente efetiva. Chegamos, filhos e filhas da Diáspora africana, até aqui. Chegamos até aqui e reafirmamos nosso compromisso em continuarmos juntos, irmanados na luta em prol das nossas comunidades.

[1] I Encontro de Parlamentares Negros e Negras das Américas e Caribe, realizado de 21 a 23 de novembro de 2003, em Brasília, Brasil. II Encontro de Parlamentares Afrodescendentes das Américas e do Caribe, realizado de 19 a 21 de maio de 2004, em Bogotá, Colômbia. III Encontro de Legisladores Afrodescendentes das Américas, realizado de 21 a 31 de agosto de 2005 em San Jose e Limon, Costa Rica.

Assessoria Parlamentar

Ouça o deputado Luiz Alberto (PT-BA) na Rádio PT

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